“Não se destrói o patriarcado com fome”: Mude sua relação com a comida

Nutricionista que viralizou nas redes por bordão feminista defende alimentação intuitiva. “O corpo é um instrumento de vida, não ornamento”, contesta.

Mulheres em luta

Quantas vezes você já direcionou todos os seus esforços para a sua dieta ou para a busca por um corpo ideal? Quantas vezes você já tentou seguir uma dieta específica durante o dia e, à noite, se descontrolou e comeu literalmente tudo que viu pela frente ― e ainda foi dormir com um sentimento terrível de culpa?

Estes são sentimentos muito mais comuns do que você imagina ― e se você já passou ou está passando por isso, saiba que você não está sozinho.

A sociedade sempre teve um padrão de beleza e isso recai, sobretudo, em mulheres, que desde muito novas aprendem a seguir um turbilhão de regras relacionadas ao corpo, ao comportamento e à beleza.

E, com toda a certeza, no topo destas regras, está ter um corpo magro.

A partir daí, muitas mulheres e meninas, mas também homens e meninos, tentam de tudo: seguem dietas restritivas, ficam horas e horas sem comer, se alimentam de sucos, sopas ou shakes e machucam os seus corpos em tratamentos estéticos ou fazendo esportes muito além da conta.

Mas, já pararam para pensar que o nosso corpo é um instrumento, e não o nosso “objetivo de vida”?

A sociedade sempre teve um padrão de beleza e isso recai, sobretudo, em mulheres, que desde muito novas aprendem a seguir um turbilhão de regras relacionadas ao corpo, ao comportamento e à beleza.

A questão é que, muitas vezes, buscamos tanto o imaginário em que somos expostos que nos esquecemos do que realmente somos: meros humanos, que temos um corpo para continuar vivendo bem e por muitos anos, e não para ser um troféu.

“As pessoas estão tão preocupadas em ter um corpo diferente, e fazem o que for necessário. Elas ficam estressas e pensam o tempo todo em comida, pensamento obsessivo mesmo. Elas não conseguem pensar em outras coisas importantes, nem têm tempo e energia para isso”, disse a nutricionista Fernanda Imamura, especialista na área de transtornos alimentares.

Imamura defende a tal da alimentação intuitiva, que é uma linha da nutrição moderna que combate a ditadura da dieta e quer resgatar a conexão entre a mente e o corpo.

“A alimentação intuitiva quer empoderar a pessoa sobre suas escolhas alimentares. A pessoa se tornar uma especialista em seu próprio corpo, em vez de seguir uma dieta externa. Ela confia na sua habilidade de reconhecer a fome, suas emoções e mantém uma sintonia com ela mesma”, diz.

Todo o ser humano nasce com um “reloginho” interno que sabe exatamente quando é hora de comer e quanto está satisfeito. Um bebê, por exemplo, ele chora quando está com fome e deixa de mamar quando está saciado.

Porém, ao longo da vida, nos forçamos a seguir regras externas (“comer a cada 3 horas, ok?”) que bagunçam esse relógio interno. Quando fazemos dieta restritiva, então, a situação pode piorar porque uma das consequências dela é o pensamento obsessivo com a… Comida!

Se você já fez dieta, provavelmente já ficou arquitetando o que comeria a cada 3 horas, ou ficou sonhando com o mousse de chocolate que teve de recusar ou, ainda, ficou só esperando pelo aclamado “dia do lixo”. Estes são pensamentos saudáveis?

“Você se desconecta com o seu corpo, impondo um monte de regras. Elas geram ansiedade em relação à comida, além de culpa e privações que podem se desenvolver como compulsões alimentares. Eu oriento a não seguir dietas”, explica Fernanda Imamura.

Por outro lado, o comer de forma intuitiva tenta resgatar esta conexão perdida.

‘Não se destrói o patriarcado com fome’

Além de resgatar o reloginho interno, outro pilar da alimentação intuitiva é respeitar o próprio corpo. Como escrevi anteriormente, seguir dietas repetidamente não só estraga a sua relação com a comida, mas também com o próprio corpo.

“Tentamos mostrar que não é preciso ficar fazendo de tudo para buscar um corpo diferente. Existe toda uma cobrança de padrões estéticos que fazem com que você não enxergue o corpo atual, só os defeitos”, disse Fernanda, que ressalta que este movimento não é uma “permissão” para se comer tudo a todo o momento. “Não é sobre comer tudo, é sair da mentalidade de dieta, não ter o ‘proibido’ e o ‘permitido’. É respeitar os sinais de fome e se apoiar neles ao decidir quando e como comer.”

Fernanda Imamura viralizou nas redes sociais por lançar o bordão “Não se destrói o patriarcado com fome”.

Segundo a nutricionista, a ideia por trás da frase é fazer uma relação entre dietas restritivas e o patriarcado.

“Se você passa fome, não vai ter energia para fazer coisas importantes. As mulheres que fazem dieta, normalmente, passam o dia todo pensando em comida, pensando no corpo. Você não consegue sair do pensamento em torno da comida e isso aumenta a insatisfação com o próprio corpo.”

Segundo a nutricionista, é preciso mudar a visão que temos sobre o nosso corpo.

“O corpo é um instrumento de vida, não ornamento colocado em algum lugar parado. Nos alimentamos para continuar vivendo, trabalhando, dançando e fazendo coisas que nos motivam. Não é um problema querer mudar o corpo, mas não coloque isso como o centro da sua vida. Trate ele com mais respeito, como uma forma de instrumento.”

É claro que hoje em dia, ver um corpo como “só” um corpo não é fácil. Além da pressão de toda uma sociedade que marginaliza quem é “fora do padrão” (padrão para quem?), somos bombardeados a todo o momento por uma indústria que ganha muito com as nossas frustrações.

Não à toa, as grandes “influencers” de saúde e beleza ― que ajudam a ditar este tal “padrão” a ser alcançado ― têm suas próprias marcas, dietas e métodos de emagrecimento.

“Tem uma indústria de dietas que lucra muito com isso. Lucra com a insatisfação e desinformação. Mas aos pouquinhos, vejo que podemos mudar esse cenário. Muitas pessoas já estão se dando conta que dieta não funciona. Pacientes chegam ao meu consultório dizendo que já fizeram dietas e nada ajudou e nem emagreceu. É preciso trabalhar de uma maneira diferente, com uma nutrição mais gentil”, finaliza.

Fonte: Huffington Post Brasil


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