Renda deve continuar concentrada em 2020

Projeção de pequena retomada do crescimento não prevê redução expressiva do alto desemprego e a renda deve continuar concentrada nas mãos dos mais ricos.

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Os bancos acumulam lucros, os empresários dão as melhores notas ao governo Jair Bolsonaro nas pesquisas, mas os brasileiros viveram dias piores este ano. De janeiro a setembro, quem ganha até 1,6 mil por mês perdeu 1,6% da renda, enquanto quem ganha de 8 mil a 16 mil viu-a crescer 7,8%. São dados de uma pesquisa recente de um órgão oficial, o Ipea.

No ano que vem, a situação não deve ser lá muito diferente. Boa para o topo da pirâmide, e que o resto tenha paciência, como já pediu o ministro da Economia, Paulo Guedes, ao comentar o “pibinho” ao longo do ano. Geração de emprego em ritmo lento, salário idem.

Para 2020, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) prevê que o desemprego ficará no patamar elevado de 11,3%, com reflexo na renda. “Existe um estoque grande de desempregados que termina por moderar o ganho real de salário”, disse o economista-chefe da CNI, Flavio Castelo Branco, em 17 de dezembro, durante a divulgação de um balanço de 2019 e de estimativas para 2020.

Essa projeção de desemprego leva em conta o cálculo de que a economia como um todo crescerá 2,5% no ano que vem. E, apesar de o PIB avançar quase o dobro do visto em 2019, o mercado de trabalho não viverá uma situação muito diferente.

Em outubro, último dado oficial disponível no IBGE, o desemprego era de 11,6%, 0,3 ponto percentual apenas abaixo da estimativa da CNI para 2020. Havia 12,4 milhões de pessoas na rua. Outras 4,6 milhões haviam desistido de procurar vaga, por achar inútil, o chamado desalento. O salário médio era de 2,317 mil mensais.

Quando Bolsonaro e Guedes assumiram, o desemprego era de 11,6%, o número de desocupados era de 12,2 milhões e o de desalentados, de 4,7 milhões. A renda média estava em 2,254 mil reais. A variação de apenas 67 reais na renda ao longo do ano comprova que o trabalhador não tira proveito do princípio de aquecimento econômico.

“O grande problema hoje é o desemprego”, afirmou o presidente da CNI, Robson Andrade, durante a divulgação das previsões da entidade. “Não é fácil gerar emprego numa economia que busca ser mais inovadora, mais competitiva.”

Se o brasileiro precisa ter paciência, o empresariado não. A CNI espera um avanço da indústria de 2,8% em 2020. É quatro vezes mais que o projetado para o resultado final de 2019 e o maior índice desde 2011. Investimentos planejados para 2019 e que não se confirmaram devido ao consumo em ritmo lento têm chances crescentes de sair do papel, segundo a entidade.

“Tão importante quanto crescer a produção é como ela será distribuída. Não existem razões nem evidências para apoiar a estratégia de crescer o bolo para depois distribuí-lo. É essencial avaliar quem ganha e quem perde com cada política pública”, disse o Conselho Federal de Economia (Cofecon), em comunicado de 13 de dezembro. “É inaceitável crescer concentrando renda, mas essa é a perspectiva com a atual política econômica e suas reformas.”

Com o bolo a crescer sem repartição, não surpreende que uma pesquisa Datafolha feita entre 5 e 6 de dezembro tenha constatado: 58% dos empresários acham o governo Bolsonaro ótimo ou bom, e 20%, ruim ou péssimo. No índice geral, esses mesmos números são 30% e 36%, respectivamente.

Apesar disso, ainda há esperança de que Bolsonaro faça um bom governo. Para 43% dos entrevistados pelo Datafolha, o governo ainda será bom ou ótimo. É mais do que a opinião oposta, 32% esperam por algo ruim ou péssimo.

Essa diferença de sentimento entre o que o governo fez até agora e ainda pode fazer é chave na disputa política, e aí o rumo da economia vai pesar, na visão de um dos próceres da oposição, o senador Jaques Wagner, do PT da Bahia.

“Tudo vai depender da economia e do quanto o crescimento vai chegar ao emprego, às pessoas”, disse Wagner a CartaCapital. “As pessoas querem prosperidade, querem acreditar que vai dar certo. Mas, até agora, foi bom só para os de cima.”

Fonte: CartaCapital