Crise na Unasul começou depois do golpe no Brasil, diz Ernesto Samper

O ex-presidente da Colômbia, Ernesto Samper disse, nesta quarta-feira (22), que a crise na União das Nações Sul-Americanas (Unasul) teve início após o processo de impeachment no Brasil, que retirou Dilma Rousseff da presidência em 2016. O ex-mandatário conversou com a imprensa em São Paulo.

Ernesto Samper - Lucas Estanislau

Samper, que ocupava o cargo de secretário geral da organização desde 2014 e pediu afastamento após o impedimento da ex-presidenta brasileira, chamou o processo de golpe e afirmou que sua saída se deveu à resistência que enfrentou dentro da Unasul ao denunciar o impeachment como “ruptura democrática”.

“A crise na Unasul começou depois do golpe no Brasil. Minha saída da organização está ligada a isso. Eu disse que havia uma ruptura democrática no processo, mas alguns membros insistiam que existia uma suposta legalidade”, disse.

O ex-presidente colombiano também afirmou que a integração das nações latino-americanas em torno da organização depende da vitória do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva nas próximas eleições presidenciais que acontecem em outubro.

“Se Lula ganhar as eleições no Brasil, a Unasul tem futuro. Não há outra pessoa que possa convocar um consenso neste momento senão Lula. Ele é muito poderoso, tanto na esquerda quanto na direita; é como um transatlântico”, afirmou.

O órgão, criado em 2008 por iniciativa dos ex-presidentes Lula, Hugo Chávez, da Venezuela, e Néstor Kirchner, da Argentina, está sem um comando definitivo desde o começo de 2017, após Venezuela, Bolívia, Suriname e Equador vetarem a indicação do diplomata argentino José Octavio Bordón para assumir o cargo na secretaria geral.

Em abril de 2018, as chancelarias de Brasil, Argentina, Paraguai, Colômbia, Chile e Peru enviaram uma carta à Presidência Pró-Tempore da Unasul comunicando a decisão de suspender por tempo indeterminado as participações das reuniões do bloco.

Três dias após tomar posse, o novo presidente da Colômbia, Iván Duque, anunciou que o país se retiraria da organização sob a alegação de que a Unasul seria “cúmplice da ditadura venezuelana”.

O chanceler colombiano, Carlos Holmes Trujillo, afirmou que o governo está negociando “com outros países que, aparentemente, querem seguir o mesmo caminho; se chegarmos a um consenso nessas consultas, faremos isso em conjunto”.

FARC e intervenção na Venezuela

Samper ainda disse acreditar que os acordos de paz assinados em 2016 entre o governo e o antigo grupo guerrilheiro FARC (hoje Forças Revolucionários Alternativas do Comum), “irão sobreviver” depois da chegada de Duque à presidência.

“Os acordos de Havana irão sobreviver ao governo de Iván Duque. Porém, a paz na Colômbia depende da continuação dos acordos com o ELN [Exército de Libertação Nacional]”, afirmou.
Segundo Samper, um dos fatores de desestabilização na região é a influência norte-americana, que se posiciona contra o governo de Nicolás Maduro na Venezuela. Ela estaria incitando um conflito entre Colômbia e a nação vizinha.

“Existem riscos reais de um conflito entre Colômbia e Venezuela e os EUA fortaleceriam conflitos fronteiriços entre os dois países”, disse o ex-presidente, que alertou sobre as consequências da não união dos países da América do Sul.

“Estamos falando de desintegração no momento em que a região está ameaçada por Trump. Seu muro não é apenas para o México, é para a América Latina”, afirmou.

Condenação de Lula

Para o ex-presidente colombiano, “não há uma prova que condene Lula” e todas as medidas tomadas pela imprensa e pelo judiciário do Brasil no caso do triplex do Guarujá são para impedir a candidatura do petista.

“Não apareceu a prova que seus inimigos procuravam, pois o eles estavam buscando não era uma sentença justa, mas um vitória política”, disse.

Samper ainda afirmou que a comunidade internacional está a favor do ex-presidente e que “se Lula não ganhar as eleições esse país irá retroceder 20 anos”.