A luta unificada contra a tentativa de golpe

O projeto democrático e popular, vitorioso nas eleições de 2003 e ha 12 anos mudando o Brasil, vive seu momento mais crítico, sofrendo fortes ataques das forças conservadoras e fascistas brasileiras, que derrotadas nas eleições presidencias de 2014, tentam inviabilizar a governabilidade e criar ambiente político para o golpe.

Por Claudio Machado 

Em 2001 a fome açoitava milhões de brasileiros e brasileiras, que em desespero para se livrarem desse que é um dos piores flagelos da humanidade, aceitavam, quando conseguiam, qualquer tipo de trabalho ou emprego, para terem a possibilidade de comer, mal, algumas vezes por semana.

Era uma época em que ainda não faltava mão de obra barata para trabalhar nas casas e apartamentos luxuosos, ou nem tanto, por salários vis e tratamento desumano (as exceções que me perdoem).

Hoje, dondocas de bairros de classe média alta manifestam indignação por não encontrarem mais ninguém disposto a esse tipo de trabalho e tratamento. E descarregam essa indignação no governo e no PT, pois são os “petralhas”, (assim como pensam e classificam), os responsáveis por acabar com a oferta de trabalhadores semiescravos, disponíveis para o deleite das madames e seus filhinhos que jamais souberam o que era arrumar uma cama ou lavar um prato. Isso não era para eles (não é mesmo, Aécio?). Para isso havia as mucamas.

Mas como Milton Santos já nos ensinou, a classe média não quer direitos, quer privilégios.

É esse Brasil que os golpistas e as classes A e B querem de volta (com as devidas exceções, é claro, pois há aqueles desse extrato que apoiam as mudanças dos últimos 12 anos).

Querem o “mundinho deles” intacto e “descontaminado” daqueles brasileiros que ascenderam e com os quais têm que dividir os assentos do mesmo avião; que usam os mesmos perfumes e celulares; que lotam os shoppings, antes locais exclusivos de ricos e abastados; que vão ao cinema assistir o último lançamento, dividindo os lugares com as madames, seus filhinhos e maridinhos "limpinhos e cheirosos".

Querem que volte o tempo em que podiam conseguir facilmente uma trabalhadora doméstica sem ter de pagar, se quer, o salário mínimo e, muito menos, direitos trabalhistas.

Querem que acabe o bolsa família para poderem ter à sua porta um exercito  de cidadãos e cidadãs implorando um subemprego para matar a fome.

Querem a volta dos tempos da casa grande e da senzala.

E disfarçam esse desejo enrustido, acusando o atual governo de corrupto, de incompetente, de bolivariano, de comunista. É a velha fórmula de sempre.

Em 1954, diante de um governo (o de Vargas), compromissado com os trabalhadores e as mudanças estruturais; que criou o BNDES e a Petrobras; adotaram a mesma estratégia, as mesmas acusações, capitaneadas pelos principais meios de comunicação da época, liderados pelos jornais “Tribuna da Imprensa”, de Carlos Lacerda e “O Globo”, da família Marinho. Não há coincidência nisso.

Em 1964, enquanto João Goulart assumia compromissos com reformas de base, que visavam alterações bancárias, fiscais, urbanas, administrativas, agrárias e universitárias ( mas tudo  dentro da legalidade democrática), os remanescentes golpistas de 1954, somando-se a novos fascistas que a história sempre  produz, tendo mais uma vez como porta vozes os veículos de comunicação da grande mídia, acusavam Jango de tentar introduzir o comunismo no Brasil e com essa cantilena cooptaram parte significativa da opinião pública, embora João Goulart gozasse de grande popularidade.

Agora, insatisfeitos com as mudanças e conquistas do povo brasileiro, percebidas nos últimos 12 anos, e revoltados com a recente derrota eleitoral, usam e abusam dos mesmos métodos, carregando hipocritamente a bandeira do combate à corrupção, como aríete para atacar Dilma e seu governo, exigindo seu impedimento, pregando o golpe e a intervenção militar.

Mas é possível que não encontrem caminho fácil para seguir com seu intento. Hoje, diferente de 54 e 64, a coalisão governista é liderada por um partido forte e muito enraizado nos movimentos populares e sindical.

O PT, apesar de estar bastante desgastado pelas  acusações de corrupção ao longo dos últimos  anos, ainda carrega uma grande capacidade de reação e mobilização.

Existem também  inúmeros movimentos  populares que, mesmo independentes, têm consciência da necessidade da manutenção  do projeto vitorioso e em curso desde 2003, ainda que exijam, com muita razão , seu aprofundamento e, finalmente, as tão requeridas reformas de base, sem as quais a ampliação de direitos e  diminuição das desigualdades  sociais ficarão sempre no plano das intenções.

A capacidade de resistência ao golpe, é fortalecida pela presença na coalizão governista do PCdoB,  que  embora de dimensão  bem menor que o PT, carrega, em seus 93 anos de existência, larga experiência para o enfrentamento de momentos adversos como o que vivemos.

Mas para que haja plena disposição das forças de esquerda e progressistas em se contraporem ao consorcio fascista que tenta golpear um governo legítimo e legal, é preciso que o planalto emita sinais de que irá manter seu foco gestor para as demandas da classe trabalhadora e do povo brasileiro.

Se não houver  uma forte sinalização do governo em direção às demandas dos movimentos sociais e sindical, coerente com o discurso de campanha, não haverá disposição para que a base popular que apoia ou tem afinidades com o governo Dilma, marche em sua defesa, pelo menos não com o ímpeto necessário e a unificação desejada.

Essa sinalização, acompanhadas de anuncio de medidas que possam dar credibilidade aos sinais, poderiam até contribuir para que fosse construída uma comemoração do dia 1º de maio de forma unificada, entre a CUT, CTB e movimentos sociais que carregam alguma afinidade com as ações do governo levadas a cabo nestes últimos 12 anos e que, acima de tudo, não desejam o fortalecimento do movimento golpista, o que seria trágico para a classe trabalhadora e para a maioria da população.

O governo Dilma pode mesmo fazer um chamamento para o apoio às necessárias medidas de austeridade exigidas na atual conjuntural mundial e nacional, mas que a conta seja apresentada fundamentalmente aos que têm (quem tem põe, quem não tem, tira).

O planalto deve apresentar a maior parcela da conta do ajuste fiscal aos ricos. Imposto sobre grandes fortunas e grandes lucros; a volta da CPMF (readequada); apresentar proposta de reforma tributária progressiva; ou seja, uma pauta progressista e reestruturante, que vá de encontro às demandas populares.

Precisa também investir firme no aperfeiçoamento das bases legais de sustentação da democracia, encaminhando ao congresso um projeto de regulamentação dos artigos constitucionais que tratam da democratização dos meios de comunicação e liberdade de expressão; Jogando todo o peso institucional do executivo para que a reforma política, em tramitação no congresso, garanta o fim do financiamento empresarial de campanhas políticas e seja  instituído o financiamento público; incrementando medidas para acelerar o processo de reforma agrária, criando medidas de incentivo à reforma urbana e demais demandas históricas do povo brasileiro.

É possível que perca no congresso aquilo que depender do voto dos deputados e  senadores, em sua maioria conservadores. Mas é do jogo. Quem navega, assim como quem governa, não pode esperar apenas  águas tranquilas. Se não quiser mares revoltos, melhor não sair do porto.

Claudio Machado é secretário estadual de Comunicação do PCdoB do Espírito Santo, vice  presidente da Casa da América latina "Liberdade e Solidariedade" (Calles) e coordenador do Nucleo do Barão de Itararé capixaba.