Crise em Gaza pode internacionalizar conflito, alerta especialista

Professor Héctor Luis Saint-Pierre, da Unesp, observa as características do conflito atual entre Israel e Palestina para alertar para o risco de um conflito de dimensões globalizadas.

Héctor Luis Saint-Pierre, coordenador-executivo do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais, comenta escalada dos ataques entre israelenses e palestinos

Os bombardeios de Israel à Faixa de Gaza foram retomados nesta segunda-feira, 17 de maio. Até o momento, aproximadamente duzentas pessoas morreram no atual conflito. A grande maioria é formada por palestinos. Tanto o Hamas quanto Israel seguem ignorando os apelos internacionais por uma desescalada.

A Força Aérea Israelense efetuou inúmeros bombardeios na região, de onde grupos armados lançaram foguetes contra o território de Israel. O Crescente Vermelho do Catar afirmou que seu escritório em Gaza foi danificado e o Ministério da Saúde palestino divulgou que suas instalações foram atingidas por mísseis.

De acordo com o porta-voz da Pasta da Saúde local, o único laboratório que realiza testes de Covid-19 na Faixa de Gaza pausou suas operações, depois que a clínica que o abriga foi alcançada por um ataque de Israel.

Já o exército israelense informou ter atacado nove residências de comandantes do Hamas, incluindo algumas que eram utilizadas para armazenar equipamentos bélicos.

Héctor Luis Saint-Pierre, especialista em segurança internacional, professor do Departamento de Relações Internacionais da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Unesp (Câmpus de Franca) e coordenador-executivo do Instituto de Políticas Públicas e Relações Internacionais da Unesp, alerta que a crise entre Israel e Palestina na Faixa de Gaza pode subir de patamar e gerar um conflito globalizado.

Para ele, os atuais ataques são a “ponta do iceberg” de um conflito mais amplo entre Israel e o mundo árabe. “Desde a instalação do estado de Israel e o não reconhecimento do estado palestino, foi se agravando uma colonização consentida pela comunidade internacional. Israel nunca obedeceu ditames da ONU e foi se estendendo até deixar a Faixa de Gaza numa situação praticamente insustentável, com pouco mais de 70 km2 de extensão”, recordou.

Ele relata que, na última semana, começou um conflito motivado pela tentativa de Israel de expulsar algumas famílias palestinas para permitir que colonos israelenses tomassem suas áreas. Isso gerou manifestações em bairros de Israel, com árabes que são israelenses. Um conflito interno que iniciou uma escalada de violência extremamente perigosa no mundo contemporâneo, na opinião do professor.

De acordo com sua análise, Israel tem receio de tentar uma invasão terrestre, depois do fracasso da tentativa de invasão do Líbano pelas Colinas de Golã. “Foi um fracasso estratégico muito grande, que representou uma surra, que levou a mudanças ministeriais importantes no governo. Percebeu-se que as forças armadas estavam mais preparadas para a repressão interna, numa atitude colonialista em pleno século XXI, do que para um conflito internacional de grande escala”.

Os palestinos não têm exército, mas contam com um grupo armado, o Hamas. Eles dispõem de mísseis de longo alcance e os estrategistas israelenses já perceberam que um lançamento maciço de misseis é mais preciso, tem mais carga, alcança maior distância e são construídos dentro da própria Palestina. Por isso, estão bombardeando túneis para atingir fábricas nativas de mísseis, diz ele.

“Pode haver ajuda externa para essas armas, o que nos leva à perspectiva de uma internacionalização do conflito, com envolvimento de Síria e Líbano, pelo menos”, avaliou.

O professor destaca a importância da mobilização pressionando Israel, demonstrando que a comunidade internacional não consente numa escalada de conflitos virulenta.

Por outro lado, acrescenta ele, a Rússia cada vez mais cobra o reconhecimento de sua importância e influência geopolítica, principalmente depois da participação no conflito da Síria.

Rússia e China estabeleceram uma aliança forte, em que a escalada do conflito não depende mais, apenas do beneplácito dos EUA, como foi antes. “Pela primeira vez, isso levou o governo dos EUA a cobrar um cessar fogo por parte de Israel para evitar a internacionalização do conflito”, observa.

Ele destaca os efeitos da globalização sobre o risco de um conflito internacionalizado, comparado com o período da Guerra Fria, em que dois polos decidiam o arranjo de forças. Hoje, de acordo com sua análise, os polos de força estão mais capilarizados, com relação de dependência recíproca entre todos os países.

“Muitos países foram sufocados economicamente pelos 2% de investimento do PIB em defesa para a OTAN e estão preocupados com a escalada, porque não têm condições de sobreviver de maneira isolada”.

A comunidade internacional observa a recuperação da energia bélica do Afeganistão e da Líbia e o terrorismo crescente em várias partes do mundo, que chamam a atenção dos líderes para a necessidade de redução da tensão em Israel. Héctor considera grave o bombardeio com mortes do Crescente Vermelho em Gaza.

De acordo com o especialista, a preocupação no mundo é grande com a possibilidade de internacionalização do conflito, por isso há pressão para um cessar fogo para negociações.

Edição de podcast da UNESP

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