Bolsonaro teve ao menos 27 reuniões com “gabinete paralelo” da Saúde
Site também divulgou vídeo de reunião entre o presidente e o grupo realizada em setembro de 2020
Publicado 05/06/2021 20:09 | Editado 06/06/2021 16:54
O presidente Jair Bolsonaro se reuniu ao menos 27 vezes com integrantes do “gabinete paralelo” de Saúde em seu gabinete, no terceiro andar do Palácio do Planalto. Trata-se de um grupo extraoficial, de viés negacionista, que aconselha ações a serem tomadas pelo governo no combate à Covid-19. A informação é do site Metrópoles, que fez um levantamento com base na agenda presidencial.
A contagem foi feita com base nos encontros de Bolsonaro, entre março de 2020 e maio de 2021, com o ex-assessor especial da Presidência Arthur Weintraub; o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ); o empresário Carlos Wizard; o médico Luciano Dias Azevedo; o deputado Osmar Terra (MDB-RS); e a médica Nise Yamaguchi.
Na sexta-feira 4, o site também divulgou vídeo de uma reunião entre o presidente e o grupo em setembro do ano passado. As imagens contradizem integrantes e ex-integrantes do governo Bolsonaro que, ao longo do mês de maio, negaram a existência dessa estrutura, revelada pelo ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta em seu depoimento. O general Eduardo Pazuello, também ex-titular da Saúde, foi um dos que não admitiam o “gabinete paralelo”.
Para o senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente da CPI, a gravação comprova a atuação do chamado ministério paralelo. “Não se trata mais de falar que supostamente existe algo. Está comprovado”, diz. “Esses ataques todos de Bolsonaro só demonstram o desespero do presidente. Por que você acha que o ministro Pazuello disse, aquele dia, que um manda e outro obedece? Porque era assim, ele só executava ordens.”
O encontro com Bolsonaro teve a participação do ex-ministro da Cidadania Osmar Terra, que ficou conhecido como um dos principais defensores da cloroquina, medicação sem nenhuma eficácia no tratamento da doença. Terra também compartilhava da tese da imunidade de rebanho – pela qual a imunização se daria de forma natural ao passo que a população fosse infectada. O próprio Osmar chegou a pegar Covid-19 e ficou uma semana na UTI.
Nas imagens da reunião que ocorreu em 8 de setembro, participantes fazem uma série de críticas e ressalvas à aplicação de vacinas. Osmar Terra é citado como um “guia intelectual” do grupo, com influência direta sobre as decisões do Ministério da Saúde. Entre os participantes do encontro estão a imunologista Nise Yamaguchi, que prestou depoimento nesta semana à CPI da Covid, em convite feito pela comissão.
“Uma honra trabalhar com o senhor neste período” afirmou Nise, referindo-se a Osmar Terra. Aos senadores, a médica negou a existência de um gabinete paralelo e disse que prestava apenas “aconselhamento” ao governo. Disse também que nunca esteve sozinha com o presidente Bolsonaro.
De acordo com o vídeo, Arthur Weintraub, irmão do ex-ministro da Educação, Abraham Weintraub, intermediava os contatos entre o grupo e o Planalto. No encontro, o virologista Paolo Zanotto diz que Bolsonaro deve tomar “extremo cuidado” com as vacinas contra a Covid-19. “Não tem condição de qualquer vacina estar realisticamente na fase 3”, afirmou. Naquela ocasião, a Pfizer já havia encaminhado cartas sobre suas vacinas ao Brasil, sem obter respostas do governo.
Após a divulgação do vídeo, o vice-presidente da CPI da Covid, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que pretende convocar o agora deputado federal Osmar Terra (MDB-RS) e o virologista Paolo Zanotto para prestarem depoimento à comissão. A CPI também pretende convocar Carlos Bolsonaropara questioná-lo sobre o “gabinete paralelo”, afirmou o relator da comissão, senador Renan Calheiros (MDB-AL), em live do centro acadêmico da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Segundo Renan, a presença do filho do presidente em uma reunião com a Pfizer sobre oferta de vacinas “é um fato que embasará a qualquer momento, em qualquer circunstância, a convocação do vereador”. A participação de Carlos Bolsonaro na reunião foi confirmada pelo gerente-geral da Pfizer na América Latina, Carlos Murillo, após ser questionado sobre o tema em seu depoimento na CPI.
“Espero que essa necessidade (convocação de Carlos Bolsonaro) continue a haver para concretizarmos o que a CPI entende sobre esse tráfico de influência, essa participação de pessoas que nada tinham a ver com o governo nas tratativas de aquisição da vacina. Sobretudo depois de o presidente ter fechado todas as portas para a vacinação dos brasileiros. Precisa ser esclarecido e já há requerimentos na CPI para que isso efetivamente aconteça”, disse o relator.
Os requerimentos para a convocação de Carlos Bolsonaro já foram protocolados em maio pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Humberto Costa (PT-PE). Ambos também solicitaram convocação do assessor especial para Assuntos Internacionais do Planalto, Filipe Martins, cuja presença na reunião com a Pfizer foi outra confirmada por Carlos Murillo.
Com informações da CartaCapital e de agências