Em manifesto, SBPC defende Educação, Ciência e Tecnologia no país

Em documento aprovado na última quinta-feira (26), a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) aponta os desafios enfrentados pelo setor de Ciência e Tecnologia na atualidade. Além disso, o texto apresenta diretrizes para a retomada do desenvolvimento científico e social do país, como a revogação da EC 95 de 2016, a interrupção do sucateamento do setor por meio de cortes orçamentário e a recriação do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação.

pesquisa, ciência - agência brasil

O “Manifesto SBPC em defesa da CT&I, da Educação, do Desenvolvimento Sustentável e da Democracia no País”, aprovado pelos sócios da SBPC – reunidos na Assembleia Geral nessa última quinta-feira (26) – foi aprovado na noite da última quinta-feira (26) e reúne diretrizes para que o país retome o desenvolvimento científico e social.

Para a entidade, a Emenda Constitucional 95 de 2016 – que congela os investimentos durante 20 anos – deveria ser urgentemente revogada. Segundo a SBPC, “o teto de gastos públicos, coloca em risco atividades essenciais e prioritárias para a soberania do país: Saúde, Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação, além de impactar outras políticas sociais”.

Na área da saúde, a SBPC destacou o aumento da mortalidade infantil como uma das consequências do teto dos gastos. Já em educação, “o desmonte das políticas públicas voltadas para a inclusão de todos nas escolas tem aumentado a imensa desigualdade que ainda caracteriza a sociedade brasileira”.

Especificamente na área de Ciência e Tecnologia, a SBPC relatou que com o corte de investimentos há a interrupção de bolsas de ensino, pesquisa e extensão. A entidade também aponta como necessária a “interrupção do sucateamento de laboratórios, escolas, institutos de pesquisa, universidades, Institutos Federais de Ensino Superior (IFEs) e o não cerceamento da autonomia administrativa e da gestão financeira em função de normas de administração pública altamente burocratizadas”.

Por fim, é imprescindível a recriação do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, além da recomposição do orçamento da pasta ao maior nível atingido na última década.

“Assim, alertamos que está em curso um projeto acelerado de desconstrução do Brasil, que desrespeita o povo brasileiro e a soberania nacional. Os cortes e mudanças em áreas estratégicas para o País não foram discutidos com a sociedade, e estão sendo implementados por um governo que não tem a legitimidade do voto nem o apoio popular para fazê-los. As eleições de 2018, que devem ser livres e democráticas, desempenharão um papel crucial para a definição dos rumos do Brasil no século 21”, diz o manifesto.

Leia o manifesto na íntegra:

Manifesto da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC

Em defesa da CT&I, da Educação, do Desenvolvimento Sustentável e da Democracia no País

A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) congrega mais de 100.000 professores e pesquisadores afiliados a sociedades científicas, ligadas à SBPC, de todas as áreas do conhecimento: humanidades e ciências sociais aplicadas, ciências biológicas e da vida, ciências exatas e da terra, tecnológicas e engenharias. A SBPC vem a público, novamente, externar sua forte preocupação com recentes acontecimentos que impactarão com certeza a frágil e jovem democracia do nosso país, conquistada por muitas lutas. A autonomia entre os três poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – preconizada no nosso modelo republicano tem sido constantemente ameaçada e desrespeitada.

O povo brasileiro não aceita retrocessos e modelos autoritários. Nenhum indivíduo, grupo ou governo tem a prerrogativa de qualquer espécie ou natureza de ferir o Estado Democrático de Direito e desrespeitar a Constituição Federal.

Entendemos que o Estado Brasileiro necessita que as seguintes medidas sejam adotadas de forma urgente:

1 – Revogação da EC 95 de 2016 que instituiu o teto de gastos públicos, colocando em risco atividades essenciais e prioritárias para a soberania do país: Saúde, Educação, Ciência, Tecnologia e Inovação, além de impactar outras políticas sociais.

Na Saúde vivemos aumento na mortalidade infantil, de pacientes com câncer por falta de intervenção, e a volta de doenças erradicadas como sarampo e poliomielite, entre muitas outras.

