João Vicente Goulart denuncia, na UNE, ataques à Previdência

Bolsonaro quer entregar a Previdência ao sistema financeiro.

Por Hora do Povo 

João Vicente Goulart

Congresso da UNE (foto: HP)

João Vicente Goulart, filho do presidente João Goulart, dirigente nacional do PCdoB, e presidente do Instituto João Goulart, falou aos estudantes no 57º Congresso da UNE, na quinta-feira, (11/07), em Brasília.

Relembrando a luta de seu pai, Jango – presidente constitucional e eleito destituído pelo golpe de 1964, que instaurou uma ditadura que durou 21 anos – João Vicente denunciou a ingerência do imperialismo norte-americano, tanto naquela época, como agora, no governo obscurantista e entreguista de Jair Bolsonaro.

Em seu discurso, ele denunciou o entreguismo e a subserviência do atual governo e fez uma radiografia da ação desestabilizadora de órgãos ligados ao imperialismo, na derrubada do governo democrático de Jango, em 1964. “Métodos usados naquela época contra o Brasil estão de volta nos dias de hoje”, alerta.

Ele mostrou que, por trás de medidas como a reforma da Previdência, dos cortes de verbas das Universidades, do ódio a Paulo Freire e de movimentos como Escola Sem Partido, estão forças retrógradas, “bem próximas do fascismo”, que querem garrotear a luta dos estudantes e impedir o Brasil de construir seu futuro.
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Leia, abaixo, o discurso de João Vicente Goulart no Congresso da UNE:

Boa tarde a todos.

Quero agradecer o convite e a oportunidade de falar a estes líderes de hoje, jovens universitários, professores e a todos os presentes que acreditam democraticamente em uma nação soberana, livre, e autodeterminada pela educação. Lutamos todos para termos um Brasil de amanhã, e, repleto de sonhos, onde a soberania seja definitiva.

João Vicente Goulart faz palestra no Congresso da UNE (foto: HP)
Fiquei honrado com o convite, feito pela presidente Marianna e meditei muito, em qual mensagem poderia ser relevante para dar significância à minha participação, através deste meu discurso diante de vocês.

O que dizer em 20 minutos? O que o cidadão João Vicente pode relatar de relevante para seus compatriotas, para nossa juventude, sobre o nosso Brasil?

Um Brasil hoje poluído pelas Fake News. Um Brasil construído por uma eleição eletrônica, um país confuso. Um Brasil doente.

Cheguei à conclusão que, para falar da doença que sofremos, da doença política, tenho que falar, antecipadamente de uma guerra que o Brasil está perdendo.

Na verdade, posso oferecer um testemunho de alguns fatos que confirmam a existência de uma guerra antiga. Uma guerra fria que perdemos em 1964 e que hoje se repete com muita força e vigor, acentuando o ultraliberalismo radical em nosso país e que, aceleradamente se aproxima do fascismo. Mas não vou contar para vocês o que vivi, ainda muito criança, com 7 anos de idade, em 1964, quando fomos para o exílio no Uruguai.

Os anos de chumbo que os Estados Unidos da América nos impuseram, através da ingerência no Golpe de 1964, onde brasileiros foram exilados, banidos, assassinados, estudantes e professores perseguidos, mortos e torturados.

Em nome deles quero aqui homenagear Honestino Guimarães, como bandeira de luta neste 57º Congresso da UNE.

Honestino Guimarães, PRESENTE!

Voltando aos dias atuais, nosso país está sendo entregue aos grupos multinacionais que lá atrás combatemos, e, pior ainda, com um descaro deste governo que chega ao cúmulo do servilismo gratuito, em continências e reverências ao império americano, capitaneado pela pior espécie de conservadorismo retrógrado, assemelhado a valores da idade média, ao escravagismo, ao segregacionismo, à perseguição de minorias e ao controle dos cidadãos por intermédio da autocracia e a sua submissão pelo controle da educação.

Nosso desafio hoje é lutar interna e externamente. Lutar contra o fascismo interno e lutar contra o imperialismo feudal, que está privatizando nossas riquezas, nossas vidas e nossas esperanças de sermos economicamente independentes, socialmente mais justos e soberanamente livres.

