Juíza condena ex-ministra por criticar apologia de Frota ao estupro

A ex-ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres Eleonora Menicucci recebeu uma sentença proferida no dia 19 de abril pela Juíza Juliana Nobre Correia, da 2º Vara do Juizado Especial Cível, em São Paulo, condenando-a a pagar o valor de R$ 10 mil reais em indenização por danos morais ao ex-ator pornô Alexandre Frota, que atualmente exerce sua militância em grupos de extrema direita.

Por Laís Gouveia

Mulheres repudiam Alexandre Frota em apoio a Eleonora Menicucci - RBA

Alexandre Frota processou Eleonora Menicucci por uma entrevista concedida pela ex-ministra à jornalista Mônica Bergamo, na qual ela condenou a postura do ministro da Educação, Mendonça Filho (DEM-PE), em receber o ex-ator pornô em seu gabinete para debater sobre políticas educacionais, em 2016.

A crítica de Eleonora ao encontro baseia-se no fato de Alexandre Frota ter relatado num programa de TV, em 2014, que fez sexo com uma mãe de santo à base da força, caracterizando, segundo ela, apologia ao estupro, justificando ainda que, como ex-ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres, teria embasamento para falar sobre o tema.

Veja abaixo o vídeo com o relato de Alexandre Frota sobre a relação sexual com a mãe de santo:

A juíza Juliana Correia baseou sua sentença final declarando que o ministro Mendonça Filho agiu de forma coerente, atendendo em seu gabinete um representante do povo e, no momento que Eleonora o critica por apologia ao estupro, ela ultrapassa o direito à liberdade de expressão e acaba desqualificando a imagem de Alexandre Frota, prejudicando-o.

Juliana argumenta ainda em seu parecer que a resposta da ex-ministra deveria ser restrita apenas ao debate educacional, não ultrapassando questões de ordem pessoal de Frota. À decisão, na primeira instância, cabe recurso.

Eleonora: “condenação não atinge só a mim”

Em nota divulgada nesta quinta-feira (4), Eleonora Menicucci condenou a decisão da juíza. "Lamentavelmente a condenação não atinge só a mim, mas as mulheres que lutam há séculos contra o estupro, contra as violências de gênero e hoje em nosso pais contra as perdas de direitos que o governo golpista tem imposto, sobretudo a nós mulheres".

Flávia Biroli, vice-diretora do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UNB) e autora de publicações sobre desigualdade de gênero, considera que a sentença da juíza reforça a cultura do estupro no país. "Estamos em um momento de disputa em relação aos acordos civilizatórios. A constituição de 1988 é um marco que estabelece patamares menos violentos, com mais garantias sociais, e parte desse pacto diz que violência contra mulher e estupro não valem. Quando uma juíza condena a ex-ministra por um comentário crítico sobre apologia ao estupro, feito por alguém que tem circulação na mídia, como o caso do Alexandre Frota, ela dá um recado para sociedade de que sim, podemos tolerar o estupro, isso é muito grave", ressalta.

“Decisão não é apenas contra Eleonora Menicucci”

“Vivemos em um país onde a violência contra a mulher é seríssimo, sistêmico. Essa decisão não é apenas contra Eleonora Menicucci, é um recado para sociedade de que tais práticas valem. Liberdade de expressão é bem diferente de discurso de ódio e apologia ao estupro, incita ações violentas. Devemos fazer um novo chamado ao pacto social que valeu nas últimas duas décadas”, conclui Flávia.

Lucia Rincon, presidenta da União Brasileira de Mulheres, (UBM), declara que a entidade presta total apoio à Eleonora. “Nós somamos contra a apologia ao estupro, não admitimos que pessoas usem da sua projeção para poder continuar a propagar suas atitudes machistas, em uma cultura misógina. Essa atitude da juíza reforça as práticas violentas no país”, ressalta.

Eleonora Menicucci

Eleonora Menicucci de Oliveira é uma socióloga e ex-ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres do governo Dilma. Formada em ciências sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), é professora titular de saúde coletiva da Universidade Federal de São Paulo e atuante no movimento feminista.