Regina Ribeiro: "Sobre uma quarta-feira insana"

“Na quarta-feira, não vi uma única pesquisa favorável à mulher e à sua situação. Estamos sujeitas à violência de todos os tipos, diariamente, a partir da hora em que abrimos os olhos pela manhã; ganhamos menos do que os homens em até 62% realizando o mesmo trabalho, embora tenhamos investido mais tempo estudando e 40% de nós sejamos chefes de família”.

Por *Regina Ribeiro

Temer e Marcela - Foto: BETO BARATA/PR

Que este governo significa o que há de mais retrógrado na política brasileira, até a panela do arroz e a frigideira sabem, mas o pior é a evidência disso a cada fala do presidente Michel Temer. O discurso de Temer no Dia Internacional da Mulher não deixa dúvidas de que este governo “reformista” é separado do Brasil, não faz ideia do que é o País e pouco conhece de seus habitantes reais.

No início desta semana, Temer afirmou que a reforma da Previdência iria “ajudar os mais pobres”. Até porque, ele disse, a maioria recebe um salário mínimo. Como já temos ciência, nosso salário mínimo é comparável ao dos países mais desenvolvidos do mundo. Os técnicos de Temer até acham que as mulheres são parte da causa do déficit da Previdência, porque vivem mais. Deve ser a deixa para, a qualquer momento, o governo propor uma lei que reduza nossos dias a fim de ajudar o equilíbrio das contas.

Quando falou da reforma das leis trabalhistas, o presidente garantiu que, de forma nenhuma, o governo quer atacar os direitos dos trabalhadores. Claro que não: no Brasil, todas as empresas estão no patamar da Google e as relações de trabalho são equivalentes às do Vale do Silício. Estamos avançadíssimos. Nosso único problema são justamente as leis.

Mas foi ao se pronunciar sobre as mulheres que eu achei perigosa a distância entre discurso e realidade. Na quarta-feira, não vi uma única pesquisa favorável à mulher e à sua situação. Estamos sujeitas à violência de todos os tipos, diariamente, a partir da hora em que abrimos os olhos pela manhã; ganhamos menos do que os homens em até 62% realizando o mesmo trabalho, embora tenhamos investido mais tempo estudando e 40% de nós sejamos chefes de família. Nós, as negras, ganhamos ainda menos não importa o cargo que ocupemos.

Daí, o presidente vem com a história de que as mulheres são realmente muito boas no trajeto casa–supermercado. E que a sociedade inteira está em nossas mãos e que a educação do País passa exclusivamente por nós, que, em nossos lares, educamos nossos filhos, e fazemos bico como fiscal de preços no supermercado. Confesso a vocês que só me lembrei do filme Vincere, quando Mussolini faz um discurso sobre o papel da mulher na Itália. O que veio depois está na história.

*Regina Ribeiro é jornalista.

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