Vou contar de forma resumida como, a partir de uma tentativa de processar o governo norte-americano, juntamos provas suficientes para reconhecer um padrão de sabotagens que nos revelou o panorama de uma guerra fechada.

A história começa em 2002, quando tive um surto de indignação. Perdi a calma quando assisti uma entrevista na TV Globo do embaixador norte-americano Lincoln Gordon, vendendo sua confissão biográfica de que havia ajudado o governo de seu país a violar a soberania do Brasil, fornecendo fundos americanos secretos para patrocinar o golpe de 1964!

Era muita falta de noção, e tratei de procurar um escritório de advocacia que estudasse a viabilidade de processar governo norte-americano, e assim o fizemos.

O pedido de reparação de danos que formulamos foi indeferido pela Justiça brasileira, sob o fundamento de que o patrocínio do Golpe de Estado pelo governo norte-americano, ao financiar candidatos ao parlamento nas eleições de 1962, anti-janguistas, e colocarem a 4ª Frota americana na costa brasileira, foi um ato de império ou de Estado, portanto imune à jurisdição brasileira.

Ocorre que esse fundamento é falso. O ato de Império tem por base a Legalidade interna do processo de decisão. A intervenção norte-americana no Brasil violou um tratado internacional. Violou a Carta da Organização dos Estados Americanos, aprovada no ano de 1948. Violou os seguintes artigos:

Artigo XIII – Cada Estado tem o direito de desenvolver, livre e espontaneamente, a sua vida política e econômica. No seu livre desenvolvimento, o Estado respeitará os direitos da pessoa humana e os princípios da moral universal.

Artigo XV – Nenhum Estado ou grupo de Estados tem o direito de intervir, direta ou indiretamente, seja qual for o motivo, nos assuntos internos ou externos de qualquer outro. Este princípio exclui não somente a força armada, mas também qualquer outra forma de interferência ou de tendência atentatória à personalidade do estado e dos elementos políticos, econômicos e culturais que o constituem.

Artigo XVII – O território de um estado é inviolável; não pode ser objeto de ocupação militar, nem de outras medidas de força tomadas por outro Estado, direta ou indiretamente, qualquer que seja o motivo, embora de maneira temporária. Não se reconhecerão as vantagens especiais obtidas pela força ou por qualquer outro meio de coação.

Artigo XXIV – Toda agressão de um Estado contra a integridade ou a inviolabilidade do território, ou contra a soberania, ou independência política de um Estado Americano, será considerada como um ato de agressão contra todos os demais Estados Americanos.

O governo norte-americano sabia que estava cometendo um ato ilegal apoiando o golpe de 64.

Existe o registro do presidente Johnson assumindo “riscos” com o golpe. Quais riscos? O risco de serem processados, porque a constituição norte-americana equipara tratados internacionais aos seus preceitos. Ao patrocinar o golpe de 1964, o Poder executivo norte-americano violou a constituição norte-americana, pois rompeu os compromissos assumidos com a Carta da OEA. Moral da História, o golpe de 64 é um ato ilícito aqui e nos Estados Unidos. Foram atos de gestão do Poder executivo norte-americano.

Nosso Judiciário entendeu que o uso de submarinos e uma frota naval eram suficientes para caracterizar a intervenção como ato de império. Acontece que um ato de Estado exige uma investidura de legalidade pelo Congresso norte-americano, o que ocorreu no caso da Guerra do Iraque, mas não ocorreu no patrocínio de golpes militares em toda América Latina; portanto, o patrocínio dos golpes por aqui, na América Latina, foram atos ilícitos, praticados por funcionários do governo americano no Brasil, e em todos os outros golpes militares no continente. Foram atos de gestão.

Na mesma época que estávamos tratando deste processo, começou a desclassificação de documentos secretos pelo governo norte-americano sobre o golpe de 64 e o padrão revelado foi de que o governo norte-americano patrocinou diversas sabotagens chamadas de “covers actions” contra o Brasil. Citando apenas o professor Carlos Fico, coordenador de mestrado da UFRJ, podemos dizer que este levantou a documentação, comprovando mais de uma centena de sabotagens institucionais e as revelações se acumulam com a pesquisa dos documentos históricos por outros pesquisadores.

