Redução da maioridade penal fere tratados assinados pelo Brasil

De acordo com estudo apresentado nesta terça-feira (16) pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), a proposta de redução da maioridade penal, que está em discussão no Congresso Nacional, vai contra os princípios contidos na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e da Adolescência (ECA) e nos tratados internacionais assinados pelo país.

Redução da maioridade penal - Reprodução

“Atualmente, a legislação para a infância e adolescência no Brasil está de acordo com o direito internacional. Qualquer modificação da legislação sobre a maioridade penal que diminua os direitos dessa população irá contra os acordos e convenções dos quais o Brasil é signatário”, adverte pesquisa (ver quadro abaixo).

A Nota Técnica O Adolescente em Conflito com a Lei e o Debate sobre a Redução da Maioridade Penal foi elaborada pelas pesquisadoras da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais (Disoc) Enid Rocha Andrade Silva e Raissa Menezes de Oliveira.

Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio do IBGE (Pnad) apontam que em 2013, existiam 23,1 mil adolescentes privados de liberdade no Brasil. Enquanto no ano passado, o total de pessoas encarceradas no sistema prisional brasileiro chegava a 548 mil. A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171/1993 propõe a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos.

O estudo mostra ainda que a grande maioria dos delitos cometidos por adolescentes que estão cumprindo pena com restrição da liberdade são o roubo (40%), furto (3,4%) e o tráfico de drogas (23,5%) e não crimes considerados graves como defendem os que são a favor da redução da maioridade. Os delitos graves como homicídios e latrocínios (roubo seguidos de morte), correspondem a 8,39% e 1,95%, respectivamente, dentro do universo de 23,1 mil jovens e adolescentes com restrição de liberdade. Crimes como estupro chegam a 1,05% e lesão corporal, 1,3%. Juntos esses crimes de maior gravidade somam 12,7% dos jovens e adolescentes com restrição de liberdade.

Mito da impunidade

Do total de 23,1 mil adolescentes privados de liberdade no Brasil, em 2013, 64% (15,2 mil) cumpriam a medida de internação, a mais severa de todas. Segundo as autoras, a aplicação das medidas não corresponde à gravidade dos atos cometidos. Uma vez que pelas medidas de internação orientadas pelo ECA, o universo de adolescentes cumprindo essa medida deveria ser de 3,2 mil – homicídios (2,2 mil), latrocínio (485), estupro (288) e lesão corporal (237) – e 15,2 mil.

Redução das fragilidades sociais

Segundo as pesquisadoras, as informações sobre a situação de escola, trabalho e vitimização analisadas pelo estudo indicam que necessário investir mais na promoção dos direitos desses jovens como à vida, à saúde, educação, esporte, cultura e família. Elas citam como avanços nesse sentido, o Programa Nacional de Aceso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec), Programa de Inclusão de Jovens e Adultos, entre outros. “Entre 1992 e 2013 a proporção de jovens brasileiros com idade de 15 a 17 anos que frequentavam a escola se elevou de 59,7% para 84,4%”, cita a pesquisa.

Porém, o estudo aponta que as fragilidades sociais de renda, escola e trabalho ainda persistem para parte significativa dos adolescentes brasileiros. Para levantar as características sociais da população juvenil que cumpre pena de restrição de liberdade, as autoras usam dados de pesquisa anterior do Ipea e Ministério da Justiça, feita em 2003. A partir desses dados, mais de 60% dos adolescentes cumprindo pena naquele ano eram negros, 51% não frequentavam a escola e 49% não trabalhavam quando cometeram o delito e 66% deles viviam em famílias consideradas extremamente pobres.

As pesquisadoras defendem que as medidas socioeducativas em meio aberto – Liberdade Assistida e Prestação de Serviço para a Comunidade – sejam possibilidades reais de ressocialização dos adolescentes em conflito com a lei, com acompanhamento de profissionais sem romper o vínculo com a comunidade.