Dilermando: Dalva, seus sonhos são imortais e serão realidade um dia

Acabei de perder uma grande amiga. A camarada Dalva Stela Rodrigues, de Belo Horizonte. Estou profundamente abalado e triste. Fomos militantes do movimento estudantil na capital mineira nos anos 1967/68. Ela fazia odontologia e eu economia.

Por Dilermando Toni*

Dalva Stela

Fazíamos parte da mesma organização revolucionária, a Ação Popular/AP. Participávamos ativamente das lutas de rua, sob as bandeiras da UNE e da UEE.

Dalva, sua irmã Dora – também militante à época – e mais seus irmãos homens vinham do Vale do Jequitinhonha, da cidade de Pedra Azul. Lá seu pai dedicava-se à pecuária, de onde conseguia os recursos necessários para realizar o sonho de ver os filhos tornarem-se doutores nas faculdades da capital. Coisa para muitos poucos naquele então.

Com o AI-5 tivemos que abandonar os estudos para continuar na resistência. Depois de quase um ano na Mata da Jaíba tive o prazer de reencontrá-la em SP, nos pontos de rua. Sempre disposta e confiante. Isso foi em 1970.

Logo depois fomos deslocados para a Bahia. Lá estivemos lado a lado no Comando Municipal de Salvador. Foi exatamente nesse período que passei a admirá-la mais profundamente. Acontece que o companheiro dela à época foi preso e Dalva conseguiu escapar. De imediato abandonou a casa, arranjou uma peruca loira e continuou a movimentar-se por Salvador, com cuidado mas sem medo.

Certo dia estávamos reunidos na Ribeira, ela, Emiliano José e eu. Um investigador de polícia a reconheceu quando estávamos tomando um ônibus. Ela já havia ultrapassado a catraca. Logo atrás estava eu e, Emiliano por último subindo as escadas. O investigador agarrou Emiliano, eu saltei do ônibus e entrei em luta com o investigador. Consegui livrá-lo momentaneamente. O ônibus partiu levando Dalva.

Com a prisão dos titulares assumimos provisoriamente o Comando Regional da Bahia, ela, eu e mais uns poucos companheiros. Corria 1971. Foi então que, em contatos sucessivos com a direção estadual do PCdoB da Bahia, nos colocamos sob a direção do Partido. Juntos desenvolvemos uma campanha exigindo liberdade para os presos, com pichações armadas onde felizmente não houve confrontos. E promovemos, sob as mais duras condições de clandestinidade, três atos rápidos contra a condenação à morte de Teodomiro. Me lembro que um foi na Barroquinha e outro no terminal de São Caetano.

E lá estava Dalva nas primeiras filas dos combates!!

Depois da Bahia ela foi para o Ceará, e anos mais tarde, já com anistia, voltou a BH. Tornou-se, juntamente com seu companheiro uma grande liderança na Zona Leste de BH. foi neste período que voltei a reencontrá-la. Ocupou com sabedoria, por sucessivas vezes, o cargo equivalente à vice-prefeitura da região.

Destacou-se também como dirigente municipal e estadual do Partido. Foi por duas vezes eleita para o Comitê Central do Partido. Quando eu integrava a Comissão Nacional de Organização do Partido e depois a Comissão Auxiliar da Presidência do Partido estive um sem número de vezes em BH e nessas ocasiões sempre mantínhamos conversas muito proveitosas. Isso era o que acontecia nesses últimos tempos, nas reuniões do CC.

Se dependesse dela as pessoas jamais saberiam das coisas que aconteceram durante sua juventude ou na clandestinidade. Mas os caminhos pelos quais passou forjaram-na como uma comunista brilhante.

Convidei-a insistentemente para vir comemorar a passagem dos meus 70 anos aqui em Santa Catarina. Mas os muitos afazeres impediram-na de vir. Pena.

Nesta hora curvo-me respeitosamente diante da militante abnegada, absolutamente decidida, firme e fiel, da amiga de mais de 50 anos, que foi Dalva Stela Rodrigues.

Seus sonhos são imortais e serão realidade um dia!

"Dalva presente!"