Deputada negacionista pode assumir comissão mais importante da Câmara

Sem reviravoltas à vista, Câmara deve confirmar Bia Kicis na presidência da CCJ. Deputada defende cloroquina, é autora de projeto que desobriga o uso de máscaras contra o vírus e é investigada em inquérito no STF

Depois da intensa agitação contra a indicação de seu nome, um mês atrás, tudo indica que a deputada federal Bia Kicis (PSL-DF) será confirmada na semana que vem como presidenta da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados, a mais importante da Casa. Quando seu partido apresentou a bolsonarista para o cargo, parlamentares da oposição manifestaram intensa indignação. Muitos chegaram a afirmar ser “quase impossível ela assumir”, como fez a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ).

“Ela é contra a Constituição, a favor de fechar o STF, acha que a força mediadora do país são as Forças Armadas, é contra a vacina, contra máscara e amiga do vírus”, disse Jandira. Além do movimento de lideranças de bancada contra ela, Jandira lembra que o nome da deputada é rejeitado inclusive no Supremo Tribunal Federal. Ela participou e incentivou protestos antidemocráticos contra instituições da República e é acusada de disseminar fake news.

No entanto, pelas regras, a presidência da comissão cabe ao bloco vencedor nas eleições que levaram Arthur Lira (PP-AL) ao comando da Câmara. Desse grupo, o PSL, partido de maior bancada, tem a prerrogativa política da indicação.

Rejeitada até por alas dissidentes do PSL, seu partido, e por deputados da base do governo de Jair Bolsonaro, Bia Kicis esperou a poeira baixar para reduzir a rejeição a seu nome. Tem silenciado desde a prisão de Daniel Silveira (PSL-RJ) pelas mesmas práticas que ela tem cometido.

O deputado Lafayette Andrada (Republicanos-MG) desistiu de concorrer e o PSL decidiu, internamente, unir as alas mais bolsonaristas às dissidentes, evitando a divisão em torno de “um bem maior”. A eleição, que era prevista para esta semana, foi adiada para a próxima, provavelmente terça-feira (9).

Interesses corporativos e privados

Bia Kicis tem o apoio da Associação Nacional dos Procuradores dos Estados e do Distrito Federal. Hoje aposentada, a deputada do PSL foi procuradora-geral adjunta, procuradora-corregedora e chefe da Assessoria Especial da Procuradoria-Geral do Distrito Federal (PGDF). “A Anape acredita que a deputada exercerá um brilhante trabalho, assim como em todos os cargos que já ocupou”, afirma a entidade. Com ela na CCJ, Bolsonaro tem uma aliada forte no controle de eventuais investigações a si e sua família. Além disso, os procuradores já fazem lobby para evitar perdas na Reforma Administrativa (PEC 32/20), que tramita na CCJ.

Ontem (4), o presidente da Anape, Vicente Braga, se reuniu com o presidente da Câmara para discutir a PEC e Bia Kicis participou do encontro.

Negacionismo e fake news

A parlamentar é uma das investigadas no inquérito das fake news, do Supremo Tribunal Federal (STF), comandado pelo ministro Alexandre de Moraes. A possibilidade da deputada presidir a comissão provoca mal-estar entre os ministros da Corte. “Eu sou contra o ativismo judicial do STF”, disse Bia Kicis ao ser indicada ao cargo, há um mês, ao jornal O Estado de S. Paulo.

No final de 2020, a deputada escandalizou ao a dizer que as vacinas contra a covid-19 “podem afetar o DNA”. A deputada também recomenda o uso de remédios para prevenir o coronavírus, mesmo com a oposição da ciência e medicina. A deputada se mostra alinhada à política negacionista e de boicote ao controle da pandemia do presidente Bolsonaro.

Mais do que com palavras, a deputada tenta concretizar suas ideias por lei. Ela é autora do PL 4650/20, que desobriga o uso de máscaras, item fundamental para evitar a disseminação do vírus. A parlamentar argumenta que “não há evidências científicas para assegurar que o uso de máscara protege a população”.

Pouco antes do colapso sanitário em Manaus, esteve entre os bolsonaristas que comemoraram em redes sociais o recuo do governador do Amazonas, Wilson Lima (PSC), que havia decretado lockdown e voltou atrás.  

Na quarta-feira (3), a deputada federal Fernanda Melchionna (PSOL-RS) entrou com ação na Justiça Federal visando barrar a candidatura e eventual posse de Bia Kicis na CCJ. A parlamentar argumenta que a deputada pode defender a constitucionalidade da intervenção militar e do fechamento do Congresso e do Supremo, teses que Bia defende com paixão.

O juiz Itagiba Catta Preta Neto, da Justiça Federal de Brasília, negou conceder liminar para barrar o registro da candidatura ou eventual nomeação da deputada bolsonarista para a presidência da CCJ. Ele advertiu a deputada do PSOL por recorrer ao judiciário num tema do legislativo e defendeu o direito de Bia defender suas ideias.

Com informações da Rede Brasil Atual

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