Jorge Gregory: Errar uma vez é humano, duas é burrice

As opiniões sobre os posicionamentos das forças políticas em torno da disputa pela presidência da Câmara dos Deputados são didáticas para o entendimento da total falta de compreensão, por alguns segmentos, da situação política pela qual passamos.

Por Jorge Gregory*

Câmara dos Deputados - Foto: Agência Câmara

No processo eleitoral fez-se uma aposta de que levar a disputa para um segundo turno contra Jair Bolsonaro seria uma fatura praticamente liquidada. Afinal, a candidatura caricata do direitista não passava de um amontoado de ideias desconexas que, embora tivesse uma parcela do eleitorado fiel ao seu reacionarismo fascista e tacanho, não encontraria eco na maioria da população e assustaria até mesmo a classe média e parcela da elite pelo desastre que poderia ser um eventual governo seu.

Pois bem, o resultado eleitoral mostrou que tal prognóstico não se sustentava na realidade objetiva. Exceto no Nordeste, a vitória da direita foi massacrante.

Parcela dos que fizeram tal aposta tentam compreender não só as razões como também a profundidade da derrota. Outros segmentos, na incapacidade de fazer autocrítica e de compreender a realidade, se apegam à justificativa reducionista de que foram derrotados pelas fake news. Neste raciocínio simplista, imaginam que o governo eleito, em decorrência das concepções e manifestações absurdas do mandatário maior, será um desastre total. Acreditam que tal desastre conduzirá, quase que num processo natural, à recondução da esquerda ao poder e que, portanto, o fundamental na disputa pelo comando da Câmara é marcar posição. De preferência, até mesmo, jogá-la no colo do fascista para que ajude a aprofundar o programa do atual governo, que cavará a própria cova.

Ainda que a avalanche das fake news tenha tido um papel importante no resultado eleitoral, o que estes setores da esquerda não compreenderam é que ainda que Bolsonaro não fosse o candidato dos sonhos de vastos setores das elites brasileiras, na hora da verdade foi o candidato que se mostrou viável para derrotar a esquerda. Da mesma forma que talvez não seja o governo de seus sonhos, para estas elites, é o instrumento viável para a construção de um estado autoritário e antidemocrático que inviabilize totalmente a possibilidade de que qualquer ideia minimamente progressista possa ter acolhimento em sua estrutura.

O que se percebe, nestes poucos dias que se seguiram à posse, é que não só as elites representadas pelos setores financeiros, industriais, comerciais e agropecuários se unificam no apoio ao novo governo, mas se unem também inúmeras castas, a exemplo dos militares e membros do Judiciário.

Neste contexto, o que está em jogo é o Estado democrático, cuja última trincheira institucional em sua defesa neste momento parece estar no Legislativo. Continuar cometendo o mesmo erro da eleição poderá significar a perpetuação das elites no poder e consequentemente de suas reformas.

Agir unicamente para marcar posição é miopia. Estabelecer acordos que garantam a manutenção do pacto institucional, assegurando o respeito ao funcionamento democrático da casa legislativa, é, seguramente, uma questão estratégica.