Motim na Guarda Nacional bolivariana: preparando a intervenção?

O recente assalto a um quartel de Caracas foi uma tentativa de criar a atmosfera de enfrentamento interno no país, e também buscar o apoio militar para um golpe incitado pelos setores radicais da oposição ao governo de Nicolás Maduro, e que também conta com o respaldo de Washington, Bogotá e do chamado Grupo de Lima.

por Victoria Korn

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A Força Armada Nacional Bolivariana (FANB) publicou nesta segunda-feira (21/1) um informe sobre a detenção de um grupo de agentes públicos que se identificaram como integrantes do Comando de Zona nº 43 da Guarda Nacional Bolivariana (GNB). Foram presos após assaltar um edifício do Departamento de Segurança Urbana, na localidade de Petare (arredores de Caracas), onde roubaram armamentos.

O assalto, ocorrido na madrugada, foi uma tentativa de criar a atmosfera de enfrentamento interno no país, e também buscar o apoio militar para um golpe incitado pelos setores radicais da oposição ao governo de Nicolás Maduro, e que também conta com o respaldo de Washington, Bogotá e do chamado Grupo de Lima. A desestabilização e o terror nas ruas impulsado pela oposição em 2014 e 2017 deixou um saldo de mais de 200 mortos, não alcançou nenhum dos seus objetivos, mas ao menos serviu para bombardear os diálogos que se realizavam com o governo.

Curiosamente (ou talvez logicamente), a agência britânico-estadunidense Reuters reportou que o sargento Valdrén Figueroa lançou um manifesto no qual diz que a Guarda Nacional se opõe ao “regime (de Maduro), o qual desconhecemos completamente”, e pediu o apoio dos demais membros da corporação, além de incitar “que o povo vá às ruas”. Durante as duas horas em que durou o ataque, ele enviou fotografias de destroços nas proximidades do quartel.

O grupo autor da fugaz ação gravou vídeos que circularam nas redes sociais e pediram o respaldo da população. Em um deles, o sargento Figueroa enviou uma mensagem (não se sabe se direcionada à oposição), que dizia: “vocês queriam que acendêssemos uma faísca, e aqui estamos, com vocês, na luta pela Venezuela”.

O motim de Figueroa provocou apenas uma tímida resposta. Um grupo de habitantes de Cotiza foi às ruas fazer um panelaço, e incendiou latões de lixo, até que a polícia interviu com gases lacrimogêneos.

O grupo foi capturado na sede da unidade especial de segurança, e o armamento roubado já foi recuperado. A FANB manifestou seu repúdio a este ato, “que certamente foi motivado pelos obscuros interesses da extrema direita, e que são contrários às normas elementares da disciplina militar, à honra e às tradições da nossa instituição”, e ratificou seu irrestrito apego à Constituição e às leis da República.

O comunicado oficial relata que um grupo reduzido de assaltantes “traíram seu juramento de fidelidade à pátria e suas instituições, submeteu o capitão Gerson Soto Martínez, comandante do posto de coordenação policial Macarao, o qual atacaram com dois veículos militares, e logo invadindo o edifício do Departamento de Segurança Urbana da localidade de Petare, para roubar um lote de armas de guerra e sequestrar dois oficiais e dois guardas nacionais do referido destacamento.

Os assaltantes foram rendidos e capturados ainda na sede da unidade especial de segurança, onde encontraram firme resistência por parte dos oficiais e tropas profissionais ali postados, segundo o comunicado da FANB.

Juan Guaidó, presidente da Assembleia Nacional (de maioria opositora e que também desconhece o governo), atua para derrubar Maduro e assumir a Presidência. Em entrevista recente, afirmou que “não queremos que as Forças Aramadas se dividam ou que enfrentem lutas internas, mas sim que se coloquem unificadamente ao lado do povo, da constituição e contra a usurpação. Nossos militares sabem que a hierarquia está quebrada pela usurpação do cargo presidencial. A Assembleia Nacional se compromete a brindar todas as garantias necessárias aos membros das Forças Armadas que contribuam ativamente com a restituição da Constituição”.

O dirigente opositor Julio Borges disse em uma mensagem por Twitter que “a mesma insatisfação e desejo de mudanças motivou o assalto da GNB em Cotiza existe dentro de toda a FANB”.

Enquanto isso, a Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça reiterou nesta segunda-feira, (21/1), a “inconstitucionalidade do Poder Legislativo Nacional” e afirmou que a “Assembleia Nacional não possui uma mesa diretora válida, e sim uma mesa ilegítima, que foi eleita no dia 5 de janeiro de 2019, assim como as designadas inconstitucionalmente durante os anos de 2017 e 2018, usurpando a autoridade de outros entes dos Estado, razão pelo qual todos os seus atos são absolutamente nulos, em conformidade com o disposto no artigo constitucional nº 138”.

O presidente da Colômbia, Iván Duque, informou que está esperando que Guaidó se declare formalmente Encarregado da Presidência da República para que ele seja reconhecido pelo Grupo de Lima, no que é o seu “plano para a recuperação da democracia na Venezuela”. Duque explicou que para reconhecê-lo como presidente legítimo da Venezuela, Guaidó deve cumprir com as formalidades de juramento.

O objetivo dos assaltantes era estimular a que outros efetivos militares e cidadãos – que vivem em meio de uma crise econômica e social aguda – tomassem as ruas, criando o clima para justificar uma intervenção estrangeira, de “forças de paz” estadunidenses, brasileiras e/ou colombianas, com o aval desses governos e da secretaria geral da Organização dos Estados Americanos (OEA) e seu apêndice pró estadunidense, o chamado Grupo de Lima.

Victoria Korn é jornalista venezuelana, associada ao Centro Latino-Americano de Análise Estratégica (CLAE)
 

*Publicado originalmente em estrategia.la | Tradução de Victor Farinelli – Versão em português reproduzida de Carta Maior