Na Educação, o desmonte das políticas públicas voltadas para a inclusão de todos nas escolas tem aumentado a imensa desigualdade que ainda caracteriza a sociedade brasileira. De acordo com pesquisas recentes, o Brasil ocupa hoje os piores lugares nos rankings internacionais de educação – entre 140 países, ocupamos a 132º posição na qualidade da educação primária, ano base 2015. É papel do Estado manter a Educação básica e superior pública gratuita, de qualidade e com responsabilidade social.

Na inovação, o País caiu drasticamente, comprometendo o crescimento da economia e a competitividade nos setores produtivos (queda de 17 posições nos últimos 8 anos, ocupando a 64ª posição entre 126 países em 2018, de acordo com o Global Innovation Index);

2 – Interrupção do avançado processo de sucateamento de laboratórios, escolas, institutos de pesquisa, universidades, Institutos Federais de Ensino Superior (IFEs) e o não cerceamento da autonomia administrativa e da gestão financeira em função de normas de administração pública altamente burocratizadas. Adoção de políticas que impeçam a fuga de cérebros na área científica e tecnológica e a promoção de reajuste adequado das bolsas de ensino, pesquisa e extensão. Além disso, qualquer política de desenvolvimento em C&T deve vir acompanhada de uma análise profunda do contexto fiscal do País;

3 – Recriação do Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação, além da recomposição do orçamento da pasta ao maior nível atingido na última década;

4 – Observância aos direitos humanos, com especial atenção ao aumento da violência, exemplificado em um quadro de explosão de homicídios dolosos – mais de 60 mil em 2016, de acordo com o Anuário Brasileiro de Segurança Pública, aumento de 14% em 10 anos. Aumentou a letalidade da ação policial que recai desproporcionalmente sobre jovens negros de baixa renda, assim como aumentou a morte de policiais. É preciso interromper esta escalada que beira a guerra civil e buscar o fim da impunidade em todos os níveis.

5 – Garantia da liberdade de expressão, claramente explicitada no artigo 5 da Constituição Brasileira. Repúdio às posições do movimento intitulado “Escola Sem Partido”, que defende o ensinamento religioso em um Estado laico, que é garantido pela Constituição Brasileira de 1988, entre outros retrocessos. Somos contrários ao obscurantismo que cerceia a investigação científica com base em valores e crenças individuais. A pluralidade social, o respeito aos cidadãos e a defesa das minorias são o caminho para a paz social;

6 – No Plano Nacional de CT&I deve-se atingir em quatro anos a meta de investir 2% do Produto Interno Bruto (PIB) em P&D. De acordo com o Painel da União Europeia sobre Políticas em Pesquisa, Inovação e Ciência de 2015, o investimento em pesquisa pública tem um retorno de 3 a 8 vezes o valor aplicado, sendo que a maioria das inovações não poderia ter sido desenvolvida sem a contribuição da pesquisa pública. De acordo com o relatório sobre políticas fiscais para inovação e crescimento econômico do Fundo Monetário Internacional, o apoio público é fundamental para o desenvolvimento de tecnologias inovadoras: um aumento de 0,4% do PIB para pesquisa e desenvolvimento poderá levar a um crescimento adicional do PIB global de até 5% em 10 anos;

7 – Adotar medidas para que o Sistema de Comunicação no País não seja controlado por monopólios ou oligopólios, conforme prevê o art. 220 da Constituição Federal, assegurando a diversidade de conteúdos e linguagens;

8 – Realizar uma auditoria da dívida pública e a implantação de uma reforma tributária progressiva;

9 – Respeito às normas vigentes sobre o uso de agrotóxicos e as que protegem o meio ambiente e a demarcação de terras indígenas e quilombolas;

10 – Revisão das vendas irresponsáveis de patrimônio público, como dos ativos da Petrobras e da Embraer, que foi construído ao longo de décadas pela inteligência e pelo trabalho dos brasileiros, e que está sendo usado para pagar juros de dívida sem nenhuma discussão com a sociedade.

Assim, alertamos que está em curso um projeto acelerado de desconstrução do Brasil, que desrespeita o povo brasileiro e a soberania nacional. Os cortes e mudanças em áreas estratégicas para o País não foram discutidos com a sociedade, e estão sendo implementados por um governo que não tem a legitimidade do voto nem o apoio popular para fazê-los. As eleições de 2018, que devem ser livres e democráticas, desempenharão um papel crucial para a definição dos rumos do Brasil no século 21.