De Olho no Mundo, por Ana Prestes
A cientista política Ana Prestes analisa os principais acontecimentos do cenário internacional nesta sexta-feira (16).
Publicado 16/04/2021 09:47 | Editado 16/04/2021 09:48
O presidente Bolsonaro está sem nada para fazer no Brasil e foi arrumar confusão com a Argentina. Bolsonaro publicou um post dizendo que o exército argentino estaria nas ruas “para manter o povo em casa”, por conta da orientação para não circulação de pessoas desnecessariamente entre as 20h e 6h, anunciado recentemente. A tentativa foi de acusar o governo do país vizinho de fazer controle forçado da população através da imposição da força, via exército. O presidente Alberto Fernández reagiu dizendo que considerou “impactante” que Bolsonaro faça esse tipo de comentário. E ainda completou: “são oficiais que fizeram a carreira na democracia, defendem as instituições e a partir deste espaço têm colaborado de modo magnífico na pandemia, levando assistência aos locais de maior vulnerabilidade”. A Argentina está sofrendo os efeitos de uma nova onda da Covid 19 e o sistema hospitalar está perto do limite.
O presidente Bolsonaro enviou na quarta (14) uma carta para o presidente Joe Biden, dos EUA. A missiva foi escrita e enviada na véspera de uma Conferência com vários chefes de Estado sobre Mudanças Climáticas, convocada pelo governo norte-americano para os próximos dias 22 e 23 de abril. Alguns dias atrás, o Embaixador dos EUA no Brasil, Todd Chapman, fez um pronunciamento com uma espécie de ultimato para que o Brasil utilize sua “última chance” de mudar a postura relativa ao tema. No documento que foi para Biden, de sete páginas, Bolsonaro promete eliminar o desmatamento ilegal no Brasil até 2030. Aparece literalmente na carta: “reitero o compromisso do Brasil e do meu governo com os esforços internacionais de proteção do meio ambiente, combate à mudança do clima e promoção do desenvolvimento sustentável. Teremos enorme satisfação em trabalhar com V. Excelência em todos esses objetivos comuns.” Na carta ainda se fala sobre “ouvir as entidades do terceiro setor, indígenas, comunidades tradicionais e todos aqueles que estejam dispostos a contribuir…”. E não deixa, por óbvio, de sinalizar que “o Brasil merece ser justamente remunerado pelos serviços ambientais que seus cidadãos têm prestado ao planeta” e precisa de “recursos anuais significativos, que contribuam nesse sentido”.
O presidente eleito do Equador, Guillermo Lasso, disse ontem (14) que o Equador e os EUA voltarão a ser “grandes aliados”. Sua mensagem foi em resposta às declarações de Julie Chung, subsecretária (que está como secretária interina nesses dias) do Gabinete de Assuntos do Hemisfério Ocidental do Departamento de Estado dos EUA. Em sua manifestação, ela cumprimentou Lasso pela vitória e disse que os EUA vão “colaborar estreitamente com o presidente eleito”. Lasso obteve 52,5% dos votos contra 47,4% obtidos por Andrés Arauz.
Na Bolívia também houve segundo turno eleitoral no último domingo (11), mas para governos municipais. O resultado não foi bom para o MAS, partido do ex-presidente Evo Morales e atual presidente Luis Arce. Nas cidades de La Paz, Tarija, Pando e Chuquisaca, a população foi às urnas. Em todas essas capitais, o MAS contou com cerca de 40% dos votos e teve seus candidatos em média 10% atrás dos primeiros colocados. Ainda assim, no cômputo geral, das 336 prefeituras disputadas, o MAS venceu em 239, 67% do total. Perdeu para partidos e agrupamentos que participaram do golpe de 2019 nas regiões metropolitanas de Santa Cruz, La Paz e Cochabamba. Já em El Alto, o MAS perdeu para Eva Copa, ex-presidente do Senado boliviano e expulsa do MAS. Ela organizou o agrupamento “Jallalla La Paz” e ganhou com 68,70%, demonstrando uma fratura importante no interior do MAS em uma localidade que é reconhecida pela resistência indígena e vanguarda do MAS, sendo a segunda cidade mais populosa da Bolívia e a primeira da região de La Paz.
