Mulher agredida: Violência policial é regra, não exceção, diz advogado

“O governo trata como ‘meros excessos’ e ‘casos isolados’, mas esses casos se repetem diariamente”, afirma Ariel de Castro Alves, especialista em direitos humanos e segurança pública, sobre agressão em São Paulo.

Policial pisa no pescoço de mulher negra de 51 anos: "Quanto mais eu me debatia, mais ele apertava" - Reprodução/TV

As cenas chocantes que foram ao ar no programa “Fantástico”, da TV Globo, no domingo (12), de um policial militar pisando no pescoço de uma mulher negra de 51 anos em Parelheiros, zona sul de São Paulo, são rotina e não exceção. A avaliação é do advogado Ariel de Castro Alves, especialista em direitos humanos e segurança pública e membro do Conselho Estadual de Direitos Humanos (Condepe) de São Paulo. De acordo com Ariel, não se trata de um caso isolado.

“O governo de São Paulo trata como ‘meros excessos’ e ‘casos isolados’, mas esses casos se repetem diariamente. O governador João Doria [do PSDB] desde a campanha estimulou a violência policial, afirmando que a polícia estaria autorizada a matar suspeitos e que contrataria os melhores advogados para a defesa dos policiais acusados de excessos. Está aí o resultado”, comenta.

O vídeo mostra os policiais militares abordando um grupo de pessoas em uma tarde de sábado, no dia 30 de maio. Na ocasião os bares e restaurantes estavam proibidos de abrir na capital paulista. A comerciante estava com estabelecimento aberto, um cliente parou o carro com o som alto na frente do bar, o que incomodou a vizinhança que acionou a polícia.

A mulher, que deu entrevista sem se identificar por temer retaliações, conta que pediu que o motorista abaixasse o som e, quando saiu, viu uma viatura parada e um policial agredindo seu amigo. “Eu pedi para o policial pra parar e ele me empurrou na grade do bar, me deu três socos, me deu uma rasteira para me derrubar, ele quebrou minha tíbia”. Os vídeos não mostram essa parte da ação, apenas o momento seguinte.

“Ele ficou pisando no meu pescoço com meu rosto encostado no chão. Quanto mais eu me debatia, mais ele apertava a botina”, disse a vítima. A cena é mais aterrorizante ainda por lembrar o episódio de 25 de maio com George Floyd, um homem negro norte-americano que morreu após o policial branco Derek Chauvin pressionar o joelho contra seu pescoço por oito minutos e quarenta e seis segundos. A morte de Floyd gerou uma onda de protestos, impulsionando o movimento Black Lives Matter.

Após o PM pisar em seu pescoço, a mulher é arrastada algemada pelo asfalto até a calçada. Ela conta que desmaiou quatro vezes durante a ação. No boletim de ocorrência registrada pelos PMs na delegacia, eles dizem que a mulher usou uma barra de ferro para agredi-los na cabeça e os ameaçou com um rodo. Ela nega.

Após a exibição das cenas no programa global, o governador João Doria se manifestou no Twitter dizendo que os policiais foram afastados e que as imagens causam “repulsa”. “Os policiais militares que agrediram uma mulher em Parelheiros, na Capital de SP, já foram afastados e responderão a inquérito. As cenas exibidas no Fantástico causam repulsa. Inaceitável a conduta de violência desnecessária de alguns policiais. Não honram a qualidade da PM de SP”, escreveu o governador.

Ariel de Castro, no entanto, destaca a falta de efetividade desse tipo de investigação, conduzida pela própria corporação. “O corporativismo prevalece nas investigações policiais, feitas pelos próprios colegas dos agressores, com a omissão do Ministério Público e do Judiciário”, afirma.

O advogado ressalta que nesta segunda-feira (13) a Justiça Militar de São Paulo (JMESP) decidiu libertar oito policiais militares presos acusados de espancar um homem em Jaçanã, na zona norte. A decisão, ainda não publicada, foi confirmada pela assessoria de imprensa do órgão, segundo o Portal Metrópoles.

Em junho, os militares agrediram a vítima, um jovem de 27 anos, com chutes, socos e tapas. O caso foi registrado por câmeras de segurança. “As imagens de tortura eram patentes e chocantes. Mas a impunidade sempre prevalece. Esse caso de tortura e tentativa de homicídio contra a mulher, infelizmente, será só mais um caso”, aposta Ariel. Segundo ele, a violência policial é uma política de Estado. O advogado destaca que esse tipo de violência se intensificou no governo Bolsonaro.

“Vemos uma escalada de violência policial, impulsionada pelos discursos e projetos do presidente Jair Bolsonaro, que propôs a ampliação das chamadas excludentes de ilicitudes para favorecer policiais que cometem abusos e assassinatos. A proposta do ex ministro da Justiça Sérgio Moro e do Bolsonaro, incluíam o medo, surpresa e violenta emoção, como situações de legítima defesa, para que policiais justificassem os abusos e assassinatos. Ao menos, o Congresso Nacional rechaçou [a ampliação do excludente de ilicitude] no pacote anticrime no ano passado”, comenta. Ariel afirma que casos como esses reforçam que a desmilitarização da polícia é “necessária e urgente”.

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Um comentario para "Mulher agredida: Violência policial é regra, não exceção, diz advogado"

  1. Jhonata Xavier disse:

    Sou soldado da PMMG, já tive que pisar para imobilizar elementos que resistiram à prisão. Em alguns casos, o suspeito pode oferecer resistência e acabar ferindo a si mesmo, o policial e até terceiros. Por isso acabamos tendo que tomar atitudes brutas, como pisar para imobilizar, para evitar vítimas. Mas não é nosso dever punir, e sim de levar os criminosos à Justiça. Mas concordo que esse agente abusou da autoridade e excedeu os limites.

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