“Diretores do BNDES na gestão Temer praticam política do desmonte”

Em carta aberta, o presidente da Associação de Funcionários do BNDES, Thiago Mitidieri, se dirige ao novo presidente da instituição, Dyogo Oliveira, na qual fala dos ataques que servidores e a própria instituição têm sofrido no último período. Segundo o texto, as administrações do banco durante o governo Temer possuíram "um caráter de intervenção e investiram numa falsa busca por moralização", além de que vieram "praticando a política do desmonte".

BNDES

Confira abaixo a íntegra:

Carta aberta ao novo presidente do BNDES

Prezado Dyogo Oliveira,

Como presidente da Associação dos Funcionários do BNDES, gostaria, cordialmente, de lhe dar as boas-vindas. Torço para que o senhor esteja preparado para o grande desafio de dirigir esta Casa. E me coloco à disposição para cooperar no que for preciso neste caminho. Espero, em audiência próxima, poder conversar com o senhor, de forma que possa conhecer nossas posições sobre o que vem acontecendo com o Banco e seus empregados e empregadas.

Antes de qualquer coisa, é preciso observar o momento em que estamos. Em menos de dois anos esta é a terceira administração do Banco no governo Temer, ocorrendo no final do governo, em ano eleitoral, em meio a uma brutal crise econômica e política – talvez a pior que já tenha existido na historia brasileira. É um momento muito difícil e muito sensível.

O Banco se tornou, nos últimos tempos, alvo de muitas denúncias e suspeitas. Entrou no olho do furacão da crise política brasileira, e também de outros países vizinhos. Todas as investigações feitas até o momento, por diversos órgãos de controle e CPIs, não mostraram qualquer evidência de corrupção entre os funcionários do BNDES. Isso é muito importante, pois na conjuntura em que vivemos, em que se enfatiza uma cruzada moral contra a corrupção em nosso país, não é pouca coisa que a ética pública tenha sido um valor preservado e respeitado no BNDES.

Não podemos esquecer, contudo, que 37 funcionários do Banco sofreram condução coercitiva pela Policia Federal no ano passado, no âmbito da Operação Bullish, e continuamos sofrendo com a sanha persecutória do TCU, que continua exorbitando de suas funções. Importante relembrar que ao se despedir do BNDES, o ex-diretor Ricardo Baldin, trazido pela ex-presidente Maria Silvia e responsável pelas Comissões de Apuração Interna, em entrevista à imprensa, criticou a perseguição sofrida pelo BNDES pela “ditadura dos órgãos de controle”.

É preciso perceber que a Casa se encontra traumatizada e o corpo funcional está sofrido com tudo o que vem passando nos últimos dois anos e meio.

A população brasileira, que passou a conhecer o BNDES de forma tão negativa, não entende muito bem o papel do Banco e continua sendo alimentada pela imprensa com uma visão distorcida da instituição.

As administrações do BNDES no governo Temer, em graus diferentes, possuíram um caráter de intervenção e investiram numa falsa busca por moralização. Vieram para encontrar mal feitos, sedentos por punição, mas não acharam aquilo que imaginaram, nessa degradação moral presente em nosso país, que continua atordoando o brasileiro comum todos os dias, num enredo sem fim.

E essas administrações vieram, cada uma ao seu modo, praticando a política do desmonte, que está servindo, em nome do fundamentalismo de mercado, para desconstruir os instrumentos que o BNDES possui para atuar como um Banco de Desenvolvimento.

Desculpe-me, mas a TLP está longe de ser a salvação do BNDES. A liquidação antecipada dos empréstimos do Tesouro também está longe de ser a salvação das finanças públicas. Não é por causa do BNDES que o “mercado”, no Brasil, não financia o investimento industrial, a infraestrutura, a inovação, as exportações e as MPMEs.

O atual cenário de inflação e Selic baixas não justifica a extinção da TJLP da forma como ocorreu, com a criação da TLP. Tecnicamente, a TLP é estranha ao conceito de Banco de Desenvolvimento. Foi gestada em segredo e aprovada pelo Parlamento, via Medida Provisória, de forma açodada, sem estudos de impacto e sem discussão técnica mais aprofundada.

E muito além de ter que se reinventar, o BNDES precisa é de uma política pública de desenvolvimento, de longo prazo, que norteie e respalde sua atuação. Precisa de planejamento governamental. Precisa de instrumentos adequados e estabilidade organizacional. Coisas com que esse governo, diga-se de passagem, nunca se preocupou.

Como presidente, o senhor terá a chance de conhecer o BNDES por dentro. E vai poder constatar por si mesmo que a realidade sobre a instituição é bem diferente daquilo que aparece nas narrativas massificadas dos meios de comunicação. Queremos cooperar, mas sem que seja revista a atual política de desmonte, não vemos como o BNDES poderá cumprir o papel que a sociedade dele espera.

Espero também que diante da realidade nua e crua, desfeitas as fantasias e frente aos desafios concretos de promover o investimento de longo prazo no Brasil, de impulsionar o setor produtivo e financiar a infraestrutura que o país tanto necessita, o senhor reveja a política de desmonte até aqui adotada e dê novamente condições para que o BNDES possa cumprir sua missão de Banco de Desenvolvimento.

A AFBNDES continuará resistindo, pois acreditamos que um Banco de Desenvolvimento é uma instituição estratégica para o país, e que para promover o desenvolvimento com recursos próprios e em moeda nacional o Brasil não pode abrir mão de ter um BNDES forte.

Thiago Mitidieri, presidente da AFBNDES