Haddad desmonta fake news, apesar da parcialidade do programa 'Pânico'

Fernando Haddad, candidato da frente democrática à presidência da República, participou do programa Pânico, da rádio Jovem Pan, em São Paulo, nesta terça-feira (16). A entrevista abordou quase todos os fake news disseminados pela campanha de seu adversário, Jair Bolsonaro (PSL), como o suposto kit gay, a tese de que Haddad quer libertar bandidos da cadeia, a mudança das cores da campanha de vermelho para verde-amarelo como suposta ação para esconder o vermelho, entre outros.

Por Dayane Santos

Haddad no programa Pânico - Reprodução

Mas apesar de esclarecedora, a entrevista de Haddad também escancarou como a grande mídia atua para manter e repetir as mentiras no processo eleitoral e, assim, impedir a vitória do campo democrático.

Seguindo a estratégia da campanha de Bolsonaro, que adota o lema de Joseph Goebbels, ministro da Propaganda de Adolf Hitler, que dizia: “Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade, o apresentador Emílio Surita e outros participantes do programa insistiam em usar chavões e motes de Bolsonaro ao se referir a temas que já haviam sido esclarecidos por Haddad.

A entrevista iniciou abordando o que eles chamam de “antipetismo” que seria predominante na sociedade, apesar do partido ter ido para o segundo turno das eleições justamente por conta da votação que recebeu.

“Sempre existiu. Não é uma coisa nova”, respondeu Haddad, lembrando que a legenda sempre enfrentou o ataque de setores que se incomodam com a política e bandeiras defendidas pelo partido.

Em seguida ele foi questionado se os casos de corrupção não colaboraram para a suposta rejeição. “Claro. Esse tipo de coisa é um atraso de vida, sobretudo para quem está num partido trabalhista. Tem que ter o triplo de atenção nessas coisas”, disse o candidato, citando os avanços obtidos no combate à corrupção durante os governos Lula e Dilma com a atuação da controladoria acompanhando e fiscalizando as contas de todos os ministérios

“A controladoria funcionou muito bem nos ministérios. Isso não aconteceu com a mesma eficiência nas estatais. A minha proposta de governo é levar para as estatais o mesmo tipo de controle que funcionou bem nos ministérios”, afirmou.

Ao ser questionado sobre a proposta de Bolsonaro sobre educação, Haddad não poupou críticas. “É uma proposta esdrúxula de quem provavelmente não conhece nada de educação. Ele falou que não conhece nada de economia, mas de educação ele conhece menos ainda”, disse o candidato ao comentar sobre a proposta de ensino à distância do direitista.

“Eu tenho uma discordância muito grande com a proposta que Bolsonaro tem para a educação. Educação à distância, como ele está propondo, é uma coisa que vai dar muito errado. A criança de 11 anos precisa estar na escola convivendo com os colegas, com o professor, de preferência dois professores atuando para que essa criança esteja aprendendo. Ela precisa de um ensino presencial. Em casa, na frente de um computador, ela vai ficar sozinha na maioria dos casos porque os pais trabalham e não vão ter dinheiro para pagar uma cuidadora. E sem o professor ela não vai aprender pelo computador”, rechaçou.

Diante da contundente resposta de Haddad, o apresentar Emílio Surita resolveu falar sobre o factoide do “kit gay”, que por determinação do Tribunal Superior Eleitoral obrigou Bolsonaro a retirar vídeo que fez para as redes sociais em que propagava a fake news sobre o “kit”. Surita contou que quando Bolsonaro esteve no programa levou o tal livro que ele dizia que seria distribuído pelo PT nas escolas infantil. O apresentador ainda evocou a “família” como guardiã da educação e não o professor.

Haddad rebateu reafirmando que nunca existiu o tal kit e que a justiça confirmou que isso era uma mentira ao determinar a retirada do vídeo e proibir a menção de tal tema. Disse ainda que a tese de que educação sexual não deve ser tratada na escola reforçando que se trata de saúde pública e que a informação é o principal instrumento para formação e proteção de criança e jovens.

