Fundações exigem abolição da LSN e interdição de Bolsonaro

O Observatório da Democracia, formado por oito fundações de partidos progressistas, emitiu nota em que também propõe uma PEC para incluir como crime de responsabilidade as ações que atentem contra a vida. Leia a íntegra

Protesto contra a ditadura militar

O grupo Observatório da Democracia, que reúne oito fundações de partidos de oposição ao governo do presidente Jair Bolsonaro, lançou um manifesto em que pede a abolição da Lei de Segurança Nacional e o afastamento do chefe do executivo.

No documento assinado por instituições do PT, PSOL, PDT, PCdoB, PCB, Cidadania, PROS e PV, o grupo também propõe uma Proposta de Emenda à Constituição “para incluir como um dos crimes de responsabilidade previstos no art. 85 da Constituição Federal as ações que atentem contra a vida, por sabotagem ou omissão, em situações de epidemias e pandemias.”

Leia a nota abaixo:

Em defesa da Vida e da Democracia, Interditar Bolsonaro e Revogar a Lei de Segurança Nacional

Hoje, completam-se 57 anos do golpe militar que interrompeu o processo de aprofundamento da democracia liderado pelo presidente João Goulart, por meio das Reformas de Base. A partir de então e por longos 21 anos, perdurou uma ditadura que usou dos mais diferentes meios para violentar as liberdades dos brasileiros e brasileiras.

Para isso, cassou mandatos parlamentares e de governadores, fechou partidos políticos, sindicatos e a UNE, suspendeu as eleições para os governos estaduais, prefeituras das capitais e cidades rotuladas como “áreas de segurança nacional”, censurou a imprensa, interveio nos sindicatos, prendeu sindicalistas, torturou, assassinou, obrigou ao exílio importantes lideranças políticas e sociais. E tudo isso com o objetivo de “limpar o terreno” para a preservação dos privilégios dos grandes proprietários e o ingresso maciço do capital estrangeiro.
 
Pela extinção da LSN, um entulho autoritário que persiste

Mas o povo brasileiro não se dobrou. Travamos a luta contra a ditadura pelos mais distintos caminhos e, depois da memorável campanha das Diretas-Já, enterramos esse período escabroso. Por meio da Constituição de 1988, o país foi dotado do mais avançado estatuto legal da nossa história. Mas não conseguimos ainda revogar todo o entulho autoritário. É verdade que enterramos o AI-5 e a famigerada Lei de Segurança Nacional, que, em sua versão mais truculenta, foi editada pela Junta Militar em 1969. Inspirada na doutrina da contra-insurgência, elaborada na Escola Militar de West Point, nos Estados Unidos, pregava a existência do “inimigo interno”, a ser perseguido pelas Forças Armadas. O avanço da luta democrática extinguiu a velha LSN ainda durante a ditadura, em 1983, mas o regime ainda teve fôlego para impor uma nova LSN (no. 7.170/83), que, embora mais branda, mantinha resquícios autoritários de sua predecessora.
Conforme Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, ajuizada no STF pelo PT, o PCdoB e o Psol, em 25 deste mês, essa Lei abriga diversos dispositivos que violam a Constituição de 1988. Muitos deles vêm sendo hoje acionados pelo presidente Bolsonaro para criminalizar manifestações desfavoráveis a ele. O uso e abuso desses dispositivos por Bolsonaro denota seu espírito autoritário, incompatível com a liberdade de expressão e opinião garantida na nossa Carta Magna. Os partidos também questionam a competência atribuída pela Lei de Segurança Nacional à Justiça Militar e às autoridades militares para processarem e julgarem cidadãos civis em razão do suposto cometimento dos crimes previstos na LSN que não possuem enquadramento na Constituição Cidadã.

