Chacina da Lapa, o último grande crime da ditadura militar

Este dia, 16 de dezembro marca os 44 anos da tentativa da ditadura de, criminosamente, esmagar o PCdoB. Não deu certo.

A forte presença de policiais e soldados do Exército, com armas pesadas, cercando a casa de n º 767 da rua Pio XI, no alto da Lapa, em São Paulo, causou inquietação nos trabalhadores que, por volta das 6 horas da manhã daquela quinta-feira, 16 de dezembro de 1976, saiam para seus afazeres.

Como se soube depois, o Exército e os policiais estavam ali para cometer um dos mais sangrentos e maiores crimes políticos da ditadura militar, crime registrado na história com a designação de Chacina da Lapa.

A operação que culminou naquela ação criminosa e assassina foi iniciada no DOI-Codi do I Exército, no Rio de Janeiro.

A repressão, através do DOI-Codi, de equipes do I e do II Exército e do DOPS, utilizou grande e sigiloso aparato para atingir e tentar destruir a direção do Partido Comunista do Brasil. Trabalhou durante a noite toda e, quando recebeu a notícia de que a última prisão ocorrera, a tropa cercava a casa na rua Pio XI, liberou o tiroteio contra os que ali estavam, que durou quase vinte minutos.

Foi um dos piores crimes da ditadura militar: o assassinato a tiros de Ângelo Arroio e Pedro Pomar; sob brutais torturas, a morte de João Batista Drummond; e a prisão e tortura de Aldo Arantes, Elza Monnerat, Haroldo Lima, Joaquim Celso de Lima, Maria Trindade e Wladimir Pomar.

Os corpos de Pedro Pomar e Ângelo Arroyo, trucidados pelo ação terrorista da ditadura

O objetivo era riscar do mapa o partido que havia dirigido, desde o final da década de 1960, a Guerrilha do Araguaia, que foi a principal ação armada de resistência contra a ditadura militar.

A reunião do Comitê Central ocorreu nos dias 14 e 15. Fora convocada para avaliar a Guerrilha do Araguaia e teve a participação de nove membros da direção nacional do PCdoB: além dos já citados (que foram assassinados ou presos) lá estavam Jover Teles e José Novaes, além dos militantes que operavam no trabalho de infraestrutura e segurança (Joaquim Celso de Lima e Maria Trindade).

A ação da repressão foi possível porque Manoel Jover Telles (que fazia parte do Comitê Central) traiu o Partido e os companheiros e informou à repressão o dia e o local da reunião. Ele havia sido preso em meados de 1976, negociou com os órgãos da repressão política e forneceu informações que possibilitaram o massacre. Traiu por 150 mil cruzeiros (moeda nacional à época), entregues à filha dele, em Porto Alegre, disse mais tarde, em uma entrevista, o general Leônidas Pires Gonçalves, que foi um dos comandantes da ação criminosa – ação que teve a concordância direta do então ocupante da presidência da República, o general Ernesto Geisel.

Na época, devido à dura clandestinidade, as reuniões do Comitê Central ocorriam sempre sob rigorosas medidas de segurança que, para sua preservação, nunca se reunia completo, e uma parte dos dirigentes não participava. O objetivo da sangrenta repressão era dizimar a direção do PCdoB. Particularmente pretendia assassinar João Amazonas, o principal dirigente do Partido.

Mas não conseguiu alcançar esse objetivo. Mais tarde o general Dilermando Monteiro, também no comando da ação criminosa, reconheceu, numa entrevista, que o objetivo era assassinar João Amazonas; o outro era destruir o PCdoB. Não conseguiram nem uma coisa nem outra.

No caso do assassinato dos dirigentes do PCdoB e da tortura aos que foram presos, Dilermando seguiu as instruções de Geisel, como contou na entrevista à revista IstoÉ: “Aquilo foi acompanhado por mais de cinco meses de antecedência. Nós descobrimos que naquele dia iria haver uma reunião em tal lugar, com a presença de tais e tais elementos, e aí fomos um pouco embromados, porque constava para nós que o João Amazonas estaria presente e o mesmo estava na Albânia”. Ele confessou aqui, cinicamente, a pretensão de assassinar o histórico dirigente partidário.

