Bolsonaro diz que não controla apoiadores, mas quer governar o Brasil

O candidato de extrema-direita Jair Bolsonaro (PSL) comentou nesta terça-feira (9) a morte do artista e mestre de capoeira Romualdo Rosário da Costa, o Moa do Katendê, em Salvador. Ao ser questionado sobre os atos de violência cometidos usando seu nome, ele disse que os episódios são “casos isolados” que ele “não tem como controlar”.

Por Dayane Santos

Jair Bolsonaro - Reprodução

Morto com 12 facadas por um homem depois de uma briga por conta de Bolsonaro, o capoeirista foi sepultado nesta terça sob gritos de “Ele não!”.

Perguntado por um jornalista do UOL como avalia os atos de violência que têm sido cometidos em seu nome, Bolsonaro disse que a pergunta deveria ser invertida. “Quem levou a facada fui eu, pô. O cara lá que tem uma camisa minha e comete um excesso, o que é que eu tenho a ver com isso?", questiona. “Eu lamento. Peço ao pessoal que não pratique isso, mas eu não tenho controle sobre milhões e milhões de pessoas que me apoiam”, se esquivou.

Para o professor de Direito Constitucional da PUC, o jurista Pedro Serrano, a declaração de Bolsonaro é a face do fascismo.

“O fascismo é assim. A sociedade se torna fascista, não apenas o Estado. A auto-repressão civilizatória se fragiliza e o ódio animalesco domina. O mal extremo não é produto de monstros, mas de homens comuns, banais, tomados por uma onda afetiva, ou com justificativas profissionais, técnicas ou científicas”, postou o jurista em sua página nas redes sociais.

Para o também jurista Leonardo Isaac Yarochewsky, professor, advogado e doutor em Ciências Penais, o discurso e a recorrente ação gestual de Bolsonaro fazendo o sinal de arma de fogo são os combustíveis desse ambiente e sua postura está longe de um estadista que pretende governar a nação.

“Bolsonaro é o grande responsável por ataques fascistas já que o símbolo principal de sua campanha é a imitação gestual de arma de fogo. É evidente que a fala e o gestual acabam por influenciar seus seguidores que veem no preconceito, na intolerância e na discriminação motivo para a prática de violência”, salientou Leonardo.

Para o professor, Bolsonaro demonstra não ter respeito pelas instituições democráticas. “Qualquer lei pode ser objeto de crítica ou reformas dentro do processo democrático”, advertiu ele, ao comentar outra declaração de Bolsonaro que circula nas redes em que ele defende que o Estatuto da Criança e do Adolescente “seja rasgado e jogado na latrina”. Ele também voltou a defender redução da maioridade penal. De acordo com o professor, essa medida “só vai aumentar o encarceramento dos pobres, negros, dos mais vulneráveis da população e é bom lembrar que o Brasil tem a terceira maior população carcerária do planeta, sendo a que mais cresceu os últimos anos”.

“Bolsonaro não conhece política sociais e nem sabe o que são políticas sociais”, completou o professor, que acredita que o país vive uma sanha punitivista contra a impunidade insuflado pela grande mídia que causa efeito de medo e de insegurança na sociedade.

Isso explica a lógica adotada por Bolsonaro que disse na entrevista que a intolerância vem do outro lado da disputa, e não do seu discurso. “Eu sou a prova, graças a Deus, viva disso daí”, disse ele, voltando a falar sobre o ataque que sofreu, este sim, um ato isolado de um desequilibrado, conforme apontam as investigações.

Como a campanha de Bolsonaro é feita de fakes, ele mantém o discurso de vítima, se esquivando de assumir sua responsabilidade no ambiente de intolerância que predomina no país, motivando atos recorrentes de agressões contra quem pensa diferente dele ou mesmo que ache que pense diferente.

Recentemente, durante ato de campanha no Acre antes do ataque a faca, Bolsonaro discursou dizendo que iria “fuzilar a petralhada”.

“Vamos fuzilar a petralhada aqui do Acre, hein? Vamos botar esses picaretas para correr do Acre. Já que eles gostam tanto da Venezuela, essa turma tem de ir pra lá. Só que lá não tem nem mortadela, hein, galera. Vão ter de comer é capim mesmo”, disse enquanto levantava o tripé de uma câmera imitando estar atirando.

No domingo (7), dia da eleição, uma jornalista de Recife foi agredida e ameaçada de estupro por dois homens depois de votar. Um deles estava com a camisa de Bolsonaro. Ela afirmou que os dois a agrediram quando identificaram pelo crachá que ela era jornalista.

Também no domingo de eleição, o jornalista Guilherme Daldin contou que vestia uma camiseta com a imagem do ex-presidente Lula e estava acompanhado de amigos nas proximidades da Rua Trajano Reis, no centro de Curitiba, quando foi atropelado por um carro, enquanto estava parado ao lado de um bicicletário.

“Eu conversava com os amigos e o carro foi jogado contra mim, o pneu passou por cima dos meus pés. O carro saiu em disparado e quando amigos conseguiram chegar perto do motorista ele ameaçou atirar dizendo que portava uma arma”, contou o jornalista, destacando que a placa do carro foi identificada e através dela foi possível encontrar o perfil do Facebook do motorista que revela em suas postagens ódio e pedido de morte a quem apoia o PT.

O capoeirista Moa do Katendê foi morto pelo barbeiro Paulo Sérgio Ferreira de Santana na madrugada de segunda. Os dois estavam no bar Pequeno, no Engenho Velho de Brotas, quando o capoeirista discordou da defesa de Bolsonaro que Paulo Sérgio fazia.

De acordo com a delegada, o barbeiro argumentava com o dono do estabelecimento que era preciso haver mudanças no Brasil, quando o capoeirista interrompeu a conversa se mostrando contrário às suas ideias.

“O que se sabe é que o crime tem relação política. A vítima teria se intrometido e, após uma rápida confusão, Paulo Sérgio foi em casa e retornou golpeando o capoeirista. Ele disse, em depoimento, que apoiava o candidato de direita”, conta Milena Calmon, que investiga o caso.

Para Bolsonaro, o clima do país não está “tão bélico assim”. “Está um clima acirrado, pela disputa, mas são casos isolados que a gente lamenta e espera que não ocorram”, disse.