Crise humanitária e sistêmica: Bolsonaro começa a ser abandonado

Quanto mais a crise se agrava, mais o Presidente, sentindo-se acuado, recorre a instrumentos autoritários. Trata-se de uma crise de múltiplas dimensões. A crise sanitária já se transformou numa verdadeira tragédia. A pandemia ceifou a vida de mais de 300 mil pessoas. Passamos a marca de três mil mortes por dia, com tendência ascendente, e a de 100 mil novos casos. O Brasil tornou-se campeão mundial dos dois indicadores, desbancando os EUA dessa nefasta posição. Terreno fértil para o surgimento de novas variantes do Coronavírus, o Brasil é hoje o epicentro mundial da pandemia, tornando-se uma ameaça para todos os demais países. O sistema de saúde está em colapso no Brasil inteiro. Milhares de brasileiros e brasileiras acometidos pela Covid-19 se acotovelam, sem atendimento, nas portas e nos corredores dos hospitais, que estão abarrotados: não há leitos disponíveis, as UTIs estão lotadas, sem oxigênio, sem respiradores nas quantidades necessárias.

O recrudescimento da pandemia, agravado pela retirada dos estímulos monetárias e fiscais (o Congresso aprovou em 2020 pacotes emergenciais no valor de R$ 587,46 bilhões e, agora, depois de três meses sem qualquer auxílio emergencial, o governo anuncia que vai gastar nessa rubrica apenas R$ 44 bilhões) e pelo retorno da trajetória de elevação da taxa básica de juros, indica que a recessão tende a continuar. Ao mesmo tempo, a inflação, nascida nos preços dos alimentos (que nos últimos 12 meses subiram 15%) e dos combustíveis, já se espalha por outras áreas, como revelam as elevadas cifras do IGP (29% nos últimos 12 meses), sinalizando a volta do fantasma da estagflação. Nesse quadro, a crise social explode sob a pressão dúplice da carestia e do desemprego. Além dos 14 milhões abertamente desempregados, milhões de trabalhadores gostariam de trabalhar, mas não procuram emprego por causa da pandemia.

Nesse contexto, começa o distanciamento das bases de apoio do governo, acelerando a crise política. A “elite econômica” da Faria Lima, que, por meio do ministro Paulo Guedes, tem apoiado o governo Bolsonaro, em documento assinado por centenas de economistas, empresários, banqueiros e figuras conhecidas do mercado financeiro anuncia seu afastamento, exigindo um “Bom Governo”. No Congresso, o Centrão, que, com apoio de Bolsonaro, foi vitorioso há pouco tempo na eleição das duas casas, ameaça, por meio de discurso do presidente da Câmara, Arthur Lira, desembarcar do governo, ao anunciar “remédios amargos e até fatais”, em 25 deste mês.

Genocida Bolsonaro quer provocar o caos

O morticínio e a crise sistêmica (sanitária, econômica, social e política) não são decorrência natural da pandemia. Decorrem diretamente da atitude negacionista e irresponsável, movida pelo obscurantismo de Bolsonaro e seu grupo, mas também de uma sequência articulada de decisões por eles adotadas. Bolsonaro sempre foi um apologista da ditadura, inclusive de seu aspecto mais perverso, a tortura, criticando esse período apenas por sua suposta moderação na repressão. Chegou a estabelecer em 30 mil o número de mortes que seria necessário naquela época. Já no governo, manteve essa postura, ameaçando, a cada momento, ultrapassar os limites da democracia e implantar uma ditadura no país. Alimentou a crise e o morticínio, tudo indica, com o objetivo de engendrar uma situação caótica favorável a seu intento golpista. Sabotou abertamente todo o esforço de testagem massiva, distanciamento social e uso de máscara recomendado pela OMS e praticado por todos os governos responsáveis. E nem de longe cogitou adotar a vigilância epidemiológica e o rastreamento ativo para o enfrentamento mais adequado à pandemia.