“No ensino médio, o jovem precisa ser informado sobre determinadas coisas. Sabe por que tem muito aborto no Brasil? Porque tem muita gravidez na adolescência. Como as pessoas querem reduzir o número de abortos no Brasil se a gente não educar as meninas e os meninos sobre valores, procedimentos, sobre como evitar gravidez na adolescência e como evitar doenças sexualmente transmissíveis? Isso é ciência. A Aids cresceu mais entre jovens de 16 e 24 anos”, advertiu Haddad.

Repete a mentira

Apesar de Haddad ter demonstrado que a tese do kit era uma farsa, Emílio Surita ignorou o fato e voltou a se referir ao tema. “Eu acho que na educação dos filhos, o pai e a mãe, a família… ela quer ela cuidar daquilo. Ela não quer que isso seja tutelado pelo estado”, disse o apresentador.

“Lógico, ninguém discorda disso”, respondeu Haddad. “O que eu entendi no kit gay é que o estado vai tutelar”, voltou a dizer o apresentador. “Não existe esse lance, Emílio”, rebateu Haddad.

Surita ainda saiu em defesa de Bolsonaro durante o programa, ao desmentir Haddad que acusou o candidato de ter dito por vezes, inclusive no Pânico, que ele era o responsável pelo suposto “kit”. “Ele nunca disse que foi você”, afirmou Surita, que poucos minutos antes de encerrar o primeiro bloco da entrevista foi desmentido por uma produtora do programa, chamada Paulinha, que foi ao microfone e disse: “Bolsonaro disse que Haddad criou o kit gay com todas as letras”.

Surita desconversou e chamou o intervalo, mas ao reiniciar o programa voltou a falar sobre o kit e Haddad não perdoou. “Você vai parar de falar sobre o que não existe, né?!”.

Proposta de Bolsonaro para o Supremo

Haddad foi indagado a falar sobre a proposta de Bolsonaro de alterar a Constituição para nomear mais 12 ministros do Supremo Tribunal Federal, além dos 11 já existentes. “Isso é uma loucura. Já imaginou alguém nomear 12 ministros de 23? Ele vai ter maioria para governar do jeito que ele quiser”, repeliu o presidenciável.

“A Constituição tem um guardião que é o Supremo Tribunal Federal. Ninguém pode fazer bancada no Supremo. Ele [Bolsonaro] quer ter 12 ministros indicados por ele, contra os 11 que estão lá. Ai quem vai dizer o que é ou não constitucional é a bancada dele. Não tem nada mais totalitário. Eu nunca vi isso em nenhuma ditadura. Nem na ditadura militar que ele tanto elogia fez uma maluquice dessa”, completou.

Emilio volta a cutucar e diz: “Mas você também quer mexer na Constituição.” Haddad não titubeia e questiona o apresentador: “Como vou reduzir o imposto de renda para quem ganha até 5 salários mínimos sem mexer na Constituição? Como vou colocar imposto sobre grandes fortunas?”

“Tá vendo aí, oh… vai meter imposto”, disse o apresentador voltando a interromper a resposta de Haddad. “Mas você tem grandes fortunas?”, perguntou Haddad, levando os demais membros do programa à gargalhada. “Meu dinheiro está tudo com a Odebrecht”, cutucou novamente, mas em seguida mudou de assunto.

Cores da campanha

Em seguida, Haddad foi questionada sobre a mudança das cores do vermelho para o verde amarelo a sua campanha neste segundo turno. “É vergonha do PT?”, questionou um dos integrantes da bancada.

“Todas as vezes que fomos para o segundo turno, pode apurar, a gente mudou a bandeira da campanha. Não é a primeira vez que isso acontece. E todas às vezes a gente foi questionado por isso. É a quinta vez que nós fazemos isso. E por que a gente faz isso? Porque no segundo turno não é mais o projeto de um partido. Tem que anunciar uma ampliação para dizer que tem um campo que tem tais valores e esse campo convida as forças que participaram do primeiro turno para prosseguir, que é o que eu estou fazendo durante esses dez dias para defender um apoio mais amplo”, pontuou.

