Vale terá de indenizar trabalhador que fugiu da lama pela mata

Mineradora terá de pagar R$ 75.809,00 por danos morais a sobrevivente do rompimento da Barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho

Foto de Aloísio Morais



A mineradora Vale S.A. terá que pagar R$ 75.809,00 de indenização por danos morais a um trabalhador que sobreviveu no rompimento da Barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho, na Grande Belo Horizonte, ao escapar da lama fugindo por uma mata. A decisão é da juíza Renata Lopes Vale, na 5ª Vara do Trabalho de Betim, ao reconhecer “que o empregado foi exposto a situação de extremo perigo, com possibilidade de morte iminente, além de ver destruído o local de trabalho, com falecimento de colegas de trabalho no acidente”. O crime completou ontem, 25, um ano e sete meses e deixou um saldo de 259 pessoas mortas e 11 ainda desaparecidas.

Testemunha ouvida no processo contou que trabalhou com o reclamante no dia do rompimento. Ele prestava serviço no setor de armazenamento de materiais elétricos, que ficava no segundo prédio próximo ao restaurante e ficou coberto pelos rejeitos. A testemunha relatou que só não foi atingida porque saiu correndo. Explicou ainda que viu também o trabalhador fugindo pela mata, por um caminho de aproximadamente 500 metros, até o local onde ele se encontrava.

O depoimento foi confirmado por outra testemunha. Conforme relatou, ela estava do lado de fora do restaurante com o colega autor da ação, quando escutaram um barulho de explosão. Eles viram um “poeirão” e saíram correndo pela mata em direção à subestação, que ficava em um local mais alto.

Riscos

Ao avaliar o caso, a juíza Renata Lopes Vale ressaltou que a atividade da empregadora é disciplinada pela Norma Regulamentadora nº 22, do antigo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), que explicita os principais riscos relacionados à mineração. E que “a simples leitura do regulamento deixa claro que os riscos produzidos pelas atividades de mineração são muito mais acentuados do que a média das demais atividades econômicas, o que justifica a gradação do risco em nível tão elevado”.

Para a magistrada, a empresa não agiu de forma a prevenir as mais graves consequências do rompimento da barragem. Ela ressaltou que a construção e manutenção das unidades utilizadas pelos trabalhadores, em área extremamente vulnerável, violaram frontalmente a Norma Regulamentadora nº 24, também do MTE. Pelo item 24.3.13 do regulamento, “o refeitório deverá ser instalado em local apropriado, não se comunicando diretamente com os locais de trabalho, instalações sanitárias e locais insalubres ou perigosos”.

Outro problema apontado pela juíza refere-se ao fato de que os treinamentos ministrados pela Vale não auxiliaram os empregados durante o rompimento da barragem. Testemunha informou que, se tivesse seguido as rotas de fuga e pontos de encontro repassados no treinamento, teria sido atingido pela lama.

Com relação ao dano, a juíza pontuou que ele decorre diretamente da queda da barragem, quando presente o autor da ação no local de trabalho. Segundo a julgadora, mesmo não tendo sofrido danos físicos advindos diretamente do rompimento, a situação acarretou tristeza e sofrimento moral. “Problemas a que ele não teria se submetido sem o acidente, constatado, assim, o dano e o nexo de causalidade com o sinistro ocorrido na Vale S.A.”.

Diante dos fatos narrados, a juíza condenou a empresa ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 100 mil, conforme pleiteado. A Vale S.A. ajuizou recurso e a Segunda Turma do TRT-MG deu provimento parcial, reduzindo o valor da indenização para R$ 75.809,00, ao observar os critérios previstos no artigo 223-G CLT.

Prorrogado prazo para acordo

O juízo da 5ª Vara do Trabalho de Betim homologou termo aditivo a acordo firmado com a Vale S.A. para adesão de familiares de trabalhadores falecidos no rompimento da Barragem Córrego do Feijão, em Brumadinho, da mineradora, em 25 de janeiro de 2019.

Os interessados em aderir ao acordo, por habilitação individual, têm agora até 15 de julho de 2021.  O termo aditivo foi firmado em audiência virtual,  presidida pelo juiz Henrique Alves Vilela, no último dia 20, entre representantes dos autores da ação civil pública, procuradores do Ministério Público do Trabalho (MPT), sindicatos,  Defensoria Pública da União e a mineradora Vale S.A., para aderir, por habilitação individual.

acordo foi homologado pela Justiça do Trabalho em 15 de julho de 2019, e prevê pagamento de indenizações por danos morais e materiais, além de outros benefícios, incluindo, para os trabalhadores sobreviventes, a estabilidade no emprego por três anos.

O termo aditivo foi firmado para oferecer aos familiares dos trabalhadores falecidos no acidente maior prazo para reflexão sobre a decisão de aderir ao acordo.

Retomada das buscas

O Corpo de Bombeiros vai retomar amanhã, 27, as buscas pelas 11 pessoas que ainda estão desaparecidas após o rompimento da barragem da mina de Córrego do Feijão, em Brumadinho. A previsão é de que os trabalhos sejam executados em seis frentes. As buscas ficaram suspensas por cerca de cinco meses, devido à pandemia do coronavírus.

De acordo com a corporação, as seis áreas que serão priorizadas nos trabalhos foram escolhidas a partir de um estudo matemático de probabilidades, que indica onde há maiores chances de corpos e segmentos corpóreos serem encontrados. Antes da pandemia, 45 militares atuavam nas áreas de buscas, e, agora, 60 participarão dos trabalhos.



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