Professora da USP explica o que você precisa saber sobre a PEC 241
Principal medida econômica do Governo Temer, a PEC 241 congela os gastos públicos por 20 anos. Aprovada no último dia 25, na Câmara dos Deputados, a medida que contou com pouquíssima participação popular será encaminhada ao Senado para duas votações. Caso seja aprovada, serão duas décadas de duros golpes nos direitos sociais previstos na Constituição.
Publicado 31/10/2016 20:50
No discurso oficial, a PEC 241 é tratada como uma forma de economizar e evitar desequilíbrio nas contas públicas. Para entender realmente do que se trata, bem como explorar outras alternativas, o Justificando Entrevista recebeu em seus estúdios a economista Professora na Faculdade de Economia e Administração da USP, Laura Carvalho.
Para Laura, deve ser esclarecido que a crise econômica brasileira é uma crise de receita, e não de gastos. Ou seja, um grande problema no debate é a desinformação e aposta no “mito do excesso de gastos”, quando, na verdade, trata-se de falta de arrecadação, já que os gastos permaneceram ou foram menores do que em outros governos.
Esse descompasso entre teto de arrecadação e crise de receita, na prática, significa que uma vez superada a crise de arrecadação, isso não será revertido nos gastos, uma vez que haverá um teto. “É uma crise sobretudo pelo lado da receita já que as despesas do governo, as despesas primárias, cresceram até menos nos últimos anos do que em muitos outros períodos ou nos governos anteriores.Apesar do mito de que o colapso é por um excesso de gastos, o colapso é por falta de receita”.
A PEC, portanto, trata de um assunto que sequer irá desempenhar papel efetivo na economia, quando também, na verdade, procura excluir da mesa de assuntos, outros temas mais delicados e sensíveis para os interesses mais presentes no Legislativo.
“No fundo você tira da mesa de discussão tudo que tem a ver questão tributária, tributação dos mais ricos, o fim e a eliminação das desonerações fiscais, a discussão sobre a taxa de juros, isso tudo sai da mesa”.
Quanto à inflação, outra justificativa oficial para a necessidade da PEC, Laura explica que, no último ano foram reajustados todos de uma vez os preços controlados artificialmente, como gasolina, energia elétrica, correspondendo a 46% da inflação do último ano. A questão não tem relação com a PEC do Teto.
“Dizer que você precisa fazer uma medida que congele o teto de gastos por 20 anos para controlar a inflação, é ignorar a própria dinâmica da inflação, que a cada ano responde a fatores diferentes”.
As “verdades” da PEC 241
No debate imposto por campanhas oficiais e por economistas procurados por grandes veículos de comunicação, em regra se aponta como a PEC sendo o único caminho possível para recuperar o país da crise.
A narrativa adota, por exemplo, a máxima de que seria como um orçamento doméstico, no sentido de você apenas gastar o quanto arrecada. Para Laura, um pensamento simplista, uma vez que em se tratando de macro-economia, “o quanto você gasta em determinadas áreas, tem impacto no quanto as pessoas vão consumir, em dinamizar certos setores”.
De outro lado, qualquer crítica que se faça a esse pensamento é tido como “ideológica”, como um modo de desqualificar o rigor técnico da análise, pois o debate imposto se diz “imparcial”. Laura critica essa retórica:
“É muito perigosa essa ideia de que é tudo técnico. Então, vende-se para as pessoas ‘olha, é técnico, você não entende, você não pode discutir isso daqui, isso que você está falando é política, é ideologia. Nós somos os técnicos’. Não é verdade, ideologia todo mundo tem em alguma medida, inclusive essas coisas que são vendidas como técnicas também estão carregadas de ideologia”.
São modos de discurso para afastar a população do debate e aprovar uma medida que durará vinte anos com graves consequências para todos. “O que é mais grave, mais do que a proposta em si, mas é que essa proposta vem, provavelmente será aprovada do jeito que tá e você não tem espaço ou desejo por parte do governo de promover um debate mais amplo com sociedade”.
Há alternativas para a PEC
Como propõe Laura, há alternativas para a PEC 241. Por exemplo, um dos grandes debates a ser travado pela sociedade civil deveria ser a taxa de juros altíssima no país e trabalhar formas de diminui-la sem impactos na inflação.
Outra questão apontada pela Professora foi a dos impostos – “Então, se você quer uma solução de curto prazo e o país tem mais de 65% dos rendimentos dos que são os mais ricos na população que são isentos de impostos, nada mais justo e natural que a gente discuta cobrança de impostos em cima desses que podem pagar mais”.
A tributação inclusive pode ser de operações que são tributadas na gigantesca maioria dos países do mundo – “A maior parte dos países no mundo, por exemplo, tributa dividendos, ou seja, aqueles lucros que vêm das empresas, mas que não são reinvestidos nas empresas e vão para os sócios. A gente desde 1995 parou de tributar isso. Quase todos os países do mundo tributam isso”.
Algumas alternativas, da mesma forma, são mais consensuais entre economistas, mas que estranhamente o Congresso não as adota – “A primeira coisa que o Congresso precisa fazer é eliminar todas aquelas desonerações fiscais que foram concedidas a torto e a direito sem contrapartida durante os anos do governo Dilma. Isso não está nem na mesa [para ser discutido]”.
“Por que que muitos grandes empresários, muitos parlamentares são a favor da PEC 241, mas não discutem desonerações fiscais? Acho que não é muito difícil imaginar” – complementa.