Investimento estrangeiro no Brasil está ligado ao mercado financeiro

Levantamento de Paulo Roberto Rivera indica ainda que, desde 1995, o Brasil só apresentou superávit em sua conta corrente em cinco anos: de 2003 a 2007.

A maior parte do investimento estrangeiro no Brasil está relacionada a instituições financeiras.  Além disso, o país é dependente desses investimentos e de uma balança comercial baseada em commodities para obter dólares de forma a ter reservas para crises monetárias. É o que indica o estudo Brasil: um olhar sobre as contas externas, do contabilista Paulo Roberto Rivera.

No estudo, Rivera analisou dados do Banco Central referentes ao balanço de pagamentos do país abrangendo um período de 26 anos. No balanço de pagamentos são registradas todas as transações do Brasil (residentes) com o exterior (não residentes).

Apurando o resultado das operações de todos os componentes do balanço de pagamentos – que incluem balança comercial, investimentos estrangeiros no país, remessas de lucros e dividendos ao exterior, entre outros – é calculado o saldo das transações correntes. Quando o saldo é negativo, significa que o país deverá obter dólares abrindo-se ao capital externo.

O levantamento de Paulo Roberto Rivera indica que, desde 1995, o Brasil só apresentou superávit em sua conta corrente em cinco anos: de 2003 a 2007. De acordo com ele, isso aconteceu principalmente porque o país teve superávits expressivos na balança comercial, beneficiando-se de um boom das commodities no mercado externo.

À época, o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva aproveitou os dólares para formar um colchão de US$ 380 bilhões em reservas internacionais, dos quais US$ 20 bilhões foram usados pelo Banco Central no atual governo para conter a escalada do dólar.

Apesar de o país ter se beneficiado, o problema de contar com as commodities para melhorar o saldo da balança comercial e, em última instância, o balanço de pagamentos, é justamente este: um boom de valorização de produtos primários em geral é passageiro. O ideal seria ter uma indústria competitiva e exportar bens menos vulneráveis às oscilações de preços. Rivera destaca que esta opção reduziria a necessidade de buscar o investimento estrangeiro.

“Isso foi uma opção que o Brasil fez. A China tinha o mesmo problema lá no início da década de 1980 com a questão do desenvolvimento, falta de tecnologia. Mas tomaram um caminho completamente diferente do nosso. Até hoje a conta de capital da China é fechada e o Investimento Direto no País [IED] que o país recebeu teve exigência de contrapartida. A Coca-Cola foi para lá, mas a China exigiu a tecnologia das garrafas pet”, comenta.

O Investimento Estrangeiro Direto, ou IED, em geral é apontado como um investimento produtivo e mais benéfico a um país do que o investimento em carteira (investimento no mercado financeiro), especulativo e mais volátil. No entanto, a análise de Rivera das contas externas brasileiras mostra que isto não é necessariamente verdade.

Do investimento estrangeiro recebido pelo país em 2020, 35% dizem respeito a investimentos diretos no país e 33% a investimentos em carteira. Ou seja, em tese, a participação do investimento produtivo foi maior.  No entanto, a divisão entre setores econômicos indica que a maior parte do IED – 19% – estava relacionado ao setor de serviços financeiros.

Entre os demais setores, 9%  foram para o comércio (exceto veículos); 7% para a indústria de bebidas; 7% para eletricidade e gás; 7% para extração de petróleo e gás e 4% tanto para telecomunicações quanto para a indústria de produtos alimentícios. Metalurgia, indústria de veículos, atividades imobiliárias e produtos químicos receberam 3% do investimento estrangeiro cada. Além disso, 30% das atividades estão agrupadas na rubrica “Outras”.

“O exame desta realidade desmistifica em parte a ideia de que o investimento direto é sempre saudável para o país receptor, visto que impulsiona sua produção e o consequente desenvolvimento. A liderança do setor de bancos e demais instituições financeiras demonstra que os maiores investimentos estão em um setor não produtivo, comprometido com os ganhos financeiros oriundos, via de regra, da conversão de capital monetário em capital fictício”, afirma Rivera.

O contabilista chama a atenção, ainda, para o fato de que o Brasil não tem qualquer regulação determinando que um mínimo de capital desses investimentos deve ser reinvestido no país.

“A renda primária, que inclui a remessa de lucros e dividendos para o exterior, arromba a conta corrente brasileira. Não há nenhum tipo de restrição. Se você olhar as tabelas do Banco Central, não é raro que seja zero o lucro reinvestido no país. Vou citar de novo o exemplo da China. Lá não é todo lucro [de subsidiária] que pode ser revertido para a matriz”, diz.

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