A pesquisa histórica revelou que o governo que caiu em 1º de abril de 1964 tinha 70% (setenta por cento) de aprovação popular, as reformas de base o apoio de 60% do eleitorado e Jango liderava as pesquisas com 50% das intenções de voto para a eleições presidenciais de 1965.

A documentação desclassificada ajuda a ter um entendimento mais cru do processo histórico.

Principalmente quando ouvimos, na voz do presidente Kennedy, em reunião gravada na Casa Branca, que os comunistas no Brasil não eram o cerne do problema. Eram incipientes, mas que o governo norte-americano ia utilizar de qualquer modo a bandeira do anticomunismo para derrubar o governo de Jango e atacar os nacionalistas.

A demonização do comunismo se repete hoje como um mantra de justificação do discurso de ódio.

Depois de ouvir o Kennedy explicando que o golpe de 1964 foi para derrubar os nacionalistas, não dá mais para alguém ficar repetindo a bobagem de que o golpe de 64 salvou o Brasil do comunismo.

O golpe é um capítulo do processo de intervenção e continuamos perdendo a guerra fechada que derrubou Getúlio Vargas em 1945, com apoio do embaixador norte-americano Adolf Berle, Jango em 1964 com apoio do embaixador norte-americano Lincoln Gordon, e Dilma em 2016 com a mesma embaixadora norte-americana, Liliana Ayalde, que regeu o impeachment do Presidente Fernando Lugo no Paraguai.

Os novos golpes paraguaios através dos Congressos corrompidos por eleições manipuladas e liberações de verbas nas vésperas de votações que atingem nossa constituição, continuam nos afetando hoje no palco de nossa democracia.

Então nos perguntamos, o que é uma guerra fechada? É aquela em que se promove uma sabotagem em larga escala de forma oculta. Trata-se de uma guerra em que se introduz e se promove doenças no organismo social. Um tipo de guerra que tem por meta fomentar a miséria, a violência e a ignorância no coletivo a ser atingido. O Brasil tem todos os sintomas dessa doença. Doença que alguns especialistas, hoje, chamam de guerra híbrida.

Já sabíamos disso 13 anos atrás, num seminário sobre Jango realizado na UERJ em 2006, um dos advogados da família que acompanhava o levantamento de documentos pelos historiadores, depois de descobrir que o Ministro da Defesa do governo Lula tinha plena ciência de que, já naquele momento, estávamos perdendo uma guerra fechada, perguntou:

– “Ministro, o senhor sabe que a Usura é a arma da guerra fechada para produzir miséria. Então como é possível que um governo dito ‘trabalhista’ chegue ao poder e legalize a usura? ”

Fiquei preocupado que a pergunta sobre a revogação do artigo 192 da constituição pudesse constranger o ministro Valdir Pires, que foi membro do governo Jango. Um amigo da família, que estava prestigiando o seminário que rompia 50 anos de silêncio sobre Jango, mas a resposta foi surpreendente e crua:

– O governo federal é refém de um esquema. O máximo que vamos conseguir fazer é reduzir um pouco a miséria.

Diante dessa resposta, o advogado desanimou:

– Então acabou. Perdemos de vez a soberania. Não temos esperança?

E nosso nacionalista Valdir Pires foi cirúrgico:

– Temos sim. Quando a população tiver consciência do processo político. Aí vamos poder virar o jogo.

Aqui termino a primeira parte desta minha reflexão – a da diagnose da doença do Brasil – estamos perdendo uma guerra fechada ou híbrida desde a década de 40 e a cura começa com a conscientização do povo.

Neste teatro de guerra fechada, a frente de combate à ignorância é a educação. E a segunda parte desta dissertação apresenta exemplos e maneiras de como se pode vencer a ignorância de modo eficaz e combater a desigualdade.

