Alta do PIB vem com fome e desemprego no governo Bolsonaro

Análises apontam a contradição entre o crescimento de 1,2% do PIB e o desemprego, desigualdade e inflação em alta, com piora das condições de vida do brasileiro.

Noite em uma calçada do Rio de Janeiro - Foto: Projeto Ruas/Facebook

O crescimento de 1,2% no Produto Interno Bruto (PIB) do primeiro trimestre de 2021, divulgado recentemente pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), acima das expectativas do mercado, que previa 0,7%, vem sendo comemorado pelo governo Bolsonaro. Mas análises recentes exploram a contradição entre o crescimento econômico e o desemprego, desigualdade e inflação em alta, com piora das condições de vida do brasileiro.

Em matéria publicada nesta segunda-feira (7), a jornalista Rosana Hessel, do Correio Braziliense, ressalta que as projeções de expansão do PIB entre 5% e 5,5% em 2021, divulgadas pelo mercado na esteira dos dados do IBGE, revelam a baixa capacidade de crescimento do país, pois uma fatia de 4,9% é atribuída ao novo cálculo do carregamento estatístico do PIB de 2020, ou seja, pura inércia (levando em conta que o crescimento parte de um patamar muito baixo no ano passado, quando houve recuo de 4,1% do PIB devido à pandemia).

A reportagem do Correio ainda destaca que a recuperação é heterogênea, com o principal motor do crescimento, o consumo, ainda no campo negativo e consequente encolhimento da produção industrial de 1,3%, em abril, 1% abaixo do nível pré-crise, de fevereiro de 2020.

Outro ponto significativo é que o setor de serviços, o que mais emprega, continua distante do patamar pré-pandemia e, segundo o Correio, só vai conseguir ter uma retomada mais forte no último trimestre do ano se a promessa do governo de vacinar toda a população for cumprida.

O jornal ainda cita dados do estudo “Gênero e raça em evidência durante a pandemia n Brasil: o impacto do auxílio emergencial na pobreza e na extrema pobreza”, divulgado em abril pelo Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da Universidade de São Paulo (Made/USP), que estimou aumento de 9 milhões de pessoas em situação de pobreza e insegurança alimentar um ano após o início da pandemia. Segundo a pesquisa, em 2020, o auxílio emergencial entre R$ 600 e R$ 1,2 mil acabou mascarando essa realidade.

Bolsonaro ri

O descompasso entre o crescimento do PIB e a dura realidade dos brasileiros também foi abordado na semana passada pelo jornalista Vinícius Torres Freire, colunista da Folha de S.Paulo, em artigo intitulado “Bolsonaro ri dos desesperados do PIB, que despiora mas deixa rastro de fome”.

O jornalista lembrou a declaração cruel de Jair Bolsonaro, que afirmou que os pobres desempregados insatisfeitos com o novo auxílio de míseros R$ 150 deveriam ir pedir empréstimo aos bancos.  “Tem gente criticando ainda falando que quer mais [auxílio emergencial]. Como é endividamento por parte do governo, quem quer mais é só ir no banco e fazer empréstimo”, afirmou o presidente.

Sobre o PIB do primeiro trimestre, Torres Freire afirma que houve “uma despiora mais rápida do que a esperada”, mas que o nível de emprego ficou “muito para trás”.  

“Pelo menos desde 2012, é a maior divergência entre PIB e emprego. Em relação ao primeiro trimestre de 2020, a economia cresceu 1%. O número de pessoas de alguma renda do trabalho ainda é 7,3% menor, cerca de 6,6 milhões a menos. Já foi pior. No terceiro trimestre do ano passado, a perda de empregos era de 12,1%, segundo a Pnad do IBGE. Mas, mesmo nas despioras mínimas que ocorreram entre 2016 e 2019, o nível de emprego acompanhou o PIB, mais ou menos. Agora, não”, observou o jornalista.

Ele destacou que uma das razões é a ausência de recuperação no setor de serviços, o mais intensivo em mão de obra. “Os serviços estão enterrados na lama por causa da epidemia, de resto prolongada porque Bolsonaro sabota as medidas sanitárias”, destaca.

Segundo Torres Freire, setores que se recuperaram, como agropecuária e indústria extrativa, empregam bem menos. Já a construção civil continua deprimida diante do pífio investimento em infraestrutura. “Não há investimento público nem política pública relevante o suficiente para incentivar investimento privado em obras de infraestrutura, mais um resultado deste desgoverno torpe”, comenta.

O artigo ainda aponta que, além não haver emprego bastante, a renda restante de quem manteve algum trabalho foi comida pela inflação, especialmente a dos alimentos, que afeta particularmente os mais pobres – que têm a maior parte da pouca renda consumida pela alimentação. “Sim, por ora o PIB melhora e isso levará alívio a mais gente. A perspectiva, porém, é de uma despiora muito desigual, com alto risco de pobreza e iniquidade crônicas”, conclui o jornalista.

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