Ex-Lava Jato pede e PF abre inquérito por crime de opinião

Uma mensagem que circula no WhatsApp acusando o procurador da República Castor de Mattos de ter divulgado conversas dos colegas da Operação Lava Jato, a qual pertenceu até abril deste ano, por vingança motivou um pedido dele para que a Polícia Federal abrisse um inquérito.

No seu entendimento, o disparo das mensagens, apócrifas, enquadra-se no crime de obstrução de investigações sobre investigações criminosas, descrito no parágrafo 1º do artigo 2º da Lei de Organizações Criminosas. Eles também são acusados pelo procurador de calúnia e difamação.

O pedido de abertura de investigações foi encaminhado ao superintendente da PF no Paraná, o delegado Luciano Flores, também ex-integrante da Lava Jato. No dia 4 de julho, por ordem de Flores, o delegado Flávio de Palma Setti abriu o inquérito.

Entre os investigados, o sociólogo e cientista político Alberto Carlos Almeida, o ex-deputado federal e secretário de Desenvolvimento Rural da Bahia Josias Gomes e o advogado Leocir Costa.

Informações desmentidas

Diz o texto, já republicado em diversos blogs e perfis no Facebook, que o procurador vazou as mensagens para “se safar de uma ‘prensa’ que Dallagnol estaria armando para o escritório de seus irmãos Analice e Rodrigo Castor de Mattos”. O procurador nega as acusações e as chama de “fake news”.

De acordo com o texto, os irmãos Castor de Mattos montaram um “esquema para extorquir investigados”: Diogo, como procurador, os acusava de crimes enquanto Analice e Rodrigo, advogados, se ofereciam para conduzir um acordo de delação premiada.

Qualquer contestação seria debelada pelo procurador Maurício Gotardo Gerum, que trabalha como representante do MPF na 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região e é primo dos Castor de Mattos. As informações foram desmentidas pela força-tarefa da Lava Jato  em nota divulgada à imprensa e desde então têm sido tratadas como boatos.

Cortina de fumaça

Alguns dos investigados desconfiam das intenções do procurador com suas acusações. Ele mesmo é investigado no Conselho Nacional do Ministério Público. A principal acusação é de infração abusiva e atuação abusiva por ser signatário do “acordo” que deu ao MPF em Curitiba o controle sobre R$ 2,5 bilhões da Petrobras.

O acordo também é contestado no Supremo Tribunal Federal, que já suspendeu seus efeitos, e a ação acaba de ficar conclusa ao relator — pronta para ser julgada, portanto.

Mas Castor de Mattos também responde por ter alugado um outdoor para fazer propaganda da “lava jato” e por ter acusado quatro ministros do Supremo de integrar uma “turma do abafa”.

Ele também é acusado de difamar a Justiça Eleitoral por ter dito, em artigo publicado em jornais, que esse ramo do Judiciário é “um paraíso para políticos corruptos”.

O contexto era um julgamento em que o consórcio da Lava Jato queria que o STF declarasse inconstitucional a competência da Justiça Eleitoral para julgar crimes conexos a ilícitos eleitorais.

Mensagem encaminhada

No pedido de abertura de inquérito, o procurador apresentou diversos prints de mensagens dos investigados com as acusações ao procurador a grupos do aplicativo de conversa privada. Em todos os casos, as mensagens são sinalizadas com o ícone “encaminhada” em cima, símbolo usado pelo aplicativo de mensagens para avisar os destinatários da mensagem de que ela não foi redigida pelo remetente.

Mesmo assim, Castor de Mattos diz que os investigados imputam a ele os crimes de violação de sigilo funcional e invasão de dispositivo eletrônico. E ele, em troca, acusa os investigados de calúnia e difamação e de desacato. A tese do procurador é a de que a intenção dos investigados é “apenas obstruir os trabalhos da Polícia Federal sobre a organização criminosa que invadiu os aparelhos celulares de procuradores, juízes e policiais federais com o objetivo de desmoralizar a operação ‘lava jato’”, conforme ele diz na queixa-crime.

Crime de opinião

Em vídeo publicado nesta quinta-feira (12/12) no YouTube, Alberto Carlos Almeida diz que o inquérito é uma “atentado contra a liberdade de expressão”. “O próprio Diogo Castor de Mattos abriu uma investigação a favor de si próprio em Curitiba. Investigação essa cujo objetivo é me incriminar por uma mensagem que não redigi, só encaminhei”, diz Almeida, no vídeo. Almeida é defendido pelo advogado Luís Fernando Delazari.

No vídeo, o sociólogo conta que teve de ir à PF em São Paulo prestar depoimento e teve de responder qual foi sua intenção ao encaminhar a mensagem a um grupo de WhatsApp e se ele a redigiu. O delegado do caso em São Paulo é Ricardo Hiroshi Ishida, que toca inquéritos ligados à “lava jato” no estado.

Outros investigados não foram tão bem tratados. A eles, a PF perguntou se eles tinham consciência de ter cometido o crime de obstrução de investigações e de que haviam ofendido a honra de um procurador da República — embora o inquérito sequer tenha sido concluído para que os fatos já sejam tratados como crimes efetivamente cometidos.

Eles também tiveram de explicar como o UOL teve acesso a informações do inquérito. Em outubro, o site publicou a reportagem “Ex-Lava Jato usa cargo e aciona PF para investigar boatos sobre ele mesmo”. O UOL não é acusado de caluniar o procurador.

Depois de dois meses de investigações, a PF percebeu que os investigados são de esquerda. O relatório concluiu, por exemplo, que Alberto Carlos Almeida usa de fato uma foto dele mesmo no WhatsApp. E que é ele o cientista político que “faz vários comentários políticos, também com viés de esquerda, simpáticos aos partidos PT e Psol”, diz o documento.

Sobre Josias Gomes, ex-deputado pelo PT da Bahia, e Leocir Costa, pesa a acusação de serem marxistas, conforme o relatório da PF.

As informações são da Conjur