Final de Copa; jogo e política – Por Felipe Iturrieta

"Se tirarmos as discussões políticas que surgem em momentos como essa final, o que sobra é Nike e FIFA enchendo os bolsos".

Griezman futebol - Foto: Fotos Públicas

Há quem diga que futebol e política não deveriam se misturar. É ingênuo quem acha que não há essa conexão – Copas organizadas (e vencidas) por ditaduras; histórias (provavelmente muito exageradas) como Pelé parando uma guerra civil ou a Partida da Morte entre ucranianos e nazistas; torcidas organizadas utilizando saúdos fascistas, para citar poucos exemplos, mostram que o futebol é um campo de jogo político. Certamente estão equivocados os que acreditam que o futebol é "só um jogo" (ou pior, "só 22 homens correndo atrás de uma bola").

Os que dizem que futebol e política não devem se misturar, no entanto, não pecam pela ingenuidade, já que reconhecem a conexão – erram ao afirmar que "o certo" seria livrar o jogo desse peso e simplesmente fazer a bola rolar.

Se descascarmos o futebol, removendo as camadas políticas, não estaremos mais perto de encontrar o que gostaríamos – no caso, o esporte de cavalheiros, a arte e o talento, a estratégia e a tática. Antes de obtermos o diamante lapidado – o fascínio puro pela esfera na grama, a alegria nas vitórias e a união nas derrotas – teremos que passar pelos cartolas que enriquecem inescrupulosamente e os magnatas que lavam dinheiro. Porque se tirarmos as discussões políticas que surgem em momentos como essa final, o que sobra é Nike e FIFA enchendo os bolsos. Certamente corre-se o risco de polarizações perigosas quando discutimos temas sérios em um ambiente impregnado de competição e cerveja, mas acredito que seja necessário usar a oportunidade para aprender sobre as diferentes realidades que se apresentam durante uma competição internacional dessa magnitude.

Podemos falar muito sobre o talento do Mbappe (jogou demais; via-se o pânico nos rostos de Vida e Lovren toda vez que ele pegava a bola), sobre a perseverança de Griezmann, sobre a punitiva exaustão dos croatas (que triste ver numa final de Copa, Mandzukic fazendo gol contra e Modric, jogador tão talentoso e inteligente, totalmente perdido em alguns lances), sobre VAR, pênalti, falta, etc. tenho certeza que muitos o farão (alguns com poesia, outros somente para angariar cliques).

Mas acho que é extremamente importante que também se discuta o neo-nazismo na Croácia ou a relação dos eslavos ocidentais com os russos (que estavam fazendo cara feia para os croatas, por alguns terem se expressado em favor dos ucranianos, por exemplo). É importante que a invasão de campo por parte da Pussy Riot seja assunto nas redes. É essencial falar sobre a situação dos franceses de origem africana, migração e integração. Uma das belezas do futebol é exatamente essa – traz esses assuntos à tona. E a Copa do Mundo faz com que se reverberem ao redor do planeta. Basta fazê-lo de forma ponderada e respeitosa.

Nossa sorte foi que todos esses temas vieram de carona com uma final de Copa do Mundo interessantíssima – jogo aberto, disputado, gols em abundância e muito talento em exibição. Agora é hora de se recuperar da ressaca (quanta vodka!), passar a limpo esses temas e começar a pensar na próxima. Que aliás, vai gerar ainda mais discussão política – uma Copa no Qatar no meio da temporada européia vai dar o que falar.