Borges e Bioy: escrevendo a Argentina a quatro mãos

Uma mesa de jantar, dois dos maiores escritores argentinos e uma missão estapafúrdia: escrever um panfleto publicitário para uma marca de iogurtes.

Por Juliana Cunha

Borges e Bioy - Reprodução

Essa cena improvável se deu em 1936. A essa altura, Jorge Luis Borges tinha 30 anos e era um escritor razoavelmente bem posicionado na cena argentina. Já Adolfo Bioy Casares tinha 17 e não cria na própria sorte.

A encomenda do anúncio partiu de um tio de Casares, que tinha uma fábrica de iogurtes. O que os dois autores criaram a partir de um material tão prosaico foi uma família Búlgara que fala sobre as propriedades metafísicas do iogurte, que o os fez viver até os cem anos, salvo uma das irmãs, que viveu até 91.

Repleto de chistes e ironia, o panfleto terminou por selar uma amizade e parceria que rendeu quatro livros escrito a quatro mãos — Seis Problemas para Dom Isidro Parodi (1942), Duas Fantasias Memoráveis (1946), Crônicas de Bustos Domecq (1967) e Novos Contos de Bustos Domecq (1977) — todos eles assinados por um personagem que os escritores criaram, o pedante Honorio Bustos Domecq.

Em seu ensaio autobiográfico, Borges cita o início de sua amizade com Bioy como um dos principais acontecimentos de sua vida. Já Bioy tem um livro inteiro com passagens de seus diários em que cita o amigo, revelando uma relação que misturava admiração, inveja e obsessão.

No fim das contas, Borges é o autor consagrado, Bioy permanece numa espécie de névoa, mas ambos ajudam a construir o imaginário argentino, com tudo que ele tem de fantástico e sóbrio.