Ditador brasileiro agiu para promover golpe contra Allende no Chile

Em conversa com o então presidente dos Estados Unidos Richard Nixon no fim de 1971, o ditador-presidente brasileiro disse que Salvador Allende seria deposto pelos mesmos motivos que João Goulart foi deposto no Brasil.

Segundo afirma o pesquisador Peter Kornbluh em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, os registros da conversa, obtidos pelo Arquivo de Segurança Nacional dos Estados Unidos, mostram Nixon oferecendo recursos ao Brasil, defendendo que os dois países tentem “prevenir novos Allendes e Castros (Fidel Castro)” e revelam um papel até então pouco conhecido da ditadura brasileira interferindo na política interna de outros países.

“A narrativa tradicional de intervenção e guerra secreta na América Latina se concentra nos EUA e na CIA, mas operações militares secretas foram realizadas em nome do povo brasileiro sem o seu conhecimento”, disse Peter Kornbluh. O regime militar brasileiro, agindo de forma independente dos Estados Unidos, mas por motivos semelhantes, secretamente interveio nos assuntos políticos do Chile para promover um golpe contra o governo democraticamente eleito de Allende.

Nixon perguntou se o ditador achava que as Forças Armadas chilenas eram capazes de derrubar Allende. Médici respondeu que sim, acrescentando que o Brasil estava trocando agentes com os chilenos, e deixou claro que o Brasil estava trabalhando para esse fim. “Não sabemos os detalhes dos contatos do Brasil e do apoio aos militares chilenos, à medida que a conspiração contra Allende avançava. Ainda não obtivemos nenhuma comunicação secreta entre Henry Kissinger e o ministro das Relações Exteriores, Gibson Barbosa, ou o coronel Manso Netto, que Nixon e Médici designaram como representantes para as mensagens entre os dois sobre questões muito secretas, como a conspiração de golpe no Chile”, declarou Peter Kornbluh.

Segundo ele, não se sabe se a oferta de Nixon para fornecer recursos secretos e outras formas de assistência para o esforço do Brasil para fomentar um golpe no Chile foi aceita e até que ponto a inteligência militar brasileira e os agentes da inteligência dos Estados Unidos coordenaram suas ações. Documentos relacionados a essa história permanecem segredos de Estado.

Peter Kornbluh afirma também que há muito mais a saber sobre o papel intervencionista do Brasil na região durante a ditadura militar. “Além do Chile, há a intervenção no Uruguai, na Bolívia e seu papel nas sinistras e assassinas operações transfronteiriças do Plano Condor”, afirmou. “A narrativa de intervenção hegemônica e guerra secreta na América Latina tem se concentrado nos Estados Unidos e na CIA. Mas sem um registro completo do exercício hegemônico de poder pelo Brasil no Cone Sul, essa história permanecerá incompleta. O acesso aos arquivos de inteligência brasileiros é fundamental. É uma história que permanece não contada”, relata.