Aumento no valor dos livros prejudicará nova geração de leitores

Para Plinio Martins Filho, possível aumento proposto por reforma tributária vai interferir no funcionamento das livrarias, principalmente nas pequenas editoras

Movimentação de público durante a 65ª edição da Feira do Livro de Porto Alegre, Foto: Joel Vargas / PMPA

Apesar dos efeitos causados pela pandemia terem tido grande impacto no setor cultural, algumas áreas conseguiram se reinventar após um baque inicial. As livrarias, por exemplo, conseguiram um aumento no faturamento entre junho e julho deste ano, quando comparado ao ano passado.

Mas não se engane. De fato, as livrarias tiveram um aumento nas vendas digitais, mas com quase sua totalidade fechada devido ao coronavírus, as livrarias estão operando abaixo do ideal. Plinio Martins Filho, professor do Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP e ex-presidente da Editora da Universidade de São Paulo (Edusp) diz que as editoras e livrarias tiveram que se reinventar durante a pandemia.

“Todas elas aumentaram e, às vezes, até dobraram o serviço de atender direto ao cliente, mas isso não supera o faturamento. Quer dizer, todas estão operando bem abaixo do que operavam. Você não pode suprimir as livrarias, elas são fundamentais para o mercado”, comenta ele, informando que 70% do faturamento vem das lojas físicas e 30% das vendas virtuais.

Ele diz que o preço do livro é a somatória de várias etapas de sua produção, como a revisão, composição, revisão de provas, papel, impressão, divulgação e administração da editora. Os custos são divididos pela tiragem em que o editor ganha na tiragem alta do livro. “Ninguém ganha nada com mil exemplares de um livro acadêmico, por exemplo”, diz ele.

Plínio considera que programas governamentais de estímulo à leitura não devem doar o livro, mas o recurso para a compra do livro. Ele considera importante que o leitor escolha o livro que vai ler. “E se acrescentar na cesta básica um livro? Ótimo, desde que seja o leitor que escolheu. Isso é democracia da leitura”, acrescenta. Ele diz que o governo federal chegou a criar um cartão livro, mas a burocracia era tão grande que “não vingou”.

Além da questão de vendas, recentemente, o setor de livrarias ficou em evidência, quando Paulo Guedes, atual ministro da Economia, comentou que os livros poderiam ter seus preços aumentados na reforma tributária pretendida pelo governo. Para o professor, o erro primário parte do pressuposto de quem acredita que só os ricos compram livros e que, para os mais pobres, devem existir doações.

Plínio diz que a proposta de doações também envolve a dubiedade sobre que livros vão comprar e de quem vão comprar. “No geral, é uma lei que não trará nenhum benefício e que foi feita por alguém que não gosta de livros, nunca leu um livro e tem raiva de quem lê”, disse.

“Se você aumenta esse imposto, o papel vai aumentar, e o preço final do livro também vai aumentar. Qualquer aumento de imposto que tem no livro vai interferir, principalmente, para as editoras pequenas”, comenta o professor.

Ele ainda defende que as livrarias deveriam ser um bem cultural, sendo convertidas em pontos culturais, estimuladas pelo governo. Uma sugestão é que o imposto predial seja isento para livrarias, o que estimularia o surgimento de novas livrarias em municípios onde elas nem existem. No entanto, as políticas públicas funcionam no sentido da livraria passar o ponto para um boteco.

Com o aumento, a busca para criar um hábito de leitura no Brasil vai ser prejudicada e o incentivo para consumir mais livros também vai se perder, não gerando novos leitores.

Edição de entrevista à Rádio USP

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