Ato em SP reafirma unidade contra Bolsonaro e em defesa da democracia

Juristas, advogados, acadêmicos e lideranças denunciaram a escalada autoritária no país

Um ato no teatro Tucarena, da PUC-SP, reuniu nesta quinta-feira (12) juristas, advogados, acadêmicos, lideranças do movimento social e dirigentes de partidos para denunciar a escalada autoritária promovida pelo presidente Jair Bolsonaro e seus aliados. A ocasião também marcou o lançamento do livro Por que a Democracia e a Constituição Estão Sendo Atacadas, organizado pelo ex-deputado constituinte Aldo Arantes, com ensaios dos constitucionalistas Lênio Streck, Marcelo Cattoni, Martônio  Mont”Alverne e Pietro Alarcon.

A leitura de uma carta em defesa da democracia e da constituição federal abriu o encontro.  Um trecho do documento destaca a declaração de Ulysses Guimarães, presidente da Assembleia Nacional Constituinte, sobre a importância do respeito à Constituição, como base da democracia: “A Constituição certamente não é perfeita. Ela própria o confessa, ao admitir a reforma. Quanto a ela, discordar, sim. Divergir sim. Afrontá-la nunca. Traidor da Constituição é traidor da Pátria. Conhecemos o caminho maldito: rasgar a Constituição, trancar as portas do Parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, o exílio, o cemitério”.

A reitora Maria Amalia Pie Abib Andery destacou o simbolismo e a importância da realização do ato na PUC-SP – uma instituição cuja história está diretamente ligada à luta em defesa da democracia no Brasil “A democracia é muito trabalhosa. Ela nunca está pronta e depende de atos como esse para que seja defendida, atualizada e reformada. Democracia não se faz sem a participação de todos nós e sem uma Constituição que precisa ser respeitada”, afirmou.

Aldo Arantes recordou as consequências da promulgação do Ato Institucional 5, editado há 51 anos, em 13 de dezembro de 1968. Lembrou os mortos, desaparecidos e presos, as entidades cassadas, os estudantes jubilados e toda uma sequência perversa de violações às liberdades e à democracia. Ao propor a reedição do AI-5, integrantes do governo e os filhos do presidente Bolsonaro explicitam o cerne autoritário do governo, que lançou um novo partido de cunho neofascista. Segundo Aldo, o crescimento do autoritarismo é um elemento do capitalismo atual, que no conflito entre o estado social e o estado para o mercado não tem como garantir os interesses do mercado num ambiente democrático.

O presidente da Fundação Maurício Grabois, Renato Rabelo, disse que o “objetivo de Bolsonaro é instituir no Brasil um regime de exceção para desmontar o Estado nacional. Instalar um governo autoritário, criando sempre elementos de tensão social para justificar esse objetivo, e implantar um Estado policial que estimula à ação letal da polícia contra a juventude, os pobres e negros que vivem nas periferias”.

Renato citou como exemplos desse caráter autoritário as propostas de aplicação da Lei da Garantia e da Ordem, o Pacote Anticrime (sobretudo sua proposta de excludente de ilicitude) e as defesas de um novo AI-5. Ao lado disso, cresce a organização de milícias – que constituem um verdadeiro exército da extrema-direita. Na opinião do dirigente da FMG, o País está “diante de uma grande ameaça e de um grande perigo. Temos de unir todas as forças políticas em defesa da democracia e da Constituição para isolar Bolsonaro. Temos de criar uma frente alargada pela democracia. A fragmentação das forças democráticas alimenta os bolsonaristas”.

O jurista Celso Antônio Bandeira de Mello lamentou a presença de Bolsonaro na presidência da República. Sem nunca citar o nome do presidente, referindo-se a ele como “aquele indivíduo”, disse que ele “não foi colocado pelos militares e nem diretamente pelos EUA. Ele foi colocado por nós, e isso é triste porque ele é inimigo de todos nós”, lamentou. Bandeira de Melo disse que, em seus 83 anos de vida, nunca assistiu a tantos desmandos e ataques à Constituição vigente, apenas na ditadura militar. E entre os valores fundamentais inscritos na carta Magna ressaltou o da solidariedade. “A solidariedade é mencionada expressamente na nossa Constituição é este é um valor indispensável para a construção de sociedades democráticas”.

Também se manifestaram no ato os presidentes da UNE, UBES e do Centro Acadêmico 22 de agosto. Todos denunciaram os ataques sucessivos que o governo tem desferido contra a liberdade de cátedra, contra a Ciência & Tecnologia, contra as instituições de ensino e universidades. Ataques que se dão no campo da violação à liberdade de expressão, de pensamento e de pesquisa, e medidas de redução de recursos, além de projetos que privatizam a universidade e desmontam o sistema de ciência e tecnologia.

