“Reajustes diários da Petrobras são abusivos”, afirma líder petroleiro

José Maria Rangel, coordenador-geral da FUP, critica Pedro Parente, que só "atende aos interesses do mercado", e explica a greve dos petroleiros.

Por Sergio Lirio, da CartaCapital

José Maria Rangel - Foto: Gibran Mendes/Fotos Públicas

Enquanto os caminhoneiros desmontavam os bloqueios nas estradas, os petroleiros iniciavam na porta das refinarias uma paralisação de advertência de 72 horas. É a única coincidência entre os movimentos. A FUP, afirma o coordenador-geral José Maria Rangel, se concentra na denúncia da política de reajustes diários da Petrobras, responsável por uma alta de 20% no preço dos combustíveis só neste ano.

O principal patrão da empresa, lembra o sindicalista, é o povo. Um fato ignorado neste momento. “O Pedro Parente só serve ao mercado financeiro, que bancou sua nomeação para vender o pré-sal”. No dia 12, os petroleiros vão decidir em assembleia se iniciam uma greve por tempo indeterminado e interrompem a produção da estatal.

CartaCapital: Qual o objetivo da greve?

José Maria Rangel: A nossa pauta dialoga com os anseios da sociedade pela redução do preço da gasolina, do gás de cozinha e do diesel, não da maneira anunciada por Michel Temer. O brasileiro hoje paga o segundo maior valor da gasolina entre os países produtores de petróleo, atrás somente da Noruega.

A carga tributária tem um peso grande, é verdade, mas a política desastrada implantada pelo Pedro Parente na Petrobras aumentou em 20% só neste ano o preço do combustível que sai das refinarias. Os reajustes diários são abusivos.

Os defensores da atual política de reajustes constantes acusam o governo Dilma de enfraquecer a Petrobras com um controle artificial de preços. Qual seria a estratégia correta?

Essa acusação não tem fundamento. Não podemos perder de vista que a Petrobras é uma empresa estatal. Ela tem de servir ao seu principal patrão, o povo. Ela pertence aos brasileiros. Durante os mandatos do PT foi feita a opção estratégica de direcionar a empresa para o desenvolvimento do País. Este governo escolheu permitir a transferência abissal de recursos da estatal para o mercado financeiro.

Se a atual política tivesse sido adotada durante os governos Dilma e Lula, quando o preço do barril de petróleo estava acima de 100 dólares, o lucro chegaria a 50 bilhões de reais. Valeria a pena? Esta é a pergunta. Valeria garantir esse lucro para os acionistas privados, enquanto a população ficaria sem condições para comprar um botijão de gás? É uma lógica perversa. Esconde-se, de forma deliberada, que as dificuldades recentes da Petrobras derivaram da queda do preço internacional do petróleo.

De que maneira?

A Petrobras passou por uma situação difícil, por conta da cotação do barril de petróleo. O preço caiu de cerca de 120 dólares para menos de 30. O mercado internacional depende de uma série de variáveis. Quando o Parente anunciou a política atual, alertamos que quem iria pagar a conta era a população.

Observe o cenário lá fora. A Venezuela enfrenta problemas, os Estados Unidos estão em conflito com o Irã, com reflexos na Síria… O barril, por consequência, chegou a 80 dólares. Desde que a Petrobras mudou a política, foram realizados mais de 200 reajustes de preço. Os combustíveis subiram acima de 50% no período.

O custo de extração de petróleo no Brasil é um dos mais competitivos do mundo. Isso não deveria permitir à Petrobras praticar preços mais baixos?

As refinarias instaladas no Brasil têm capacidade para refinar 90% do petróleo consumido internamente. A Petrobras escolheu, porém, abrir mão dessa vantagem. Reduziu a produção para 70% e abriu espaço para as importadoras de derivados. Elas suprem atualmente 30% do consumo e ganham muito dinheiro com a política de reajustes diários. A estatal brasileira, na contramão de outras empresas semelhantes no mundo, caminha para se transformar em uma exportadora de óleo bruto e uma importadora de refinados, de derivados.

Como responder à acusação de que a greve dos petroleiros é oportunista?

O nosso calendário estava traçado e divulgado muito antes da paralisação dos caminhoneiros. Obviamente, a mobilização deles joga luz sobre um tema que está na nossa pauta desde o início. A greve de 72 horas estava marcada e seria feita em parceria com os eletricitários, dispostos a denunciar os riscos da privatização da Eletrobrás. Como o assunto saiu da agenda, os eletricitários decidiram suspender a paralisação.

Nós mantivemos a agenda, pois na Petrobras o desmonte continua a todo vapor. A empresa anunciou recentemente a venda de quatro refinarias, além de gasodutos e terminais. No dia 12, em assembleia, os petroleiros vão decidir se iniciam ou não uma greve com a parada de produção.

Por que a Petrobras tem sido preservada das críticas?

O mercado bancou a nomeação do Parente para entregar o pré-sal. Não há interesse em desgastá-lo e provocar a sua saída. Se ele tivesse um pouco de hombridade, pediria demissão. Depois do acordo do governo com os caminhoneiros, a tal política de reajustes diários, ao menos no caso do diesel, caiu por terra. Ela não era “imexível”? O Parente não ameaçou se demitir se houvesse intervenção de Brasília?

Os petroleiros foram os sindicalistas que mais se aproximaram dos caminhoneiros, até pela coincidência de certas reivindicações. Qual a dificuldade do movimento sindical organizado em lidar com essa greve?

Em 2015, quando o diesel estava a 2,40 reais, os caminhoneiros foram pedir “Fora, Dilma”. Agora, não apontam culpados. Essa é uma diferença. A principal reivindicação é a redução dos impostos, interesse dos empresários. E é difícil identificar claramente as lideranças. Além disso, o movimento estava infiltrado por defensores da intervenção militar. Há muita similaridade com os protestos de 2013. Os caminhoneiros se declaram apolíticos assim como os jovens do Movimento Passe Livre.

A discussão sobre os preços dos combustíveis enfraquece a defesa da privatização da Petrobras?

Sim, caso a gente consiga aproveitar a oportunidade para esclarecer a população a respeito de como opera a Petrobras, a começar por informar os consumidores de que temos a capacidade de refinar 90% do combustível utilizado no País e, por opção, essa alternativa foi abandonada.

Apesar de todas as críticas, a empresa continua querida pelos brasileiros. A maioria é contra a sua privatização. O “apagão” nos combustíveis só reforça esse sentimento.