Forças especiais dos EUA à Síria: os perigos da escalada

O envio de Forças de Operações Especiais (FOE) estadunidenses ao norte da Síria é, para alguns especialistas, o início de uma escalada no conflito e uma mudança perigosa na estratégia da Casa Branca.

Roberto García Hernández*

Com o pretexto de combater o Estado Islâmico (EI), o presidente Barack Obama ordenou em 30 de outubro enviar 50 membros dessas unidades elites do Pentágono a regiões da nação árabe controladas pelos curdos.

Esta medida, que carece de consentimento do Governo de Damasco e do Conselho de Segurança das Nações Unidas, inclui o envio de aviões de ataque A-10 Warthog e uma dúzia de caças F-15 Eagle à base aérea em Incirlik, Turquia, bem como o aumento da ajuda da Jordânia e Líbano.

Um artigo recente do diário The New York Times assegura que a decisão da Casa Branca acrescenta um novo nível de risco porque pode provocar uma ampliação do envolvimento dos Estados Unidos.

Ainda que a Administração tente apresentar esta medida como continuidade da estratégia atual, é realmente uma mudança significativa para Obama, que de forma repetida prometeu que não empregaria tropas terrestres na Síria.

Mesmo se tratando de uma quantidade relativamente pequena, o caráter de suas missões leva a pensar na possibilidade de que seja uma avançada para ampliar o número de tropas terrestres na região.

Por outro lado, a presença de efetivos das FOE em solo sírio não é uma novidade, pois nos últimos meses meios de imprensa estadunidenses relataram ações isoladas destas unidades em missões de inteligência, captura de líderes do EI e sabotagens.

O comando militar norte-americano assegura que este agrupamento não participará diretamente em combates, ainda que seus chefes tenham direito a responder possíveis ataques do inimigo, bem como combater junto aos grupos armadas sírios e unidades curdas, caso recebam autorização de Washington.

No entanto, sua tarefa principal será facilitar que as forças irregulares aliadas aos Estados Unidos mantenham o território que agora têm ocupado e lhes garanta o fornecimento sistemático e rápido dos abastecimentos.

Especialistas no tema estimam que a presença ali das FOE constitui uma complicação adicional, pois além de violar a soberania desse país, torna mais complexa a cooperação entre Estados Unidos e Rússia para evitar incidentes entre os meios aéreos que atuam nesse cenário de operações.

Nesse sentido, o pesquisador Eric Zuesse assinalou em 6 de novembro passado que os Estados Unidos prepara uma guerra contra a Rússia no campo de batalha da Síria, ao enviar uma dúzia de aviões à base aérea de Incirlik, Turquia.

O especialista sublinhou em um artigo publicado pelo site canadense Global Research que os F-15C estão desenvolvidos para o combate no ar, e têm a missão de estar prontos para combater contra seus similares russos que operam nesse país árabe por solicitação do Governo de Damasco.

Em outras palavras, Obama adverte a seu homólogo Vladimir Putin, que a não ser que este queira uma guerra contra os Estados Unidos deve abandonar a campanha aérea contra objetivos do EI em solo sírio, acrescentou Zuesse.

O presidente norte-americano ordena ao Kremlin deter suas operações contra o EI, e está disposto a ir à guerra com a Rússia se for necessário, com o fim de eliminar o Governo do presidente Bashar al-Assad, acrescenta Zuesse.

Desde o dia 30 de setembro passado, as Forças Aeroespaciais russas realizam uma campanha aérea contra objetivos dos fundamentalistas em solo sírio.

Por sua vez, a coalizão militar liderada pelos Estados Unidos leva a cabo bombardeios na Síria desde setembro de 2014, sem o consentimento das autoridades desse país.

As FOE estão integradas pelos chamados Boinas Verdes, Rangers e Força Delta do Exército norte-americano; os grupos Seals da Marinha e outras da Infantaria da Marinha, e a Força Aérea, subordinadas ao Comando Conjunto de Operações Especiais, com sede em MacDill, estado da Flórida.

