Orlando Silva: Agenda autoritária de Bolsonaro não tem respaldo social

Diante do que esperavam os organizadores, fracassaram os atos em defesa do governo e da Lava-Jato. Foi o que se viu nas ruas do país neste domingo: mesmo com o reforço de grupos como o MBL e o Vem Pra Rua, as manifestações foram bem inferiores as de 26 de maio, que por sua vez já davam sinais de refluxo.

Bolsonaro

Além da adesão menor, a verdade é que os atos mais relevantes estão ficando circunscritos aos estados do centro-sul e o perfil dos manifestantes representativo apenas das elites. A mídia fala em manifestações em 70 cidades, pouco se compararmos com as mobilizações em defesa da educação – e, por extensão, contra o governo -, que ultrapassaram 1 milhão de pessoas e atingiram mais de 200 municípios.

É claro que Bolsonaro e Moro se apressaram em cantar vitória, não o fazer seria equivalente a admitir que o grito das ruas não passou de sussurro. Pior: seria atestar que o governo perde popularidade rapidamente, como mostram as pesquisas, e que as denúncias de ilegalidades cometidas pelo juiz e por promotores na Lava-Jato atingiram em cheio a imagem da operação e de seu principal agente.

À medida em que apostam em pautas autoritárias, como fechamento do Congresso e do STF, e buscam sacralizar as imagens de Bolsonaro e de Moro, os grupos de extrema-direita passam a pregar apenas para convertidos e se isolam da ampla maioria da sociedade. Aliás, com a evocação desavergonhada de ideias fascistas, a divisão e o ódio tomaram o próprio movimento, como provam as cenas de pugilato entre grupos e a hostilidade recebida pelo MBL em diversos locais.

Chama a atenção esse culto à personalidade obsessivo, politicamente rasteiro, que prega a substituição das instituições democráticas por pretensos salvadores da pátria. Por mais críticas que se faça à política, tal messianismo não encontra nenhum respaldo na realidade objetiva. Goste-se ou não da agenda atual, tudo o que se move no país acontece apesar de Bolsonaro e não a partir dele. É ridículo o argumento de que o Congresso e o STF sabotam o executivo. A verdade é que, em seis meses no cargo, o presidente da República só atrapalhou o funcionamento do governo e agravou a crise econômica do país. Ora, quem tem um “messias” desses nem precisa de inimigo…

A pergunta que fica é qual rumo tomará o governo a partir de agora? Vai entender que já perdeu tempo e capital político demais apostando numa radicalização insana e passar a se comportar dentro dos marcos democráticos? Ou vai redobrar a aposta no extremismo, buscando manter mobilizada sua seita de apoiadores acríticos? A resposta a esses questionamentos deixa o país em tensão permanente.

Por isso mesmo é preocupante que o ministro Augusto Heleno, quadro experiente que é, tenha sucumbido aos devaneios autoritários do presidente e participado de mobilizações abertamente hostis às instituições. Não parece que seja representativo de militares que compreendem o papel das Forças Armadas. É muito arriscada a politização dos quartéis, conforme já alertou o general Villas-Boas, então comandante do Exército.

É urgente que os diversos setores políticos se sentem à mesa para dialogar e unificar posições tendo como centro a defesa da democracia e do Estado de direito. É imperativo isolar a extrema-direita e matar no ninho o risco de aventuras autoritárias.

Nossa luta deve ser pela frente ampla, por uma nova maioria, capaz de garantir a democracia e, a partir dela, retomar um projeto nacional de desenvolvimento que defenda a soberania, estimule os investimentos públicos e privados, impulsione o crescimento econômico e proteja os direitos sociais.