Mourão, o 13º salário e a aposentadoria dos militares

Pensões vitalícias às filhas, salários integrais na reserva sem contrapartidas… Nem os EUA, país que mais gasta com Defesa, são tão generosos.

Por Sergio Lirio

General Mourão

 Durante um evento com comerciantes em Uruguaiana, no Rio Grande do Sul, o general da reserva Hamilton Mourão, candidato a vice-presidente na chapa de Jair Bolsonaro, criticou a existência de duas “jabuticabas”: o 13º salário e o adicional de férias. “Como a gente arrecada 12 meses e pagamos 13? (sic) O Brasil é o único lugar onde a pessoa entra em férias e ganha mais. São coisas nossas, a legislação que está aí. A visão dita social com o chapéu dos outros e não do governo”.

Mourão não comete apenas um erro factual, pois benefícios além dos salários pagos aos trabalhadores proliferam no resto do mundo (as remunerações extras são comuns em boa parte dos países e algumas nações, como Alemanha e Portugal, adotam o 13º salário). Sem contar os efeitos sobre o PIB. No ano passado, o pagamento do 13º injetou cerca de 200 bilhões na economia. Como se sabe, a maior parte desse dinheiro vira consumo das famílias e faz girar a roda do comércio e dos serviços.

O militar incorre em uma omissão interessada. Alguém poderia, na mesma linha de raciocínio, lembrar ao general dos inúmeros penduricalhos nos proventos militares e certas extravagâncias exclusivas da carreira, a começar pelas pensões vitalícias a filhas de integrantes das Forças Armadas. A benesse suga cerca de 4 bilhões de reais por ano dos cofres públicos, uma prova da “visão dita social com o chapéu dos outros”.

Há mais. Segundo um estudo de 2015, a aposentadoria dos militares respondeu por 44,8% do déficit previdenciário do setor público daquele ano, o equivalente a 32,5 bilhões de reais. Soldados e oficiais não contribuem para a Previdência e recebem proventos integrais quando vão para a reserva. A contribuição de um militar para o rombo nas contas é 16 vezes maior do que o de um trabalhador comum.

Um outro levantamento indica que a aposentadoria dos militares brasileiros é mais generosa do que aquela de congêneres internacionais, inclusive das tropas dos Estados Unidos, país que mais gasta em Defesa no planeta. Lá, os reservistas recebem 60% do salário de quem está na ativa. O Reino Unido paga 43% e Portugal, 83%.

Como se sabe, por receio de quarteladas, presidentes civis no Brasil sempre excluíram as Forças Armadas das sucessivas propostas de reforma da Previdência. Michel Temer não foi diferente.

Os militares têm ainda direito a diversos adicionais e auxílios, de alimentação à compra de uniformes. O tempo de serviço, o desgaste físico, o aprimoramento na formação intelectual e as eventuais mudanças de endereço por causa das funções também engordam os soldos (e nada disso é dedutível dos proventos para fins de aposentadoria).

Como o “cidadão” Mourão classificaria essas distorções? Jabuticabas?