Governo atropela Comitê da Internet Brasil para alterar composição

O governo atropelou o Comitê Gestor da Internet ao abrir, sem avisar, um debate público com o objetivo de fazer mudanças na composição. Para integrantes recém-eleitos para os novos mandatos do CGI.br, movimento revela a pressão de um viés mais pró-mercado em temas como a neutralidade de rede e negócios na internet.

Por Luís Osvaldo Grossmann, para Convergência Digital

Internet - Reprodução

“O governo consultar a sociedade é sempre algo positivo, salutar. Existem, contudo, muitas formas de fazê-lo. Ao decidir lançar uma consulta pública dessa relevância sem antes discutir o assunto com o próprio CGI.br, que se reúne no próximo dia18, o governo sinaliza um açodamento na condução do processo, cujo cronograma sequer é conhecido”, lembra o conselheiro Thiago Tavares, um dos eleitos pelo Terceiro Setor.

“O tema é recorrente. E tem méritos, como discutir se faz sentido uma cadeira no CGI.br para o setor de conteúdo, desde que não se confunda com propriedade intelectual. A surpresa foi pela forma, porque foi indicado que haveria uma discussão antes na reunião do dia 18, a primeira dos recém-eleitos. Ali poderíamos afinar melhor certos temas, como a mistura que entendo ruim com atribuições operacionais do NIC.br. Coisas que poderiam ter sido melhor tratadas”, emenda Henrique Faulhaber, conselheiro eleito pelo segmento empresarial.

Para Flávia Lefèvre, também eleita pelo Terceiro Setor para o Comitê Gestor da Internet, a manobra mira em interpretações que deixem a Lei 12.965/14, o Marco Civil da Internet, mais próxima do que desejam provedores de conexão e de conteúdo na rede.

“A atual coordenação do CGI.br, no governo Temer, já vem defendendo mudanças na neutralidade de rede e na exigência de consentimento na internet, pontos que o MCTIC defende em sua ‘Estratégia Digital’. Mas com a atual composição do Comitê isso não tem como avançar. Então mudar o CGI.br é um passo para mudar o Marco Civil da Internet”, avalia. “Ninguém é contra fazer revisão. O Decreto é de 2003 e de lá para cá há coisas que podem ser revistas. Difícil é fazer isso em uma atitude unilateral do governo.”

A Coalizão Direitos na Rede, que reúne pelo menos 27 entidades como ITS, FGV, Proteste, Idec e Intervozes, publicou uma nota de repúdio na qual pede o cancelamento da consulta pública, aberta na terça-feira (8). Segundo a entidade, o coordenador do CGI.br e secretário de Políticas de Informática do MCTIC, Max Martinhão, indicou por email aos conselheiros que o tema seria tratado na primeira reunião pós-eleições, no dia 18, sem avisar que a consulta já seria aberta.

“Martinhão e outros integrantes da gestão Kassab/Temer também têm defendido publicamente que sejam revistas conquistas obtidas no Marco Civil da Internet, propondo a flexibilização da neutralidade de rede e criticando a necessidade de consentimento dos usuários para o tratamento de seus dados pessoais. Neste contexto, a composição multissetorial do CGI.br tem sido fundamental para a defesa dos postulados do MCI e de princípios basilares para a garantia de uma internet livre, aberta e plural”, diz carta da Coalizão.