Memorial da Anistia não tem irregularidade, conclui Procuradoria em MG

Depois de três anos de investigações em torno de 11 acusados da UFMG, inquérito aberto pela Polícia Federal é arquivado

Aloísio Morais

A Polícia Federal  deu com os burros n’água em Minas após passar três anos tentando incriminar 11 pessoas por supostas irregularidades e desvios em torno do projeto de construção do Memorial da Anistia Política do Brasil, a ser instalado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em Belo Horizonte. O inquérito aberto em 2017 acaba de ser arquivado pela Procuradoria da República em Minas, após acusações infundadas, absurdas conduções coercitivas e mandados de buscas e apreensões logo após o golpe contra a presidente Dilma, que incentivou a instalação da obra.   

A investigação da atabalhoada Operação Esperança Equilibrista chegou a apontar 22 suspeitas de irregularidades na execução do projeto do Memorial, em construção em anexo do antigo prédio da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas (Fafich), no bairro Santo Antônio, com a reforma do imóvel e execução de uma exposição contínua.

Sem revelas de onde partira a denúncia, a Polícia Federal alegava que na obra foram desviados R$ 4 milhões. Em dezembro de 2017, o reitor da UFMG, Jaime Ramirez, professores e membros da instituição foram conduzidos coercitivamente pela PF para prestar depoimento, provocando protestos e mobilização de várias entidades.

Em setembro de 2019, a Polícia Federal concluiu uma parte do inquérito insistindo na acusação de que houve fraudes relacionadas à exposição que seria implementada no Memorial. Segundo ela, “foi possível constatar fortes indícios da prática de crimes de associação criminosa, uso de documentos ideologicamente falsos, desvio de verba pública, concussão, estelionato e prevaricação. As provas reunidas no inquérito policial demonstram tentativas de esconder o descontrole e o desvio dos gastos por meio de prestação de contas com dados falsos”, concluíam os investigadores, chegando a indiciar 11 pessoas.

Falta de provas

Porém, agora, no último dia 17 de junho, o procurador Patrick Salgado Martins, responsável pelo caso, decidiu arquivar os inquéritos por falta de provas e por não encontrar indícios de improbidade administrativa. A Procuradoria da República em Minas considerou as justificativas apresentadas pela UFMG e a conclusão do Tribunal de Contas da União sobre as verbas como suficientes para indicar que não se confirmaram os ilícitos apontados pela Polícia Federal.

Segundo o Ministério Público Federal em Minas, as investigações coletadas pela Polícia Federal, juntamente com os documentos da própria instituição e do Tribunal de Contas, revelam “ausência de fundamento para propositura de qualquer medida judicial ou mesmo continuidade das investigações por ausência de linha investigativa idônea”.

A Procuradoria destacou ainda a fundamentação legal do contrato firmado pela Universidade, por meio da FUNDEP, para a construção do Memorial da Anistia Política no Brasil, não havendo “eventual prejuízo ao erário ou enriquecimento ilícito” dos membros da instituição.

O MPF de Minas cruzou as justificativas dadas pela instituição, os documentos levantados e todas as informações entregues pelo Tribunal de Contas, desmentindo, ponto a ponto, as acusações feitas pelos policiais no inquérito do ano passado. “Não se demonstrou efetivo desvio, nem que algum dos responsáveis pela gestão do projeto na UFMG tivesse atuado deliberadamente para dilapidar os cofres públicos”, destacou.

Arquivamento

A Controladoria Geral da União (CGU) chegou a instaurar um procedimento administrativo disciplinar para apurar eventuais ilícitos de funcionários da UFMG. A conclusão da CGU, com base no inquérito da PF, foi a responsabilização de alguns dos servidores. Mas o MPF ressaltou que os fatos apontados também pela CGU “não encontram respaldo probatório suficiente ou carecem do elemento subjetivo” neste sentido. Diante disso, “sem a correspondente comprovação da improbidade administrativa e não restando novas diligências”, a Procuradoria de MG arquivou a investigação.

Obras inacabadas

O prédio destinado a preservar a história política do período da ditadura e homenagear os perseguidos pelo regime está com obras inacabadas desde 2016. Em agosto do ano passado a ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves, chegou a anunciar que a reforma do prédio não seria mais concluída, chegando a cogitar outro destino para o imóvel, onde já funcionaram o Colégio de Aplicação e o Teatro Universitário. Mas um mês depois, em setembro, o Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública pedindo que o Governo Federal adotasse medidas necessárias para que as obras fossem retomadas em até 90 dias.

Já foram gastos quase R$ 7 milhões apenas com a pesquisa de material museográfico do projeto. “Um investimento que a União pretende simplesmente ignorar, exercendo suposto juízo tardio e inoportuno de conveniência e oportunidade, contrário ao interesse público e ao princípio da eficiência, previsto na Constituição Federal”, observou o MPF.

Para o órgão, o impasse para a finalização das obras do Memorial “compromete não apenas o patrimônio público já investido, mas também a credibilidade internacional do país diante do compromisso internacionalmente assumido em sua defesa perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos”.

Agora, o caso segue tramitando no Tribunal Regional Federal da 1ª Região. No dia 3 de junho, a Justiça havia determinado uma reunião de conciliação entre o MPF e a União mas, por enquanto não há nada definido. Traumatizadas com o caso, as pessoas acusadas irresponsavelmente pela Polícia Federal preferem nada comentar a respeito até que, definitivamente, seja colocada uma pedra sobre o episódio.

Foto de William Meira/Divulgação