Fascista que ameaçava feministas de morte pega 41 anos de prisão

Condenado a 41 anos de prisão por crimes como racismo, terrorismo e divulgação de pedofilia na internet, o militante fascista Marcelo Valle Silveira Mello, preso desde maio de 2018, na deflagração da Operação Bravata, não poderá recorrer em liberdade, conforme a decisão desta quarta-feira (19).

Fascista Marcelo Mello - DivulgaçãoTV Globo

Um homem que coordenava grupos neonazistas em fóruns da internet foi condenado a 41 anos, seis meses e 20 dias de prisão por associação criminosa, divulgação de imagens de pedofilia, racismo, coação, incitação ao cometimento de crimes e terrorismo cometidos na rede mundial de computadores.

A decisão, desta quarta-feira (19), é do juiz federal Marcos Josegrei da Silva, da 14ª Vara da Justiça Federal de Curitiba.

Marcelo Valle Silveira Mello, preso desde maio de 2018, na deflagração da Operação Bravata, não poderá recorrer em liberdade, conforme a decisão. 

Ele também foi condenado à reparação de danos de R$ 1 milhão e ao pagamento de 678 dias-multa (no valor de um décimo do salário mínimo vigente em dezembro de 2016).

O valor da reparação de danos, segundo o despacho, será destinado a programas de combate aos crimes cibernéticos e programas educativos da área.

"Inequívoca, portanto, a sua periculosidade, sendo o acusado verdadeira ameaça à ordem social, se solto, não só na condição de autor de delitos como divulgação de imagens de pedofilia, racismo e líder de associação criminosa virtual, mas também como grande incentivador de cometimento de crimes ainda mais graves por parte de terceiros, como homicídios, feminicídios e terrorismo", afirmou o juiz.

Na sentença, ele também disse que Mello tinha por hábito denunciar às autoridades postagens anônimas que ele mesmo produzia, na tentativa de se manter acima de qualquer suspeita.

Ao fixar a reparação de danos, o juiz afirmou que, mesmo já tendo sido condenado uma vez, "o réu não só voltou a praticar delitos da mesma natureza (racismo e divulgação de imagens de pedofilia) como outros até piores do que aqueles objeto da condenação anterior, demonstrando que a pena corporal não é suficiente."

Crimes em série

Reportagem da revista eletrônica Vice relata que a presença de Marcelo nas redes sociais brasileira já era bastante conhecida por conta da sua atuação massiva voltada para disseminar discursos de ódio, além de perseguir feministas e fazer o máximo de comentários racistas e misóginos em qualquer lugar da internet. Marcelo foi a primeira pessoa a responder pelo crime de racismo na internet, isso em 2009, quando foi condenado a 1 anos e 2 meses de prisão por causa de seus comentários racistas de 2005 no finado Orkut sobre pessoas atendidas pelo programa de cotas na USP. Ao recorrer da decisão, a defesa de Marcelo entrou com um incidente de insanidade mental o que lhe rendeu uma absolvição pelo crime.

Em 2012, Marcelo foi novamente investigado pelo Polícia Federal na Operação Intolerância. Na época, Valle e seu comparsa Emerson Eduardo Rodrigues Setim mantinham um site chamado “Silvio Koerich”, que alimentavam com postagens odiosas contra negros, judeus, mulheres, homossexuais e nordestinos, além de abertamente apoiarem o Massacre do Realengo em 2011, no qual Welligton Menezes de Oliveira matou 12 crianças. Além disso, havia fortes indícios de que Valle e Setim estavam planejando um ataque contra alunos de curso de Ciências Sociais da Universidade de Brasília (UnB). Marcelo e Emerson foram condenados a 6 anos e 6 meses de prisão, mas foram colocados em liberdade em 2013 por um indulto judicial.

Durante as investigações da Operação Intolerância, foi descoberto que Emerson e Marcelo também teriam orientado Welligton a praticar algum ato em nome da seita de misoginia que faziam parte, os Homini Sanctus, que defendiam a prática de abuso sexual contra menores de idade.

Mesmo com antecedentes e uma vasta notoriedade em espalhar conteúdo preconceituoso, Marcelo escapou de duas condenações e continuou atuando como troll nas redes sociais e perseguindo pessoas. Em 2013, criou o site Dogolachan, um fórum onde Marcelo e seus seguidores postavam sem melindres apologia ao estupro de mulheres, abusos de crianças e ameaças constantes contra feministas. Como forma de prejudicar as pessoas que denunciaram a atuação, Marcelo assinava os posts de ódio usando os nomes dos denunciantes. Foi o caso de Silvio Koerich e Robson Otto Aguiar, nomes de desafetos usados em domínios e posts feitos por Valle.

Professora registra "alívio" com condenação

A professora universitária Dolores Aronovich, conhecida como Lola e considerada uma das feministas mais atuantes do Brasil, era uma das vítimas frequentes das ameaças do grupo liderado por Marcelo. Lola mantém o blog Lola, Escreva Lola, onde aborda pautas feministas e relata casos de perseguição e violência contra ela e outras mulheres.

Durante sete anos, Lola sofreu ameaças de morte de Marcelo e de outros homens da mesma quadrilha do troll. Foram inúmeros boletins de ocorrências registrados, milhares de prints contendo agressões e ameaças contra seu marido armazenados por Lola e apresentados perante a polícia.

A maior ação contra a professora e feminista foi em 2015, quando Marcelo criou um domínio com o nome de Aronovich contendo postagens escritas como se fosse a professora defendendo absurdos desde o infanticídio de bebês do sexo masculino, queimas de Bíblias e denúncias de que Lola fez um aborto em uma de suas alunas numa sala de aula da UFC. "Marcelo fez com a intenção assumida que eu fosse reconhecida e linchada na rua", conta ela.

Previsivelmente, Lola nunca foi agredida ou ameaçada por Marcelo e pela sua quadrilha ao vivo. Porém, os ataques contra a sua figura nunca cessaram. "Você vê a covardia do pessoal. Já recebi ameaças de atentados em palestras que eu sou convidada. Porém, dei centenas de palestras e nunca ninguém veio me confrontar, mesmo quando teve discordâncias. Eu sempre fui recebida com carinho."

As perseguições e ameaças contra Lola em 2015, no entanto, renderam uma vitória. A lei 13.642/2018, conhecida como "Lei Lola", da autoria da deputada federal Luizianne Lins (PT-CE) foi sancionada pelo presidente Michel Temer em 3 de abril, autorizando a PF a investigar casos de misoginia na internet.

Nesta quinta-feira (20), ao saber da condenação definitiva de Marcelo, Lola comemorou a decisão da Justiça em seu perfil no Twitter: