Guálter George: O pior Supremo faz prosperar a pior crise da política

“O País precisa de uma Corte Suprema que se faça respeitar novamente, algo de que não dispõe no momento, o que explica a crise sem fim e, mais ainda, o desalento geral quando se olha para o amanhã atrás de vislumbrar uma saída”.

Por Guálter George*

Supremo Tribunal Federal - Foto: José Cruz/Agência Brasil

A maior bagunça institucional brasileira, hoje, está no Judiciário, especialmente no Supremo Tribunal Federal (STF). Triste, mas é isso.

Sem dúvida, presenciamos uma das piores combinações de plenário já formadas, conforme, inclusive, lamentou outro dia Gilmar Mendes, um dos ministros atuais e, cá entre nós, de lugar cativo na fila destacada onde devem estar sentados os piores. É um quadro lamentável por ser o poder, teoricamente, melhor capacitado a garantir a estabilidade possível dentro de um quadro de desafiador caos político.

O que se tem, na realidade objetiva disponível, é um STF que não ajuda a baixar a temperatura política e até contribui para mantê-la nas alturas. Onze pessoas apenas, nove homens e duas mulheres, que demonstram-se pequenas para a tarefa que lhes está entregue num momento de turbilhão, alguns por tibieza ou insegurança, outros pelo ego superdimensionado que os engole cotidianamente, outros mais pela falta de compreensão sobre o quão grave é o momento. Portanto, até de falta de inteligência política podemos estar falando na análise do cenário.

Gilmar, mesmo sendo aquele que tem espaço garantido entre os piores, costuma dizer coisas boas e certas nos últimos tempos. O problema é que o faz preocupando-se pouco, ou nada, com o fato de uma parte boa das críticas contra o Judiciário que saem de sua verve forte e certeira voltar-se contra si próprio, ao estilo bumerangue.

Há demonstração clara de descompromisso dele com o próprio Judiciário quando adota uma postura de desqualificar colegas, de tripudiar sobre o tribunal que integra apontando pejorativamente suas características “bolivarianas”, de aproveitar as câmeras de TV apontadas para o plenário e acusar colegas de praticar advocacia a partir da toga, enfim, o jeito que escolhe para o debate público sobre o momento do País e a capacidade que tem o STF de ajudar a superá-lo é fator sempre de mais crise, não do encaminhamento de soluções.

Há ministros lidando muito mal com o protagonismo do Judiciário, decorrência natural da profunda perda de credibilidade do Executivo e Legislativo nos últimos anos. O resultado terrível de tudo é que a crise tem obtido espaço para prosperar exatamente onde deveria encontrar um porto seguro de resistência. Ali, na Justiça, é onde as grandes polêmicas nacionais deveriam encontrar uma contraposição clara, a partir de decisões rígidas e inquestionáveis, tudo o que não temos nas sentenças assinadas pelos atuais componentes do STF.

Sejam as monocráticas, sejam aquelas coletivas que resultam de intermináveis debates marcados por críticas, ataques mútuos, termos incompreensíveis e, às vezes, argumentos inconvincentes até para quem os apresenta.

Gilmar está certo, mas, nem de longe é a pessoa credenciada para liderar o processo que nos pode reconduzir à normalidade. A despeito de uma alegada liderança técnica que muitos dizem que exerce, ou, pelo menos, já exerceu. Falta-lhe equilíbrio, para citar apenas uma das muitas qualidades exigidas de quem se dispuser a assumir o papel. O problema é que dificilmente sairemos dessa situação dramática no horizonte de curto ou médio prazo, como precisamos, sem o restabelecimento do ambiente de serenidade no STF. O País precisa de uma Corte Suprema que se faça respeitar novamente, algo de que não dispõe no momento, o que explica a crise sem fim e, mais ainda, o desalento geral quando se olha para o amanhã atrás de vislumbrar uma saída.

*Guálter George é editor de Política.

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