Antonio Lassance: A política maquiada de Marina
Parte dos eleitores de Marina precisa ser informada de que a pessoa em quem pretendem votar não existe mais. A Marina de hoje não é mais a mesma de tempos atrás. Quem marinou?
*Por Antonio Lassance
Publicado 02/09/2014 13:36
Dois grupos de eleitores pretendem votar em Marina Silva.
O primeiro grupo acha que ela é uma novidade, alguém completamente diferente e que tem condições pessoais de fazer um bom governo. Outro grupo quer principalmente tirar o PT do governo, seja lá com quem for, seja lá a que preço. Era Aécio; agora, é mais Marina.
O primeiro grupo reunia quem votava em Eduardo Campos e um contingente dos que se inclinava a votar branco ou nulo.
O segundo tem eleitores que abandonaram Aécio porque se sentem mais confortáveis com Marina nesse verdadeiro arrastão anti-Dilma.
O arrastão é enaltecido e financiado principalmente por aqueles que tiveram interesses contrariados e pretendem recuperar seus ganhos no próximo quadriênio:
– Os bancos, que viram a taxa de juros serem reduzida. Eles não se conformam que, mesmo com juros estratosféricos, o país tenha passado a gastar mais em educação, saúde e assistência do que com bancos;
– As empresas de energia, cujo faturamento despencou, e os grandes financiadores da área de energia, como o Banco Santander;
– Os grandes acionionistas da Petrobrás e usineiros, que sonham em ver a gasolina sendo vendida a R$5,00 nas bombas dos postos de combustíveis.
Por isso, quando Dilma sobe, as bolsas caem.
Também é preciso registrar que há um setor mesquinho e volumoso de eleitores que se vê ameaçado por pobres e negros, os quais disputam uma vaga na universidade e no mercado de trabalho com um pouco mais de igualdade de condições.
É principalmente por tais fatores que o número de brancos e nulos caiu, que Aécio despencou e que Marina subiu nas intenções de voto.
A "nova" Marina e a Marina que não existe mais
Uma parte dos eleitores de Marina precisa ser informada de que a pessoa em quem eles pretendem votar não existe mais.
A Marina de hoje não é mais a mesma de tempos atrás.
Não é mais a Maria Osmarina – nome verdadeiro e não estilizado da atual Marina.
Não é mais a defensora de seringueiros e de todos os povos da floresta.
Não é mais a militante partidária que não titubeava em se dizer de esquerda.
É outra pessoa.
A declaração da candidata, que comparou o rico dono de uma empresa de cosméticos, a Natura, a Chico Mendes, indignou a todos os que conheceram o sindicalista assassinado em 1988.
O fato rendeu uma nota de repúdio do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Xapuri, no Acre.
Para Marina, o dono da Natura seria tão elite quanto um Chico Mendes. Isso mostrou o quanto ela perdeu a noção de muitas das coisas que aprendeu no passado e que deixou por lá mesmo, no passado.
A biografia da candidata agora tem uma página completamente virada em sua trajetória.
Qual o preço que Marina tem se mostrado disposta a pagar para conseguir ser eleita?
Marina promete o que não pode cumprir
Marina não tem programa. Tem uma carta de intenções que não responde a uma questão elementar: como pretende aprovar suas intenções no Congresso, tendo em vista que muitas de suas propostas dependem não da caneta do presidente da República, mas de apoio parlamentar?
A única chance de Marina cumprir o prometido será, em 2015, fundar seu partido e abrir a temporada para o maior troca-troca partidário da história do país, maior até do que o patrocinado por Collor com seu PRN, em 1990.
Marina teria inclusive que esvaziar seu atual partido, o PSB. Ou poderá fazer um trato bastante matreiro: deixaria a Rede como um partido médio, fechado em sua elite, isolado por um cordão sanitário, e faria do PSB a vala comum de todos os oportunistas que quiserem fazer parte do novo governo.
O critério para integrar um eventual governo Marina, repetida pela própria candidata, é ser moderno, competente e "do bem" (por alguma razão, Marina se esquiva de dizer a palavra “honesta”).
Provavelmente, seu critério para alguém ser considerado "do bem" seja apenas a Lei da Ficha Limpa. Por esse critério, o governo Dilma também só tem gente do bem.
Se for pelo critério mais abstrato de honestidade, Marina já não ficaria tão tranquila para por sua mão no fogo, como ficou claro com o episódio das denúncias sobre o jatinho usado por ela e Eduardo Campos.
Pelo critério "do bem", Marina pode conseguir não só maioria no Congresso. Pode até sonhar com a unanimidade. Nesta eleição, nenhuma ficha suja pode ser eleito, se assim tiver sido declarado pelos tribunais eleitorais.
Teremos, em 2015, 513 deputados e 81 senadores "do bem".
Desses, claro, nem todos serão tão "modernos e competentes". O problema é que os maiores oportunistas são justamente os mais modernos e competentes em fazer o que fazem.
De novo, Marina estaria bem servida de um time de crápulas, todos "do bem", pelos seus critérios genéricos.
De uma forma ou de outra, Marina está prometendo o que não pode cumprir. Ou não fará maioria e não conseguirá governar, ou governará fazendo de tudo, menos a tão propalada "nova política".
Grupo de Marina nada tem de horizontal, de democrático e de transparente.
Marina não tem um partido, tem uma "rede". Essa rede nada tem de horizontal, de democrático e de transparente.
É uma associação de peixes graúdos, patrocinadores empresariais da candidata.
Seus seguidores mais sonháticos são os que acham que, futuramente, terão o mesmo espaço e voz que a herdeira do Itaú, o dono da Natura, os representantes da Taurus, os usineiros de Pernambuco, os amigos de Pérsio Arida na Bovespa.
Uma das consequências de Marina não ter um partido e não seguir um modelo partidário é que ela não tem correligionários, nem instâncias, nem grupos que possam rivalizar entre si e expor suas mazelas, como acontece em qualquer partido, por pior que seja.
O que unifica a Rede é que todos os seus integrantes são seguidores de sua grande líder, mentora e guia espiritual.
Desde quando isso é democrático? Desde quando isso é "moderno"?
Marina Silva subiu nas intenções de voto tal qual um balão inflado – grande por fora, vazio por dentro.
Levada às alturas, é motivo de grande atenção.
O problema é que todo balão, um dia, tem que descer sobre a cabeça dos que hoje se encantam com seu voo.
Aí começa o grande incêndio de algo que enganou a todos com um brilho frágil de papel.