Bolsonaro pode ter incorrido em crime de responsabilidade

Juristas avaliam incitação a protesto contra a institucionalidade democrática do país.

(Foto: Adriano Machado/Reuters)

A atitude do presidente Jair Bolsonaro de divulgar por seu WhatsApp pessoal uma convocação para ato contra a democracia, de ataques ao Congresso Nacional e ao Supremo Tribunal Federal (STF) pode ser enquadrada como crime de responsabilidade, de acordo com juristas ouvidos pelo jornal O Estado de S. Paulo.

O artigo 7º da Lei 1.079/1950 – que define os crimes de responsabilidade – estabelece entre eles, “provocar a animosidade entre as classes armadas ou contra elas, ou delas contra as instituições civis”.

Saulo Stefanone Alle, e especialista em direito público e doutor em Direito Internacional pela USP, diz que é necessário analisar com calma o conteúdo efetivamente compartilhado por Bolsonaro e o contexto em que este envio se insere.

“É preciso que o conteúdo compartilhado nas redes sociais contenha indiscutivelmente a incitação efetiva. A mera convocação para um ato público, sem o conteúdo efetivo de incitação contra os poderes não me parece suficiente, por si só, para uma acusação de crime de responsabilidade do presidente da República”, analisa.

Ônus e bônus

Já o diretor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), Floriano de Azevedo Marques Neto, classificou como um “absurdo” o envio da convocação do ponto de vista da liturgia do cargo de Presidente da República.

“Quanto ao aspecto jurídico, vejo dois problemas. O primeiro é incitar ou contribuir para prejudicar o bom funcionamento dos poderes, no caso o Congresso, o que é, por si só, grave. Mas o pior é, em parte da divulgação, a convocação dos militares para a quebra da ordem constitucional Incitar os militares contra um dos Poderes constituídos é gravíssimo. É uma hipótese expressa de crime de responsabilidade”, afirmou.

Ele pontuou que a desculpa dada por Bolsonaro de que as mensagens teriam sido repassadas no âmbito privado não encontram fundamento em razão do cargo ocupado.

“Há um ônus e um bônus em ser presidente da República. Um dos ônus é que você deixa de ter espaço para mensagens reservadas, porque enquanto se ocupa o cargo, não se deixa de ser presidente. O peso de uma declaração, mesmo que no âmbito privado, continua sendo de um presidente”, disse.

Decoro do cargo

A advogada constitucionalista Vera Chemim, mestre em Direito Público pela FGV, também diz que a ação de Bolsonaro pode fundamentar um pedido de impeachment.

“O vídeo presidencial, embora de caráter pessoal, pode provocar um pedido de impeachment, com base no artigo 6º da Lei 1.079/1950. O referido vídeo incita a população a “protestar contra o Congresso Nacional, cujas Casas Legislativas representam o Poder Legislativo, um dos pilares da democracia e de um Estado Republicano.”

Doutor em Direito Penal pela USP, Conrado Gontijo vê um ataque à democracia. “A manifestação de apoio do presidente Bolsonaro a um ato político contra o Congresso é um escândalo, um grave atentado à democracia. Se efetivamente ele manifestou apoio a esse tal movimento, em minha visão, praticou crime de responsabilidade e deve ser alvo de processo de impeachment.”

Maristela Basso, também da USP, diz que o presidente infringiu o decoro do cargo que ocupa. “(Bolsonaro) ultrapassou todos os limites que seu cargo exige: correção, bom senso, honradez e educação . Ademais, infringe a dignidade, a honra e o decoro que o chefe do Poder Executivo é obrigado a observar.”

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