O anúncio do envio destas tropas teve um impacto imediato no Congresso.

Para o líder da maioria republicana na Câmara de Representantes, Kevin McCarthy, é muito pouco, porque enviar um pequeno número de efetivos a referida nação levantina é uma jogada tática para encobrir a ausência de uma estratégia integral para o Oriente Médio.

Um apontamento similar realizou o senador democrata Tim Kaine, que recordou que o presidente também prometeu que as tropas não regressariam ao Iraque, mas de fato atualmente mantém ali mais de 3.500 mil efetivos.

Agora sai a público novamente o tema da solicitação feita em fevereiro passado pelo chefe da Casa Branca, para que o Congresso aprove um projeto de Autorização do Uso da Força Militar (AUMF) com o fim de deter a ofensiva do EI, mas os legisladores não conseguiram um acordo.

Em 6 de novembro, 35 congressistas democratas e republicanos pediram em uma carta ao presidente da Câmara de Representantes, Paul Ryan, que permita um voto sobre esta proposta.

Até a data, a administração Obama utilizou como base para sua campanha uma autoridade que o Capitólio outorgou por lei em 2001 e 2002 ao presidente George W. Bush para intervir no Afeganistão e no Iraque, algo que não outorga o matiz legal que necessitam as atuais operações.

Para os republicanos, a AUMF não tem todo o alcance que precisa neste momento e favorece um papel mais ativo dos Estados Unidos no combate aos irregulares, incluindo ações contra o Governo sírio, com o fim de projetar o poderio bélico norte-americano sem restrições.

Por sua vez, alguns democratas negam-se a avalizar um texto que não proíba de forma explícita o uso de grandes agrupamentos de tropas terrestres em combates de longa duração e envergadura.

Segundo o senador democrata Chris Murphy, ainda existem diferenças irreconciliáveis sobre o conteúdo da AUMF.

Para seu colega do partido vermelho Lindsey Graham, os legisladores não devem alcançar um acordo que autorize esta guerra, porque não existe na verdade uma certeza sobre qual é a ameaça que enfrenta os Estados Unidos.

Pouco depois de Obama anunciar o envio das FOE à Síria, os democratas imediatamente rejeitaram essa escalada no conflito e sugeriram que isso poderia reabrir o debate sobre a eventual aprovação da AUMF.

Segundo o diário The Hill, o tema provocou amplas divisões entre democratas e republicanos e inclusive dentro das fileiras de cada partido, a tal ponto que Bob Corker, presidente do Comitê de Relações Exteriores do Senado, sugeriu que ao menos pelo momento não é necessário um projeto de lei deste tipo.

Tal e como disse desde o princípio, penso que a Administração tem a autoridade legal necessária para fazer o que estime contra o EI, assinalou Corker.

Para seu colega democrata Ben Cardin, seria extremamente difícil que o Congresso aprove uma versão da AUMF que Obama possa aceitar e assinar para convertê-la em lei, devido ao alto nível de diferenças que existem a respeito.

Enquanto o senador republicano Rum Johnson considera que o principal obstáculo para conseguir a lei é que o chefe da Casa Branca não tem sido sério em apresentar uma estratégia, enquanto outros se queixam de que os membros do Capitólio nem sequer tentaram conseguir um acordo em relação ao tema.

De qualquer forma, nas atuais circunstâncias da batalha contra o EI, não parece que uma decisão dos legisladores, em um sentido ou outro, tenda a reduzir a participação dos Estados Unidos nesta contenda.

Pelo contrário, tudo indica que o Executivo não tem urgência em que o Congresso aprove uma legislação para autorizar o que já é um fato consumado: o envio de mais unidades terrestres, bem como um eventual aumento dos bombardeios às posições do EI e inclusive contra objetivos das forças governamentais sírias.