No século XIX, foliões faziam campanha pela libertação dos escravos

Em tempos de folia, vale dar um mergulho na história e visitar os anos pré-abolicionistas do século XIX. Era época dos primeiros blocos e cordões carnavalescos, com motivos africanos e críticas à situação do Império, que insistia em manter o regime escravista. Aparecem clubes carnavalescos organizados por africanos, negros e mestiços, tais como Embaixada Africana, Pândegos da África, Chegada da África, entre outros.

por Fernando Paulino*

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Em 1864, a sociedade Tenentes do Diabo decidiu suspender a construção de carros alegóricos e, em vez de desfilar, comprou a liberdade de alguns escravos com o dinheiro arrecadado. Em 1876, a sociedade Estudantes de Heidelberg convocou os foliões para fazerem suas doações. Em vez de utilizar os recursos para organizar o desfile, o que se arrecadou serviu para comprar uma carta de alforria de um escravo, que, dias antes, salvara uma menina de afogamento na praia.

Já o Clube dos Fenianos, fundado em 8 de dezembro de 1869, chegou a formar grupos estratégicos, como os Girondinos e Pelicanos, que executavam ações para libertar escravos. Esses dois grupos, na efervescência do movimento pró-Abolição, promoveram um baile intitulado “1º Can-can do Prazer”. Toda renda foi revertida para compra de cartas de alforria.

No Carnaval de 1881, os Fenianos apresentaram o carro alegórico “a Mancha de Júpiter”, em que o imperador D. Pedro II aparecia manchado pela escravidão. A Guarda Imperial tentou interromper o desfile, mas ficou só na ameaça.

Em 1887, os Girondinos trouxeram um carro com uma mulher representando o Império – já decadente, porém, resistente – e empunhando o estandarte do grupo. A seu lado, dois escravos recebiam a carta de alforria. O Jornal do Commercio do dia 22 de fevereiro daquele ano tirava a dúvida de muitas pessoas: efetivamente, em plena folia, dois negros ganhavam a liberdade, a partir da arrecadação feita pelos Girondinos.

Para musicar essas memórias, vale ouvir o samba enredo deste ano do Paraíso do Tuiuti, que fala da situação atual do negro no país: Meu Deus, meu Deus, está extinta a escravidão?

Fernando Paulino é Pós-graduando em Educação e Cultura Negra

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