Leia abaixo a carta lida no Ato:

ATO EM DEFESA DA DEMOCRACIA E DA CONSTITUIÇÃO

O Ato em Defesa da Democracia e da Constituição é uma reposta da sociedade civil à grave situação vivida pelo País.  Ocorre dois dias após as comemorações do dia Internacional de Direitos Humanos e um dia antes de completar 51 anos da edição do draconiano AI-5.

Fruto das políticas do governo Bolsonaro a economia apresenta índices medíocres de crescimento e elevado desemprego.  As agressões aos direitos sociais caminham velozmente com a quebra de direitos trabalhistas e a reforma da previdência. O patrimônio nacional está sendo liquidado.

A Universidade Pública tem sido vítima de ataques. Desenvolve-se uma “caça às bruxas” com o chamado combate ao marxismo cultural.  A saúde pública enfrenta graves problemas. O meio ambiente está sendo degradado com o desmonte de seus órgãos de monitoramento e o consequente aumento do desmatamento e dos incêndios criminosos da Amazônia.

O ódio, a violência, a discriminação social, de gênero e de raça   estão presentes nos atos e declarações de autoridades do governo. Tal postura tem estimulado agressões físicas e assassinatos de pobres, negros e da comunidade LGBT. Exemplos disto são o crescimento do feminicídio; as mortes de 9 jovens no baile Funk de Paraisópolis; as prisões arbitrárias e sem nenhuma justificativa de brigadistas contra incêndios florestais em Alter do Chão e as denúncias de torturas, em quartel da polícia, de 7 jovens de uma comunidade da zona norte no Rio de Janeiro. 

As ofensivas contra a democracia e a Constituição colocam os democratas em alerta. As declarações e as medidas governamentais se sucedem. O Presidente Bolsonaro, defensor da ditadura, afirmou que as manifestações no Chile ocorreram porque a ditadura acabou. Seu filho Eduardo Bolsonaro, que antes ameaçara de fechar o STF com um cabo e um soldado, ameaçou com o retorno do AI-5. O Ministro da Economia, Paulo Guedes, seguiu na mesma trilha. 

E agora o governo envia ao Congresso um projeto de excludente de ilicitude em relação a atos praticados por militares contra manifestações sociais. Ou seja, procura uma autorização para matar em eventuais manifestações. O Presidente anunciou, também, a utilização da GLO (Garantia da Lei de da Ordem) para a realização de ações de despejo no campo. Isto é grave!  O que sobra de democracia corre sério risco.

O fato é que o governo vai adotando medidas que caminham no sentido da implantação de um estado policial militar de caráter neofascista. A democracia e seu fundamento, a Constituição estão sendo afrontadas. Os direitos e garantias individuais e coletivas estão sendo pisoteados.

A importância do respeito à Constituição, como base da democracia, foi afirmada pelo Presidente da Constituinte, Ulisses Guimarães, no Ato de sua promulgação ao declarar “A Constituição certamente não é perfeita. Ela própria o confessa, ao admitir a reforma. Quanto a ela, discordar, sim.   Divergir sim. Afrontá-la nunca. Traidor da Constituição é traidor da Pátria. Conhecemos o caminho maldito: rasgar a Constituição, trancar as portas do Parlamento, garrotear a liberdade, mandar os patriotas para a cadeia, o exílio, o cemitério”.

Este Ato visa contribuir para a construção de uma grande união dos democratas, acima de divergências partidárias, pra defender o Estado Democrático de Direito e seu fundamento, a Constituição de 1988.

A gravidade do momento exige que coloquemos de lado eventuais divergências para nos unir em torno de um programa mínimo que impeça um maior retrocesso democrático e abra caminho a para um futuro que assegure melhores condições de vida para o nosso povo e retome o caminho democrático.

O Ato é uma iniciativa da direção da faculdade de Direito da PUC SP, do Centro Acadêmico 22 de Agosto, dos autores do livro Por Que a Democracia e a Constituição Estão Sendo Atacadas? e conta com o apoio das seguintes entidades:

Faculdade de Direito da PUC-SP, CA 22 de Agosto, ABI (Associação Brasileira de Imprensa); Abrat – Associação Brasileira de Advogados Trabalhistas, Fundação Maurício Grabois, UNE, UEE, CA  XI de Agosto, Direitos Já – Fórum pela Democracia; Prerrô – Grupo Prerrogativas, ABJD (Associação Brasileira de Juristas pela Democracia) , ADJC (Associação de Advogados e Advogadas pela Democracia,  Justiça e Cidadania)  , Comissão de Direitos Humanos da OAB-SP, Sasp (Sindicato dos Advogados de São Paulo), Juízes para a Democracia, Observatório da Democracia, UJS, CTB (Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil), ANPG, APG/PUC-SP; Federação das Associações Comunitárias do Estado de São Paulo; UBM ( União Brasileira de Mulheres); Unegro ( União de Negros e Negras pela Igualdade), Anan – Associação Nacional da Advocacia Negra.

Com informações da Grabois.org