Manteve essa mesma atitude em relação à vacina, instrumento mais poderoso, segundo a ciência, para combater a pandemia. Além de fazer uma verdadeira campanha contra seu uso, o governo, conscientemente, deixou de tomar as providências essenciais para o estabelecimento de parcerias com os laboratórios e deixou de contratar, na hora certa, as vacinas oferecidas por vários laboratórios. Agora, quando a tragédia se aprofunda, tem dificuldade de encontrar disponível a quantidade necessária de vacinas. Tudo indica que há método nesse desastre. Para agravar ainda mais a situação, não tomou qualquer atitude até este mês para manter os estímulos monetários e fiscais, com destaque para o auxílio emergencial, que permitiram manter a vida de 68,2 milhões de beneficiários em 2020, além de garantir o funcionamento da economia. E, agora, depois de três meses em que as famílias brasileiras estão passando enormes dificuldades, decidiu por um auxílio emergencial de apenas R$ 250 em média por família (quando o auxílio anterior era de R$ 600 por beneficiário e o custo de uma cesta básica na capital paulista é de R$ 639,47) para apenas 45,6 milhões, cerca de dois terços das pessoas que foram beneficiadas em 2020. 

Salvar vidas, interditar Bolsonaro e revogar LSN

O direito à VIDA, valor supremo de todos os seres humanos, é negado a milhares de compatriotas. O Congresso, pressionado pelos partidos de oposição, mas incorporando setores do chamado Centrão, decidiu deixar de votar qualquer projeto até equacionar o programa de vacinação. Isso significa, antes de tudo, garantir vacina para toda a população e auxilio emergencial para as populações mais vulneráveis, num valor mínimo que equivalha à cesta básica, pelo tempo que durar a pandemia.

Mas devemos também impedir que o Presidente Bolsonaro continue a alimentar esse genocídio. Consideramos que a criação da CPI da Pandemia é um instrumento poderoso para ajudar a barrar essa mortandade. Já existem 74 pedidos de impeachment na Câmara de Deputados. Existem também várias queixas crime em apreciação no Supremo Tribunal Federal e até um pedido de interdição foi formalmente apresentado recentemente. Em manifesto divulgado em 17 deste mês, as Fundações partidárias abaixo assinadas apresentaram, para apreciação do Congresso Nacional, mais um caminho alternativo: uma Proposta de Emenda Constitucional que, se aprovada, resultará na interdição de Bolsonaro. Pesquisas de opinião pública indicam que a população, majoritariamente, avalia como ruim ou péssima a atuação de Bolsonaro para enfrentar o Coronavirus.

Paralelamente, para evitar que Bolsonaro prossiga na perseguição a seus adversários políticos e na violação continuada da liberdade de opinião e expressão, urge revogar a Lei de Segurança Nacional. A essa conclusão, chegou em 2016 o ministro do STF Luís Roberto Barroso, quando, ao julgar um caso nela enquadrado, afirmou: “já passou a hora de nós superarmos a Lei de Segurança Nacional, que é de 1983, do tempo da Guerra Fria, que tem um conjunto de preceitos inclusive incompatíveis com a ordem democrática brasileira”.

Basta! Temos que unir toda a Nação em defesa da Vida.  Conclamamos a todos os democratas, todos aqueles que têm compromisso com a vida: os partidos políticos, os movimentos organizados da sociedade, os governadores, prefeitos, parlamentares, cientistas, intelectuais, trabalhadores, empresários, igrejas, estudantes, enfim, a sociedade organizada, a mobilizarem-se pela aprovação da emenda constitucional que possibilita a interdição de Bolsonaro e a revogação do entulho autoritário, que é a Lei de Segurança Nacional de 1983. Em defesa da Vida e da Democracia, o Brasil interditará o genocida Bolsonaro e revogará a Lei de Segurança Nacional!
 
São Paulo, 31 de março de 2021

Fundação Lauro Campos/Marielle Franco, PSoL
Fundação João Mangabeira, PSB
Fundação Leonel Brizola/Alberto Pasqualini, PDT
Fundação Maurício Grabois, PCdoB
Fundação Perseu Abramo, PT
Fundação Ordem Social, PROS
Fundação Astrojildo Pereira, Cidadania
Fundação Verde Herbert Daniel