Temos o exemplo dos governos do Brizola no Rio Grande do Sul e no Rio de Janeiro, onde erradicou o analfabetismo antes do golpe de 64 e, depois, fez construir, com o nosso Darcy Ribeiro, 500 escolas de modelo integral em 4 anos. Dá para evoluir…

Melhor do que tentar esclarecer a estratégia adotada pelo governo de Jango para combater a ignorância e a desigualdade social, prefiro ler para vocês o texto do ex-ministro do Trabalho e da Previdência de Jango, o nacionalista Almino Afonso, que resume o potencial do método Paulo Freire.

Acredito que este texto mostra de forma clara que temos como combater o obscurantismo. Obscurantismo que, hoje, quer demonizar a pessoa de Paulo Freire, que desenvolveu um método revolucionário de inclusão política. Obscurantismo que, hoje, quer abraçar nossa educação e submetê-la a total falta de recursos para nossas universidades, não somente acabando com a pesquisa brasileira, mas submetendo nossas futuras gerações à alienação política, ao ostracismo intelectual e à falta de consciência da verdadeira cidadania.

Quem quer demonizar e combater Paulo Freire?

Quem tem interesse de tirar do povo a possibilidade de pensar e agir livremente?

Em 28 de junho de 2016 um texto que acusava Freire e sua pedagogia de inserir doutrinação marxista nas escolas, publicado originalmente por um think tank defensor do neoliberalismo chamado Instituto Liberal, foi inserido em sua biografia na Wikipédia em português.

Apesar da edição ter sido revertida após 9 minutos, a viúva de Freire, Ana Maria Araújo Freire, nossa querida Nita, ao tomar conhecimento do fato e saber que a edição foi feita através dos servidores controlados pelo Serpro, o Serviço Federal de Processamento de Dados, protestou, em carta pública dirigida ao então Presidente da República em exercício, Michel Temer.

O Instituto Liberal é uma organização sem fins lucrativos fundada pelo empresário Donald Stewart Jr. em janeiro de 1983 na cidade do Rio de Janeiro. Faz parte de uma rede de think tanks cujo objetivo é difundir os valores liberais (livre iniciativa, propriedade privada, responsabilidade individual etc.) no Brasil.

A organização é considerada um think tank do liberalismo e da nova direita no Brasil. Think, na língua inglesa, pode ser traduzido como ‘pensar’; já a palavra tank significa ‘tanque’, ‘reservatório’, por isso o termo think tank pode ser traduzido como ‘grupo de reflexão’, ‘laboratório/fábrica de ideias’. Não dá para confundir estes centros difusores de valores liberais com algum polo de desenvolvimento cultural. Uma das ideias que brotou dessa rede em defesa do liberalismo é um movimento bem conhecido de vocês. O movimento “Escola sem Partido”, que objetiva desautorizar uma pedagogia que liberte o oprimido do opressor.

Segundo os apoiadores do projeto, o Escola sem Partido seria importante, pois, em uma sociedade livre, as escolas não devem funcionar como centro de doutrinação, mas sim fornecer uma formação ideologicamente neutra e voltada ao aprendizado. O movimento afirma que existe um processo de doutrinação ideológica de cunho esquerdista muito forte nas escolas.

Os defensores do Movimento Escola sem Partido afirmam que questões como religião e gênero também não devem ser discutidas em sala de aula, mas apenas na esfera familiar. Ou seja, pretendem que a educação moral é prerrogativa exclusiva da família. Na verdade, o movimento Escola sem partido defende uma escola sem espaço para discussão da cidadania. A meta política do Movimento Escola sem Partido é garantir que o aluno não vai desenvolver o pensamento crítico. Daí demonizarem Paulo Freire.

Eles demonizam Paulo Freire porque temem a inclusão social das camadas mais pobres no processo político. Sendo evidente que os despossuídos, uma vez esclarecidos, questionariam as desigualdades sociais num país que produz tanta riqueza.

