Frente de Evangélicos lança manifesto contra candidatura de Bolsonaro

 Em nota, movimento diz que as ideias defendidas pelo presidenciável negam “valores básicos do Evangelho” e ameaçam a democracia.

Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito

 A Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, movimento criado em 2016 em resistência ao golpe parlamentar instaurado no país, publicou nesta sexta-feira (28) um manifesto contrário ao discurso do candidato à Presidência da República, Jair Bolsonaro (PSL).

No documento, os cristãos se posicionam contra o armamento da população, uma das bandeiras do presidenciável. “Armar a população é estimular a barbárie, atribuindo ao cidadão a responsabilidade por sua defesa pessoal”. O manifesto também faz duras críticas contra a incitação à violência, racismo, sexismo e autoritarismo evidenciados nas declarações do candidato, além de lembrar que o apoio à prática da tortura é crime de lesa humanidade.

“O Evangelho de Jesus Cristo defende a vida de todas as pessoas, especialmente a vida dos mais fracos, física, social, econômica, educacional, racial e moralmente. Foi entre essas pessoas que Jesus andou, tendo sido, ele mesmo, uma delas. Por isso, e por todos os brasileiros, reconhecemos que a candidatura de Bolsonaro é alimentada pelo ódio, sendo o oposto à proposta do Evangelho”, assinala o documento.

Segundo Ariovaldo Ramos, que é um dos coordenadores nacional da Frente de Evangélicos, além de pastor da Comunidade Cristã Reformada, não é possível encontrar amparo, na cosmovisão cristã, para o apoio ao discurso do presidenciável Bolsonaro. “A pregação do candidato é uma pregação que retoma, no Brasil, máximas nazistas que são repudiadas por todo mundo moderno. O seu discurso representa uma cosmovisão que a humanidade rejeitou. Que é a cosmovisão nazista”, opina. E acrescenta: “Não é possível porque o candidato possui uma postura excludente, classificando as pessoas como do bem ou outras do mal”.

Ariovaldo explica que repudiar e denunciar o discurso não significa apoiar ou direcionar o voto a nenhuma outra candidatura e adverte que pastores não possuem a prerrogativa de determinar em quem os membros de suas igrejas devam votar. “Isso é uma apropriação indébita. Igreja não é partido político. Não tem candidato. A liderança não tem essa autoridade.”

Ele observa também que é falsa a narrativa de que a maioria dos evangélicos sejam favoráveis à eleição do presidenciável de extrema direita. “Os resultados (das pesquisas) denunciam o que sempre soubemos. Essas lideranças não falam pela maioria dos evangélicos. Falam por interesses próprios e não confessados. Não queremos julgar quais interesses são esses porque as Escrituras não nos autorizam a isso.”

A Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito reúne mais de 10 mil evangélicos de diferentes denominações, como Igreja Batista, Igreja Presbiteriana Independente e do Brasil, Assembleia de Deus, Igreja do Evangelho Quadrangular, entre outras, em todo o país e no exterior.

Segundo a jornalista Nilza Valéria, que também está na coordenação nacional da Frente de Evangélicos, haverá mobilização de mulheres no movimento #elenão nas principais cidades do país. “Temos o grupo de mulheres organizado no Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte, Recife e em outros locais que temos presença. Não apenas as mulheres, mas todos da Frente estarão apoiando os atos amanhã”. Em São Paulo o encontro será neste sábado(29), às 14h30, na Estação de Metrô Faria Lima, no Largo da Batata.

A jornalista lembrou da alta taxa de rejeição que Bolsonaro possui entre os evangélicos (41% dos evangélicos ouvidos na pesquisa Ibope do último dia 25 dizem que não votariam no candidato) e, em especial, entre as mulheres (54% de rejeição).

“As mulheres evangélicas estão rejeitando a candidatura do Bolsonaro. Não há aderência da candidatura dele dentro desse segmento, mesmo que alguns pastores e líderes peçam voto”, afirma Nilza Valéria. Para ela, esse é um motivo de esperança e celebração. Uma boa-nova, que também é um dos significados para a palavra evangelho.

Leia a íntegra do documento logo abaixo:

Nota da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito

Pode um crente votar em Bolsonaro?

Foi para a liberdade que Cristo nos libertou. Portanto, permaneçam firmes e não se deixem submeter novamente a um jugo de escravidão” (Gálatas 5.1)

Nós, da Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, compomos um movimento formado crentes em Cristo Jesus. Fazemos parte das mais variadas igrejas e denominações e além da fé, possuímos a certeza de que a democracia é um sistema que permite a garantia de direitos e a construção da cidadania plena.

Assim – diante de tantas cartas e posições de líderes religiosos que reconhecem a candidatura de Bolsonaro como messiânica – nos manifestamos contra as suas posições, levantando nossa voz em nome da justiça, como fizeram os profetas, os primeiros cristãos e milhares de crentes ao longo da história.

Levantamos nossa voz contra a violência, contra o machismo, contra o racismo, contra o preconceito, contra o sexismo, contra o autoritarismo e contra a exclusão manifestadas por Bolsonaro no exercício na vida política, e em seu excludente programa de governo, divulgado como solução para a realidade brasileira.

Afirmamos que armar a população não é política de segurança pública, pelo contrário, é declarar-se incompetente para desenvolver segurança eficaz para todos. Armar a população é emular a barbárie, atribuindo ao cidadão a responsabilidade por sua defesa pessoal. Também não é política de segurança pública premiar policiais que mais matarem "bandidos". Isso é rito sumário e incitação à violência e ao assassinato.

Desacatar mulheres, sugerindo a sua inferioridade em relação ao homem, não é uma política de justiça e respeito, é misoginia, é assédio moral, é crime. Aludir a possibilidade de estupro em relação a alguém não é descuido verbal, é violência inominável e crime inafiançável.

Apoiar a prática da tortura é crime de lesa humanidade, elogiar torturadores, não é política de segurança nacional, é crime. Dizer que negros quilombolas não servem nem para reproduzir, não é grosseria, muito menos política de igualdade racial: é racismo e crime inafiançável. Deplorar seres humanos porque se entendem de modo diferente não é defesa da família, é desamor ao próximo.

Sabemos que o Evangelho de Jesus Cristo defende a vida de todas as pessoas, especialmente a vida dos mais fracos, física, social, econômica, educacional, racial e moralmente. Foi entre essas pessoas que Jesus andou, tendo sido, ele mesmo, uma delas. Por isso, e por todos os brasileiros, reconhecemos que a candidatura de Bolsonaro é alimentada pelo ódio, sendo o oposto à proposta do Evangelho, daquele que sendo Deus se fez humano e habitou entre nós.

Assim, convidamos o povo evangélico a repudiar as posições esboçadas por essa candidatura que propaga o ódio ao próximo e nega valores básicos do Evangelho, além de ameaçar o restabelecimento da democracia no Brasil. Afinal, como lembra e exorta o apóstolo, foi para a liberdade que Cristo nos libertou. Portanto, permaneçamos firmes e não nos deixemos submeter novamente a um jugo de escravidão.

Deus abençoe o Brasil e nos dê sabedoria para votar com liberdade, jamais pelo medo ou ódio, mas somente movidos pelo amor e pela justiça.

28 de Setembro de 2018