Rapidamente outro integrante da bancada resolveu abordar as alianças e citou o apoio do PT ao governo de Alagoas. “Vocês chamaram o PMDB de golpista e pegaram apoio do Renan Calheiros…”, disse.

“Não, nós demos apoio ao Renan Filho que foi eleito com 80% dos votos. O PT apoio publicamente a reeleição de Renan Filho que foi eleito com quase 80% dos votos. Efetivamente está fazendo um bom governo e eu fui lá fiz uma carreata com Renan Filho, o pai estava lá. Qual é o problema? Eu não fico me escondendo e não escondo apoio não”, respondeu Haddad.

Despreparo de Bolsonaro

Seguro e firme em suas respostas, Haddad foi criando embaraços para os integrantes do programa, que decidiram falar sobre o que chamam de “discurso da esquerda” como causa do ambiente de polarização e violência.

Haddad enfatizou que “Bolsonaro dá um mau exemplo”, mas não pode ser responsável por todos os atos de seus seguidores. No entanto, como aspirante ao cargo de presidente ele demonstra que não está preparado para o cargo, nem tão pouco para enfrentar os desafios que o Brasil precisa atualmente.

“Uma pessoa que fala que o problema da ditadura foi que ‘torturou e não matou’ ou que ‘o correto seria ter matado 30 mil pessoas’ no Brasil. Estou falando de frases que ele pronunciou. Aí ele diz no programa: ‘todo mundo sabe que sou a favor da tortura’. Frase dele. ‘Todo mundo sabe que eu sou homofóbico’. São frases que, na minha opinião, estimulam as pessoas a cometerem algumas ações que não são desejáveis”, explicou Haddad.

Surita então volta a defender Bolsonaro. “É, mais é uma frase que o cara falou non Super Pop”. Haddad rebate: “Faz 18 anos que eu dou entrevistas. Tem que ter postura. Para pensar nos estadistas do mundo. Você acha que o Macron ou Obama alguma vez na vida falariam uma coisa dessa? O Brasil é muito importante, aqui não é uma republiqueta”

Inquieto na cadeira, o apresentador muda a estratégia e parte para o ataque: “O Lula, ele não tinha o primário também e foi presidente da República!”.

“Eu não estou questionando se ele estudou mais ou menos do que eu. Meu país não estudou”, disse Haddad, sendo novamente interrompido por Emílio Surita de forma irônica: “Nasceu na lojinha”, se referindo à origem árabe do pai de Haddad.

“Desculpe, meu pai foi agricultor familiar até os seus 24 anos de idade. Dos 8 aos 24 arava terra. Veio para o Brasil e foi para uma cidade de 5 mil habitantes chamada Uchoa, passou cinco anos lá com uma portinha de armarinho para fazer o primeiro dinheirinho dele. Isso foi dos 24 aos 29 anos. Chegou em São Paulo aos 30 anos de idade… Longe de mim falar da formação das pessoas. Estou falando de educação. Um presidente da República, alguém que aspira esse cargo, não pode… As pessoas sofrem. O negro sofre, a mulher sofre, o trabalhador sofre. Não se pode emitir esse tipo de juízo”, condenou.

E continuou: “Acho que o estadista, alguém que pretende chefiar o estado brasileiro, que está entre as dez economias do mundo, precisa ter postura… Estou numa disputa presidencial e tenho que apontar o que eu vejo de problema para o meu país. E acho que o Bolsonaro não tem estatura para ser presidente”.

Haddad lembrou que a disputa presidencial contava com 15 candidatos. “Se tivesse disputando a eleição com Ciro Gomes não estaria dizendo isso. Se tivesse disputando a eleição com Geraldo Alckmin não estaria dizendo isso”, afirmou o presidenciável, apontando que apesar das diferenças políticas, as características dos seus adversários eram democráticas.

Ao ser questionado sobre a postura do mercado financeiro, que tem demonstrado empolgação com a candidatura de Bolsonaro, Haddad foi categórico: “O mercado vê tudo no curto prazo. O mercado está de olho nas privatizações, pois quer comprar as estatais a preço de banana”.