O processo de dominação de nosso país pela guerra fechada envolveu um aparato midiático de propaganda cada vez mais sofisticado. Temos diversos exemplos, desde a estratégia de inviabilizar a produção de cultura nacional, começa quando os estúdios brasileiros de cinema foram fechados, levaram Carmem Miranda e Oscarito para Hollywood. Na campanha do Petróleo é Nosso, os Diários Associados, que representavam 85% da imprensa nacional, foram patrocinados pela Standard Oil para combater o monopólio do petróleo pela Petrobrás e difamar e caluniar Vargas.

Na década de 60, temos o IPES, financiado pela CIA, enviando semanalmente folhetins para todos os oficiais da ativa – cumprindo o que Kennedy projetou – acusando o governo Jango de ser comunista. A historiadora Denise Assis fez um levantamento no Arquivo Nacional e descobriu que o IPES e o IBADE financiaram 200 filmes de propaganda pró-golpe entre 1962 e 1964. Um filme a cada três dias.

O processo de dominação cultural cresceu ainda mais com o advento da TV Globo, que desde 1965 tem um papel ativo na manipulação da opinião pública brasileira contra os interesses nacionais e em defesa dos valores “liberais”. A Globo se tornou uma máquina de propaganda, dominação e lavagem cerebral extremamente sofisticada, mas que depois da eleição do Lula, em 2002, não conseguiu mais emplacar candidaturas simpatizantes dos valores ditos “liberais”.

O vazamento massivo de dados do Facebook, e o advento do algoritmo usado pelo Steve Bannon para promover a pauta liberal da Nova Direita, introduziu um novo tipo de manipulação da opinião pública, mediante fake news. 84% dos eleitores que votaram na candidatura de Bolsonaro acreditaram na existência do kit gay e o TSE só proibiu o uso dessa mentira faltando 10 (dez) para a eleição.

É evidente que o kit gay foi usado como instrumento da política do medo para influenciar o eleitorado mais conservador com a ideia de que a escola estaria fazendo apologia do homossexualismo, sendo uma influência nociva e uma ameaça aos filhos impúberes em idade escolar. É evidente que faltou um pensamento crítico aos eleitores que acreditaram na existência do kit gay. Eleitores que foram escolhidos pelo algoritmo usado por Bannon, e pela Cambridge Analitics, por representarem um faixa da população suscetível à manipulação pelo discurso da Nova Direita.

Hoje, aqui neste templo universitário de resistência democrática, atonitamente voltamos a discutir a volta do autoritarismo (obscurantismo?), mais sofisticado é claro, mas podemos lembrar da grande luta de resistência que esta Universidade travou contra o arbítrio, quando o corpo docente se demitiu de forma massiva contra a intervenção do regime militar, mostrando ao Brasil a saga de coragem do DNA de sua criação.

Na sua concepção original de universidade, Anísio Teixeira mostrava, já naquele então, sua ideia de criar uma universidade autônoma, independente, e que pensasse o Brasil.

Coube a Jango, o presidente João Goulart, no seu governo, promulgar e assinar a lei nº 3.988, que criou a Fundação Universidade de Brasília, em 15 de dezembro de 1961. Darcy Ribeiro assume como primeiro reitor da Universidade de Brasília, pois Anísio não podia estar permanentemente em Brasília por longos períodos, aceitando então a vice-reitoria.

É uma história bonita, que dignifica em nosso país a luta pela emancipação dos estudantes, professores, educadores e todos aqueles brasileiros que através da educação querem pensar um país de todos.

Nossos estudantes não são baderneiros, não são incompetentes, nem tampouco subversivos, são brasileiros que querem Justiça Social, não uma Pátria submissa a qualquer potência imperialista mundial; nem querem estar atrelados a um Gene Kelly protegido pelo guarda-chuva de uma mídia oficial com um ministro-palhaço da educação, num país que precisa resgatar o brilho de sua cultura própria, de um Brasil miscigenado, brasileiro.

Ninguém dança nessa “chuva entreguista”, a não ser os midiotizados ou puxa-sacos ideológicos do atual governo que querem acabar com o pensamento coletivo e crítico para estupidificar mais ainda a Nação, manipulando o acesso às cátedras universitárias.

