Direita volta a tentar criar 'novo centro' para ser oposição moderada a Bolsonaro

Seguindo a tradição tucana de discutir e definir os rumos do partido em um restaurante, o governador eleito de São Paulo, João Doria, almoçou nessa quinta-feira (8) com Geraldo Alckmin e numa conversa de duas horas sinalizou que o período de distanciamento entre os dois encerrou com uma espécie e armistício.

Por Dayane Santos

Diplomação Alckimin - Agência Brasil

A eleição do candidato da extrema direita, Jair Bolsonaro (PSL), obriga a direita a se reorganizar nacionalmente. Doria, que já se movimentava para ter o controle do PSDB paulista, apoiou Bolsonaro desde o primeiro turno e se cacifou para ser o principal interlocutor da legenda com o presidente eleito. Esta semana, ele se encontrou com Bolsonaro para reforçar a aliança.

E foi com nessa toada que Doria se encontrou com Alckmin. De acordo com a grande mídia, Doria deu mais um passo para assumir o controle do PSDB nacional e alinhar o partido à base de apoio de Bolsonaro.

Alckmin teria dito que vai deixar a presidência da legenda até maio, quando a legenda realiza a sua convenção. O prazo é o tempo necessário para estabelecer efetivamente qual é a força do governo Bolsonaro pós-eleição, já que por enquanto é só lua-de-mel com os aliados e a imprensa.

Doria já teria um substituto: Bruno Araúijo. "Doria é quem vai indicar o próximo presidente do PSDB", disse o empresário e prefeito de São Bernardo do Campo, Orlando Morando, um dos correligionários mais próximos de Doria.

Após o almoço com Alckmin, Doria se reuniu com Michel Temer, em seu escritório em São Paulo, supostamente para trata da Reforma da Previdência. Em seguida, Doria recebeu em seu escritório o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), dizendo que a pauta também era a reforma da previdência.

O entra e sai de reuniões reforça que as articulações políticas seguem em ritmo acelerado para tentar realocar o seu campo na nova correlação de força. Ao tentar desenhar o papel do PSDB no novo governo, Doria disse após o encontro com Bolsonaro que o partido não vai fechar questão formalmente de apoio à nova administração. "Não é preciso frechar questão. Isso é passado. Fechamos questão em apoiar o Brasil", afirmou ele, na linha de reinventar o vocabulário político.

Na prática, o PSDB vive uma profunda cisão. No almoço, Alckmin disse ao governador eleito que pretende dar aulas, palestras e voltar à medicina após deixar a presidência do partido. Mas há uma forte movimentação de líderes da legenda na busca de criar uma nova "correlação e forças" na sigla ou fora dela, reunindo os que se opõe, ainda que de forma moderada, ao alinhamento com o governo Bolsonaro.

Segundo reportagem do Valor Econômico, a história de Alckmin de que vai se dedicar a dar aulas e a medicina é conversa para boi dormir. Alckmin e o senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) já iniciaram as conversas com o atual governador de São Paulo, Márcio França (PSB) – que disputou o segundo turno com Doria e perdeu por muito pouco – e o presidente da Fiesp, Paulo Skaf (MDB), que também disputou o primeiro turno das eleições para o governo de São Paulo, além do apresentador Luciano Huck, o governador do Espírito Santo, Paulo Hartung e o ex-deputado Aldo Rebelo (Solidariedade).

De acordo com o jornal, Alckmin e Tasso jantaram na terça-feira na casa do senador, em Brasília, "e chegaram à conclusão de que ficará insustentável a permanência no PSDB, caso João Doria tenha êxito na tentativa de assumir o comando do partido e aproximá-lo de Bolsonaro".

O próprio Fernando Henrique Cardoso disse em artigo que a movimentação em curso é o "centro radical". "A consolidação de um novo movimento requer desde já a pavimentação de alianças, não só no círculo político, mas principalmente na sociedade, para formar um polo aglutinador da construção de um futuro melhor", afirmou FHC.

Desde a pré-campanha, a direita tenta se reposicionar com uma fachada de "centro". Enquanto a extrema direita crescia com Bolsonaro despontando nas pesquisas e Lula liderava, esse campo tentava se colocar como o "centro" em supostos extremos que ele intitulavam como de direito e esquerda.

O chamado centrão, que reunia DEM, PP, PR, Solidariedade e PRB declarou apoio a Alckmin nas eleições, mas o grupo não durou e parte dele se alinhou a Bolsonaro no decorrer da campanha, principalmente pela promessa de ver atendidas demandas de grupos como os ruralistas.

O discurso da antipolítica, que prevaleceu desde o golpe de 2016, se revelou avassalador. Como disse o governador do Maranhão, Flávio Dino, o gênio do fascismo foi retirado da lâmpada e não sabem como devolvê-lo. A movimentação dessas lideranças demonstra que estão buscando uma alternativa.