Afinal, a taxa básica real de juros caiu no governo Temer?

Não faz sentido comemorar uma taxa real superior a 4% quando as taxas internacionais são muito menores, ou negativas, e há que se questionar uma política monetária para conter um consumo que vem caindo e é hoje inferior ao registrado há cinco anos.

Por Emilio Chernavsky*

gráfico taxa de juros

O governo tem comemorado as sucessivas quedas na Selic, taxa básica de juros da economia, que, de 14,25% ao ano em outubro de 2016, caiu para 8,25% hoje, e apontado essas quedas como fator central para a esperada retomada do investimento, que continua até o momento em queda.

Se a taxa nominal de juros de fato caiu significativamente, a taxa real, que desconta o efeito da inflação e tem impacto maior sobre o investimento, o fez de forma muito mais modesta. Como mostra o seguinte gráfico, dependendo da forma em que é calculada, inclusive, ela ainda se encontra acima da taxa verificada logo após o impeachment da presidenta Dilma.

Isso é o que ocorre, como apontam os críticos ao governo, quando o cálculo é feito descontando da Selic a inflação passada acumulada nos últimos 12 meses. De fato, com a continuidade da grave recessão, a inflação caiu mais rapidamente que a taxa de juro nominal e a taxa real, em vez de também cair, subiu fortemente no início do governo Temer, reduzindo-se apenas em 2017 e de forma contida em razão da continuidade da queda da inflação. Com isso, a taxa real “ex-post” assim calculada ainda hoje é mais elevada que a taxa verificada ao longo de todo o governo Dilma.

Já quando, como os defensores do governo têm preferido fazer, o cálculo desconta da Selic a expectativa de inflação futura para os próximos 12 meses aferida junto a agentes do mercado financeiro, a queda da taxa real “ex-ante” faz com que ela passe a se situar abaixo do patamar registrado desde o início de 2014.

Quando não ocorrem grandes flutuações, a inflação passada verificada se aproxima da inflação futura esperada e as taxas reais ex-ante e ex-post tendem a se aproximar. Como esse não é o caso hoje, elas são diferentes[1]: a taxa ex-post, que desconta da Selic uma inflação verificada baixa resultante do contexto de profunda recessão, permanece mais elevada que a taxa ex-ante, que desconta uma expectativa de inflação futura mais elevada já que pressupõe a recuperação da atividade econômica.

Calculada de uma forma ou de outra, é certo que a taxa básica real de juros efetivamente caiu nos últimos meses, embora não tanto quanto a Selic.

O que não é certo é se faz sentido comemorar uma taxa real superior a 4% quando as taxas internacionais são muito menores, quando não negativas, e se uma política monetária ativa deve ser hoje usada no país para conter um consumo cujo volume, ao invés de crescer, vem caindo nos últimos três anos e ainda hoje é inferior ao registrado cinco anos atrás.

Nota

[1]Nenhuma das taxas é a “correta”, e elas trazem informações diferentes. Enquanto a taxa ex-post indica o custo efetivo de um empréstimo já tomado e, com isso, o impacto dos juros sobre a distribuição da renda entre devedores e credores, a taxa ex-ante indica o custo esperado de um empréstimo a tomar e captura melhor o efeito dos juros sobre a decisão de investimento.

*Doutor em economia pela USP