Governo chantageia senadores contra apoio a estados e municípios

“A medida é absolutamente indispensável para socorrer os estados e municípios, cujas receitas estão despencando por conta da forte retração da economia”

(Foto Agência Câmara)

Bastou a Câmara dos Deputados, cumprindo seu dever cívico no combate à crise do coronavírus, aprovar o substitutivo ao PLP 149/2019, para que o ministro Guedes e sua tropa de choque dos garotos de Chicago se mobilizassem para vetar a matéria caso o Senado Federal respalde a mesma proposta aprovada pelos deputados federais, numa flagrante ameaça.

A medida é absolutamente indispensável para socorrer os estados e municípios, cujas receitas estão despencando por conta da forte retração da economia, e não dispõem das condições, mesmo os mais ricos, para fazer frente às crescentes demandas decorrentes do enfrentamento da pandemia, especialmente no socorro aos segmentos econômicos, profissionais e informais mais vulneráveis e nos investimentos em insumos e equipamentos hospitalares e de prevenção do contágio.

A proposta, que prevê a recomposição das perdas de ICMS e ISS provocadas pela crise e a renegociação das dívidas com bancos públicos, foi aprovada com o voto de 431 deputados e construída por praticamente todas as lideranças partidárias da Câmara. A ajuda, que pode chegar a R$ 89 bilhões, é considerada decisiva para evitar a morte de milhares de pessoas.

Ele chamou de “irresponsabilidade” a recomposição das perdas de receita, acha excessivo o valor estimado pelos deputados e segue exigindo contrapartidas de arrocho sobre a folha de pagamento de servidores e privatizações. O projeto autoriza que os estados e municípios, para enfrentar a crise, possam também celebrar termos aditivos com o BNDES e a CEF para refinanciar operações de crédito junto a Estados, DF e municípios até o fim de 2020.

O argumento da liderança governista para orientar o voto contra a ajuda (o de que o governo não aceitava a vinculação da ajuda à queda do recolhimento do ICMS e ISS) não convenceu a grande maioria dos líderes, pois todos sabem que esse é o único dado certo que governadores e prefeitos contam para estimar a queda brutal que já está ocorrendo em suas receitas. Os governistas apenas repetiram a falácia de Guedes de que a recomposição integral das perdas seria um “cheque em branco” para estados mais ricos.

Jogo duro para liberar o dinheiro é crime!

A resistência de Guedes (e de Bolsonaro) ao auxílio aprovado pelos deputados federais a Estados e municípios é coerente com a postura que o governo vem adotando para dificultar que o apoio emergencial decorrente da crise chegue a quem mais precisa: trabalhadores informais, autônomos, pessoas de baixa renda, bem como a próprio setor produtivo, especialmente as micro, pequenas e médias empresas, ou seja, as que mais empregam e as que enfrentam as maiores dificuldades para conseguir crédito barato e rápido junto aos bancos, apesar da liquidez trilionária liberada pelo BC.

O jogo duro para não liberar o dinheiro tem um objetivo: forçar o afrouxamento das medidas de isolamento social expedidas pelos governadores, ainda, no momento, a arma mais poderosa que dispomos para enfrentar a pandemia, em razão do sucateamento do SUS, das fragilidades do sistema geral de saúde e do número baixo de testagens junto à população.

A burocracia e as exigências muitas vezes absurdas para liberar o dinheiro a quem precisa colocar comida em casa é um ato verdadeiramente criminoso. Não há outro qualificativo. O jogo é combinado. Guedes segura como pode a ajuda e Bolsonaro promove estrepolias pelas ruas de Brasília defendendo na prática o fim do isolamento, contrariando reiteradamente seu próprio Ministério da Saúde e a OMS. Enquanto isso, formam-se, todos os dias, filas enormes por todo país

O consultor de Bolsonaro na área de saúde não é Mandetta, mas sim Osmar Terra, um ex-quase ministro que só não assumiu a pasta em razão da resistência oferecida pelos militares palacianos e a cúpula do Congresso Nacional. A opinião de Terra, a quem Mandetta chamou de “Osmar Trevas”, é bem conhecida de todos. Basta recordar sua mais recente pérola: “pobre deve se preocupar com comida e não em morrer”.

Para se ter uma ideia do tamanho da sabotagem de Bolsonaro e Guedes, dos cerca de 28,8 milhões de famílias inscritas no cadastro único do governo, que corresponde a 76 milhões de pessoas, fora os cerca de 30 milhões que não estão no cadastro único, e que têm que ser socorridas imediatamente, apenas 2,7 milhões de pessoas receberam até agora – depois de quase um mês – a ajuda “emergencial” de R$ 600 aprovada.

A liberação a conta-gotas, por parte de Guedes, do dinheiro que já foi aprovado e que é emergencial para que as pessoas possam fazer a quarentena, visa forçar as pessoas a saírem de casa e expor as famílias ao risco de morte pelo vírus, uma postura verdadeiramente criminosa.

O autor é jornalista e membro do Comitê Central do PCdoB

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