Mesmo sem provas, palavra do homem ainda tem mais peso que da mulher?

Sem dúvida, os órgãos de segurança devem proceder à apuração dos fatos e a definição de culpabilidade ou não do jogador Neymar, cabe à Justiça. Mas o caso suscita reflexões vinculadas ao enfrentamento à violência contra as mulheres. A primeira delas se refere ao que se considera estupro.

*Por Julieta Palmeira

Neymar - Foto: Reprodução Instagram

Uma mulher resolve aceitar um convite para ir a algum lugar ou se envolve em um clima e aceita carícias íntimas de outra pessoa. Na sequência, uma determinada circunstância a deixa desconfortável ou a pessoa se torna agressiva e ela pede para parar. A pessoa força a barra, sem o consentimento da mulher. Isso é estupro. Quando a mulher diz não, é não. O fato pode ocorrer com uma pessoa que se conheceu recentemente ou de convivência cotidiana, um namorado, marido ou companheiro. Depois do não, tudo é violência, uma vez que somente a mulher pode decidir sobre o seu corpo.

Também não se justifica, diante de uma denúncia de estupro, e em nenhuma circunstância, a divulgação nas redes sociais de “nudes” e cenas íntimas sem consentimento da mulher e frequentemente com o intuito de abalar a credibilidade da denúncia e em alguns casos por vingança, por se ter rompido uma relação amorosa. Além de ferir a lei do Marco Civil da Internet do Brasil, no seu princípio de garantir a privacidade na rede, é um tipo de violência contra a mulher: a violência moral que gera constrangimento social.

Outro aspecto é que em uma sociedade onde impera o machismo, o sexismo e a misoginia, a informação fornecida por uma mulher muitas vezes não tem a mesma credibilidade que a fornecida pelo homem. Não é infrequente a mulher ser estuprada ou sofrer outro tipo de violência e a sua credibilidade ser posta em xeque. Ela tem, muitas vezes, que superar a desconfiança inicial e tipos de perguntas como: com qual roupa estava vestida no momento da violência sexual? Aliás, isso se constitui em mais uma violência. Se o fato ocorre numa delegacia ou numa unidade de saúde, por exemplo, caracteriza-se como violência institucional.

A masculinidade tóxica está na origem do que se chama de cultura do estupro. É a ideia de que o homem pode forçar um beijo na boca ou um coito, sem consentimento da mulher, para atender aos seus desejos e reafirmar a sua masculinidade. E ainda, se tenta passar a ideia de que mulheres gostam disso. Confunde-se masculinidade com virilidade e aprisiona o homem num modelo em que a masculinidade está associada ao desempenho sexual ou à ideia de que homem não pode recusar sexo.

É a masculinidade tóxica que faz com que o homem considere a mulher como sua propriedade, incluindo o seu corpo, disponível para atender às suas vontades e desejos. Esse tipo de masculinidade, a tóxica, está associada à agressividade, à opressão que está na base da violência doméstica e familiar contra as mulheres. A sociedade deve buscar relações saudáveis entre homens e mulheres, relações de respeito. E essa mesma sociedade não pode continuar adotando um modelo de educação que transforme homens em agressores e mulheres em agredidas.