A versão de Dilermando foi confirmada por Geisel: “Sempre se procurou acompanhar e conhecer o que o Partido [Comunista do Brasil] fazia, qual era a sua ação, como ele se conduzia, o que estava produzindo, qual era seu grau de periculosidade. Isso aconteceu durante todo o período revolucionário”. E Geisel prosseguiu: “o Dilermando, já no comando do II Exército, atuou em São Paulo sobre uma grande reunião dos chefes comunistas. A questão não era mais a força que eles tinham, mas não podíamos deixar o comunismo recrudescer. Fizemos tudo para evitar um recrudescimento das ações comunistas.”

A Chacina da Lapa foi um duro golpe para o Partido, mas a ditadura militar não conseguiu seu objetivo principal que era destruí-lo. As organizações partidárias mantiveram seu funcionamento e o PCdoB continuou intervindo no movimento de massas e com intensa ação política.

Referências

Bercht, Verônica. Coração vermelho – A vida de Elza Monnerat. São Paulo, Editora Anita Garibaldi/Fundação Maurício Grabois, 2013

D’Araujo, Maria Celina, e Castro, Celso. Ernesto Geisel. Rio de Janeiro, Editora FGV, 1997

Pomar, Pedro. Massacre na Lapa, como o Exército liquidou o Comitê Central do PCdoB. São Paulo, Editora Busca Vida, 1987

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Um comentario para "Chacina da Lapa, o último grande crime da ditadura militar"

  1. Darcy Brasil disse:

    Penso que o próprio imperialismo descobriu, face os fracassos das diversas ditaduras na America Latina, que a melhor maneira de destruir um partido comunista não é pela via do assassinato de seus membros, como acredita e defende o fascista abjeto, Jair Bolsonaro, mas pela corrupção de sua unidade politico ideológica, pela substituição da ideologia socialista, proletária, por elementos da ideologia burguesa. A ameaça à existencia de um partido comunista não é menor nos períodos de legalidade, de convivência com regras minimamente democráticas, do que nos períodos de repressão política violenta. Com o assassinato de um dirigente revolucionário como Pedro Pomar, mata-se seu corpo biológico, sua existência física, perde-se o valor de sua experiência, causando um certo retardamento no desenvolvimento da atividade partidária, mas não seus ensinamentos,suas ideias revolucionárias, que seguem vivas no coração e nas mentes de seus camaradas. Mas, com a corrupção da consciência socialista, revolucionária, preserva-se o corpo biológico dos membros do partido, destruindo-se sua consciência socialista, revolucionária, suas ações em defesa dos interesses dos trabalhadores e do povo, em defesa da conquista do poder visando à edificação de uma sociedade socialista,colocando-o a serviço da divulgação e da hegemonia da ideologia burguesa. Todos os que são capazes de experimentar um profundo sentimento de revolta pela covardia do Exército brasileiro ao participar da ação vergonhosa, infame, que se conhece como “Chacina da Lapa”, são dotados de espírito revolucionário, os que lamentam (quando lamentam) o fato apenas por serem humanistas, sendo inapazes de sentir a dor dos que perderam entes queridos, porque se reconhecem nos ideais que defendiam e na luta em que arriscaram e perderam suas vidas, são apenas liberais pequeno-burgueses, motivados por ideais de qualidade inferior ou duvidosa. Vivo a me perguntar nesses tempos de ameaças de golpe fascista: quantos revolucionários comunistas, como João Amazonas, Pedro Pomar, Angelo Arroio etc, ainda existem no Brasil? Havia mais comunistas nos tempos da repressão ou em nossos dias de eleições viciadas, fortemente limitadas pelos mecanismos de funcionamento da democracia de fachada burguesa? Vivam os mártires revolucionários chacinados na Lapa em 1976!

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