E no Peru, após avanço da apuração dos votos do último domingo (11), ficou definido um segundo turno das eleições presidenciais entre Pedro Castillo (Perú Libre) e Keiko Fujimori (Fuerza Popular). A eleição será no dia 6 de junho. É um segundo turno realmente impressionante e imprevisível como foram as eleições em geral. De um lado um professor sindicalista, com uma pauta avançada em defesa dos trabalhadores e do outro uma política rechaçada nos últimos anos por episódios de corrupção que envolvem sua família. Somados, os votos dos dois candidatos dão conta de 30% dos votos válidos. A definição do segundo turno certamente dependerá das alianças formadas pelos candidatos. Keiko pode ganhar o apoio dos direitistas Hernando de Soto e Rafael López Aliaga. Pedro pode ter o apoio de Veronika Mendoza. Fica o questionamento sobre para onde vai o Acción Popular de Jonhy Lescano que chegou a ser garantido no segundo turno por várias pesquisas. Pedro é um sindicalista, professor de escola rural na região de Cajamarca. Em 2017 foi um dos líderes de uma grande greve nacional da educação. É pouco conhecido em Lima. Faz parte do partido Perú Libre, organizado pelo médico Vladimir Cerrón, ex-governador de Junín. Keiko Fujimori é uma política fujimorista que disputa pela terceira vez um segundo turno presidencial no Peru. Correm contra ela vários processos de acusação por corrupção. Nesta eleição teve apenas um terço dos votos que teve no primeiro turno em 2016. Enquanto Castillo defende uma nova constituição, um papel mais ativo do Estado sobre a economia e a nacionalização de empresas de mineração, gás e petróleo, Fujimori defende a manutenção da constituição elaborada em 1993 no mandato de seu pai, Alberto Fujimori, e uma economia de mercado neoliberal. O Estado peruano que Keiko defende é o que se demonstrou incapaz de dar respostas à pandemia.
Putin e Biden falaram por telefone esta semana. O telefonema se deu no contexto da chegada de dois destróiers russos ao Mar Negro, litoral russo. Durante a conversa, os líderes anunciaram uma busca pela diminuição da tensão e combinaram a realização de um encontro presencial nos próximos meses em um terceiro país. Mas não foi isso que se viu no plano prático, pois logo na sequência o governo Biden anunciou sanções contra a Rússia por suposta interferência na eleição presidencial norte-americana de 2016 e também suposta premiação dada pelos russos para assassinos de estadunidenses no Afeganistão. O porta-voz russo, Dmitry Peskov, informou que haverá retaliações seguindo o princípio da reciprocidade. Durante o telefonema, um dos temas predominantes, de acordo com a transcrição da conversa divulgada pela Casa Branca, Biden questionou a concentração militar russa na fronteira com a Ucrânia. Putin contesta dizendo que está se defendendo, uma vez que a OTAN vem aumentando sua presença militar nas fronteiras russas. Nesta mesma semana, houve uma reunião entre o chanceler ucraniano, Dmitro Kuleba, o chefe do Dept. de Estado dos EUA, Antony Blinen, e o secretário geral da OTAN, Jens Solteburg, em que ambos garantiram apoio contundente contra qualquer tentativa de agressão russa.
Os EUA planejam encerrar a mais longa guerra de sua história. Até o dia 11 de setembro de 2021 pode ser encerrada a presença militar do país no Afeganistão. Vinte anos após os ataques às torres gêmeas em Nova Iorque e a invasão do Afeganistão, os norte-americanos não conseguiram derrotar os Talebans. Mais de 100 mil civis afegãos foram mortos ao longo dessas duas décadas. Atualmente há cerca de 10 mil militares estrangeiros no Afeganistão, sendo 3 mil americanos e 7 mil de países da OTAN. Uma conferência internacional está sendo organizada para o período entre 24 de abril e 4 de maio em Istambul, na Turquia, com a participação de 20 países e autoridades da ONU para discutir a situação do Afeganistão após a retirada das tropas estrangeiras. Em 2020, o governo Trump assinou um acordo com os Talebans para retirada das tropas americanas, por um lado, e impedimento de uso do solo afegã para ataques aos EUA, por outro. O acordo foi endossado pela ONU.
Enquanto isso, os iranianos anunciaram, também esta semana, que vão começar a enriquecer urânio a 60%. O anúncio foi feito poucos dias após uma explosão na usina nuclear de Natanz e que foi muito noticiada pela imprensa mundial. Duas centrífugas haviam sido inauguradas na usina de enriquecimento de urânio. O governo iraniano acusa Israel de estar por trás da explosão. A alegação é que Israel já sabotou o programa nuclear iraniano outras vezes com cyber ataques e assassinato de cientistas. Ao acusar Israel, o chanceler iraniano Mohammad Zarif estava ao lado do chanceler russo Sergei Lavrov na capital Teerã.
Nos marcos dos 60 anos de vitória da Batalha de Girón, após invasão norte-americana na Baía dos Porcos e tentativa frustrada de derrubada do governo de Fidel Castro, começa hoje o 8º Congresso do Partido Comunista Cubano.