Rodrigo de Almeida: Luciano Huck já está em campanha e rodará o País 

Ninguém é tolo de admitir com tanta antecedência, as declarações públicas continuarão sendo ambíguas até segunda ordem, e as práticas podem parecer apenas protocolo de intenções de alguns caciques partidários. Mas o fato é que o apresentador e empresário Luciano Huck é candidatíssimo à Presidência da República.

Por Rodrigo de Almeida

Luciano Huck

Mais do que significar possibilidade e teste de viabilidade para 2022, Huck não só tem se movimentado nos bastidores, como aqui e ali se publica. No momento, ele está se preparando para “rodar o Brasil inteiro” a partir do ano que vem. Até lá, não para de conversar e pensar como futuro candidato.

O movimento é triplo e ambicioso. Primeiro, tornar-se um candidato conhecido (como apresentador, sabemos, ele já é bastante conhecido). Segundo, articular-se com lideranças pelos estados. E terceiro, aprender e debater o Brasil.

Para tanto, consumará o que nunca deixou de fazer, mesmo quando no início de 2018 anunciou a desistência de sua pré-candidatura na disputa presidencial que elegeu Jair Bolsonaro: cercar-se de quadros, conversar com quem pode e formular ideias capazes de chegar a 2022 com aquilo que não exatamente exibia no ano passado – um projeto claro de governo.

Até aqui, seus movimentos e estímulos de partidos como o Cidadania e a Rede parecem coisa de namoro e teste mútuos, ou ímpeto de entusiastas – como Paulo Hartung, o ex-governador do Espírito Santo que costuma dizer a interlocutores que a candidatura de Huck é uma possibilidade, mas não uma certeza.

O apresentador conta ainda com o suporte de movimentos como o Agora e o RenovaBR, além de falas protocolares mas genuinamente simpáticas a ele, como a do senador tucano Tasso Jereissati. Ou ainda ofertas generosas, como a de Roberto Freire, presidente nacional do Cidadania, que há poucos dias defendeu a legenda como abrigo a Huck se ele “porventura decidir participar do pleito”.

Essa decisão, reafirme-se, já está tomada – o que falta é Huck viabilizar o melhor caminho para torná-la prática.

Roberto Freire disse, numa lista de discussões, que Huck representa a formação do seu partido: “uma visão social-democrata fruto de uma preocupação com a questão social e claras posições de um liberal progressista”. Pode ser que sim, pode ser que não.

Que o apresentador demonstra ter claro posicionamento de um liberal progressista, isso parece verdade; que sua preocupação com a questão social possa ser genuína, também parece; mas é muito mais provável que uma candidatura sua esteja mais alinhada com uma visão liberal em todos sentidos (economia, política e valores) do que propriamente social-democrata.

Esta não é uma questão meramente conceitual – as respostas a estas dúvidas significarão na prática o tom de discurso que preencherá as demandas de um eleitorado que chegará a 2022, em grande parte, órfão de uma esquerda pós-Lula e incrédulo com o liberalismo econômico singular e errático de Bolsonaro.

Huck dependerá também dos adversários que o enfrentarão – e aí talvez não seja nem tão liberal na economia quanto Bolsonaro, Amoêdo ou Doria, nem tão social-democrata quanto Ciro Gomes ou um candidato petista.

Independentemente de qual caminho efetivamente sua formulação de Brasil chegará a 2022, Huck exibe condições para amadurecer politicamente até lá. Neste sentido, tem tempo (não muito) para corrigir as distorções e equívocos demonstrados na pré-candidatura que não se consumou em 2018.

Equívocos que o cientista político Fernando Limongi, da USP e do Cebrap, definiu na época como um misto de oportunismo, ingenuidade e prepotência. Oportunismo porque, naquele momento, Huck preenchia o típico papel da “celebridade com veleidades políticas”.

Ingenuidade ao acreditar convictamente que, recém-eleito com altos índices de popularidade, poderia convencer o Congresso a apoiar as boas ideias que tinha. (Desprezo pela atividade política não é bom caminho a trilhar na particularidade do sistema político brasileiro, mesmo desfalecido como está este sistema).

Prepotência pela soma dos dois primeiros e pela autoimagem de iluminados que alguns de seus conselheiros empresários, economistas e políticos exibiam naquele momento.

Com alguns anos a mais de conversa, reflexão e debate, Huck poderá ter a chance de corrigir equívocos e confirmar seu potencial. Não foi à toa que o presidente Jair Bolsonaro já mordeu a isca. Ele sabe que Huck não só se mostra um candidato real, como também é um candidato com potencial de vitória.

É o tipo de nome que pode opor-se e ao mesmo tempo conciliar-se à direita e à esquerda. Num ambiente bolsonarista de agressividade e conservadorismo, Huck pode se mostrar um liberal progressista capaz de pregar a conciliação, e não o ataque, e também uma revisão de ideias e valores em claro recuo com Bolsonaro.

Huck pode ainda estimular agendas mal compreendidas pela esquerda (como as questões ambientais e de segurança pública), pela extrema direita (a pauta dos direitos civis) e pela direita liberal (a desigualdade). Pode, por fim, ajudar a pensar uma formulação econômica que não signifique nem a do lulismo 2007-2010 (que Fernando Haddad tentou reeditar em 2018), nem o liberalismo mais selvagem à moda Paulo Guedes.

Diferente de 2018, o papel de Luciano Huck pode ser benéfico para ele, para o país e para a disputa presidencial. Resta ver como se sairá no teste que já deu seus primeiros passos, mas começará efetivamente quando ele começar a circular pelo Brasil dizendo a que veio.

* Rodrigo de Almeida, jornalista e cientista político, foi diretor de jornalismo do iG e secretário de Imprensa no governo Dilma. É autor de À Sombra do Poder: Bastidores da Crise que Derrubou Dilma Rousseff