Darcy, a quem Jango delegou várias missões pela sua capacidade inconteste de pensar o “socialismo moreno”, foi deslocado pelo presidente de uma aldeia indígena, como um dos maiores antropólogos brasileiros, a dirigir a UNB, a ser ministro da Educação e Cultura, e por fim, já no golpe de abril de 1964, era seu ministro chefe da Casa Civil da Nação Brasileira.

Despertar nossa memória e a história de nossos líderes para as novas gerações faz-se mister, nos dias de hoje. Temos que reacender a chama de nossas lutas travadas em defesa da democracia, da liberdade, da soberania e da justiça social. Temos que mostrar que existiu e resiste uma chama de resistência nacionalista.

Temos que revisitar o projeto de Nação que o golpe de 64 abortou tirando do povo brasileiro a oportunidade de uma maior inclusão social e participação na riqueza nacional.

As “Reformas de base”, do Presidente Jango e seus colaboradores, são tão ou mais necessárias nos dias de hoje para libertar o Brasil do papel de colônia explorada, da prepotência e do fascismo.

A reforma agrária, a reforma universitária e educacional, a reforma política, a reforma tributária, a reforma urbana, a lei de remessas de lucros das empresas estrangeiras, a reforma bancária, que até hoje nenhum governo se atreveu a mencionar novamente, a outorga do monopólio às nossas empresas estatais da exploração e comercialização de nossas riquezas estratégicas, o fim da sangria de recursos sociais pelo sistema financeiro local e internacional relativos à dívida pública, e a reconstrução e valorização de termos orgulho nossa cultura multifacetada, multicolorida, multi-religiosa, branca, amarela, negra, indígena, quilombola, brasileira com a nossa cara; de todos nós que almejamos um país solidário.

Darcy defendia que a população brasileira, em razão de sua miscigenação, era a melhor matéria-prima para uma nova civilização. Ora, esta afirmação tem cunho científico, porque troca e intercâmbio são fatores de evolução. O brasileiro é a síntese da humanidade em sua diversidade. Na década de 60, Nelson Rodrigues, diante do papel cultural, esportivo e político que o Brasil realizava perante o mundo, decretou a morte do complexo de vira-lata do brasileiro.

A política de dominação da Guerra Fechada procura nos convencer de que este estado das coisas é fruto da cultura ou da natureza do brasileiro, afastando o olhar mais crítico da verdadeira origem de nossos males. Estamos sendo sabotados desde a década de 40, mas agora é mais fácil enxergar o despudor de quem vem destruindo os nossos sonhos mediante uma guerra fechada que usa políticos de aluguel e manipula a opinião pública com desinformação e mentiras.

Esta semana, o governo vem promovendo mais uma sabotagem, que é entregar o nosso modelo de Previdência nas mãos do sistema financeiro. Perderemos mais um amortecedor social contra a miséria, pois o modelo oferecido já foi testado e foi um fracasso no Chile. O trabalhismo de Vargas e João Goulart defende uma cooperação entre o Capital e o Trabalho para gerar riqueza, mas neste modelo o capitalismo é controlado.

Estes títeres do capital selvagem extinguiram o Ministério do Trabalho e desarticularam o sistema criado por Vargas, retirando a fonte de financiamento que garantia a autonomia sindical. Algo que, sob a perspectiva da Guerra fechada, tem por objetivo estratégico – alimentar a miséria no seio de nossa sociedade. Por isso é importante que as novas lideranças estudantis venham a entender este teatro de guerra fechada que inclui a promoção da ignorância para manipular a população.

O movimento estudantil deve buscar qualificar o discurso sobre a Guerra que o Brasil vem perdendo. Mais importante do que uma luta intestina sobre ideologia, precisamos entender que a polarização interna atende os interesses de quem vem explorando este país e manipulando nosso cotidiano. O movimento estudantil precisa ser difusor.

Obrigado, presidente Marianna, por esta oportunidade de estar aqui, reintegrando em minhas veias uma nova injeção de patriotismo e juventude junto a este mar de jovens estudantes combatentes que a UNE representa.

Obrigado.