Socorro aos bancos supera em 11 vezes valor destinado aos mais pobres
Para o economista Paulo Kliass, discurso do governo em crise do Covid-19 sinaliza proteção a empresas e negligência com cidadão.
Publicado 19/03/2020 16:51 | Editado 19/03/2020 21:17
O valor destinado pelo Banco Central para socorrer os bancos brasileiros na crise da pandemia do novo coronavírus é 11% superior ao que foi anunciado à população que vive na informalidade e sem assistência social. O cálculo foi feito pelo site Monitor Mercantil.
O site destacou que o ministro da Economia, Paulo Guedes, confirmou a distribuição de cupons no valor médio de R$ 191 para a população que desistiu de procurar emprego. O pagamento será feito por três meses e totalizará uma despesa de R$ 15 bilhões.
Na mesma quarta-feira (18) do anúncio, o Banco Central informou que passará a comprar títulos soberanos do Brasil denominados em dólar (global bonds) das instituições financeiras nacionais. A operação é com compromisso de revenda. O estoque desses títulos é de US$ 31 bilhões (R$ 161 bilhões).
É a primeira vez desde 2008, época da crise financeira internacional do subprime, que o BC faz esse tipo de operação. A operação aumenta a liquidez no mercado no atual momento de crise agravado pela pandemia da Covid-19.
Em nota, o BC informou que os títulos serão comprados com desconto de 10% em relação aos preços de mercado. “A medida entra em vigor nesta data (18/3), e visa a garantir o bom funcionamento dos mercados”, informou.
Os cupons para os mais vulneráveis – os pobres, não os bancos – terão valor equivalente ao do Bolsa Família (de R$ 89 a R$ 205 por mês) e poderão ser retirados por pessoas inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal, desde que o beneficiário não receba nenhum benefício social, como o Bolsa Família e o Benefício de Prestação Continuada (BPC).
O ministro da Economia explicou que os R$ 15 bilhões virão do espaço fiscal a ser aberto no Orçamento Geral da União pelo decreto de estado de calamidade pública, que elimina a necessidade de cumprimento da meta fiscal de déficit primário de R$ 124,1 bilhões pelo governo federal neste ano.
Socorro a empresas
Na avaliação do economista Paulo Kliass, o discurso do governo quanto a medidas econômicas para mitigar os efeitos da pandemia tem ido no sentido de proteger empresas, mais do que o cidadão comum.
“O discurso oficial do governo é, nós precisamos assegurar o emprego. Só que eles não estão assegurando o emprego. Estão assegurando as empresas. Foi anunciada uma medida que autoriza as empresas a reduzirem os salários dos trabalhadores em 50%. A gente está em uma situação em que a gente precisa fazer medidas no sentido oposto. Na crise, precisa garantir primeiro as condições de vida das pessoas”, afirmou.
Kliass ressaltou que o valor a ser disponibilizado em voucher – de R$ 89 a R$205 mensais – “não garante a sobrevivência de ninguém”. “Se o Paulo Guedes soubesse o mínimo de como funciona a vida, teria vergonha de ter apresentado uma proposta como essa. No mínimo, [deveria] honrar essas pessoas com um salário mínimo”, defendeu.
Com relação à intervenção do BC para garantir a liquidez dos bancos, o economista aponta que é uma política que ignora a outra ponta – a população. “As pessoas não vão conseguir honrar seus compromissos financeiros com os bancos. Então, vamos ajudar os bancos a resolver esses problemas. Agora, onde está a política para quem não vai poder pagar suas contas?”, questiona.
Com informações do Monitor Mercantil